Quando o Homem-Cão visita a sua casa e a vê abandonada, prestes a ser vendida, e recorda os momentos felizes com a esposa, é impossível não se lembrar de cena semelhante em "Robocop - o Policial do Futuro" (1987). Afinal, tanto o protagonista da animação, em cartaz nos cinemas, quanto o robótico homem da lei são frutos de experiências científicas.
Em "O Homem-Cão", o projeto é mais radical: um policial tem a cabeça de seu fiel pet inserida em seu corpo após ambos serem vítimas de uma bomba produzida por Petey, autodenominado "o gato mais maligno do mundo". O filme não quer levantar, até por seu uma produção infantil, a questão ética da tecnologia, mas não deixa de ser interessante como as insere na narrativa.
Assim como em "Robocop", o Homem-Cão não é bem aceito na força policial, especialmente pelo chefe, que chega a abusar do lado canino de seu comandado. Há um latente sentido de inadequação que se espelha também no vilão, vítima de uma fratura familiar, quando o pai exige mais do que ele pode dar (o que explica necessidade de superlativos).
Do comandante à repórter de TV, passando pelo filhote clonado de Petey, são todos personagens carentes de alguma afeição. São questões que refletem a história por trás da criação do personagem, oriundo das tiras de "Capitão Cueca", de Dav Pilkey, que começou a desenhar ainda na escola, onde passou por dificuldade por ter TDAH e dislexia.
O que nos deixa curiosos na animação dirigida por Peter Hastings, principalmente, é a quantidade de referências que são processadas neste grande liquidificador fílmico. Para quem gosta de seriados japoneses, no estilo de "Spectraman" e "Jaspion", entre outros, é divertido ver a luta entre prédios gigantes com o robô comandado pelo Homem-Cão.
A animação é muito hiperativa, com coisas acontecendo o tempo todo, mesmo que, muitas vezes, de maneira repetitiva e com piadas mais bobinhas. O desenho é brilhante, com cores fortes, intensificando esse apelo junto à criançada. Fica a reflexão sobre uma narrativa que é resultado de um mundo acelerado e cheio de informações, quando o mais é simplesmente isso: mais.
Essa opção acaba atropelando o desenvolvimento de algumas ideias, como a própria "transformação" em homem-cão, que deixa de ser determinante na segunda metade, sem falar na sugestão de corrupção do supervisor da penitenciária, parente da prefeita, onde Petey é detido - e solto em questão de horas. Até mesmo o absurdo tem seus limites.