“Quando eu tinha sete anos, chorei atrás da coxia por não participar de uma apresentação de balé na escola. Não dancei porque não tínhamos condições financeiras de pagar aulas. Quase 50 anos depois, chorei novamente. Mas dessa vez, eu estava pisando num palco para me apresentar ao lado de outras mulheres 50+ em um espetáculo de balé. Fiquei maravilhada quando percebi que nunca é tarde para ser feliz e realizar sonhos.” Com a voz trêmula e cheia de emoção, Rosimeire Augusta Vaz, de 53 anos, fez esta declaração. 

Viúva e mãe de dois filhos, a aposentada relembra o dia em que viu no Instagram o perfil da escola Reabilitação e Ballet, em Belo Horizonte, voltada para mulheres acima de 50 anos. “Em lágrimas, falei para a minha filha: acho que chegou o meu momento de colocar a sapatilha e comprar o tão desejado collant. Marquei a aula experimental, e na primeira vez já me apaixonei. É gratificante encontrar mulheres da minha idade, com interesses em comum, e lembrar que podemos ser ativas e produtivas nesta faixa etária.”

A expectativa de vida mundial subiu de 47 para 73 anos nas últimas sete décadas. No Brasil, a média atual é de 76 anos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Diante desse cenário, a Organização das Nações Unidas declarou o período de 2021 a 2030 como a Década do Envelhecimento Saudável, buscando a mobilização global para promover melhorias na vida de idosos. Esse movimento provoca a Revolução da Longevidade, que reflete não só aumento do tempo de vida, mas também uma mudança no modo de viver após os 50 anos, com mais autonomia, engajamento e projetos.

A arte e seus efeitos

Um estudo da Universidade Queen Mary, em Londres, publicado em março deste ano na revista científica Nature Mental Health, revelou que programas coletivos de arte, como dança, pintura e música, podem ser mais que lazer: são estratégias eficazes para melhorar a saúde mental de adultos maduros e idosos. A pesquisa analisou 3.360 pacientes de 21 países, com quadros de depressão e 949, com ansiedade. Os resultados mostraram que a prática das atividades tem efeito positivo no alívio dos sintomas dessas condições. Para os pesquisadores, a experiência compartilhada e a construção de conexões sociais atuam como suporte emocional. 

Lúcia Paulino, de 74 anos, também é aluna da escola de balé, criada pela fisioterapeuta e bailarina Meiry Isméria de Paula, de 61 anos, que abriu o negócio quando tinha 53 anos. O empreendedorismo também era um sonho de Meiry. Há cerca de um ano, Lúcia descobriu a dança. “Quando cheguei lá, vi mulheres de todos os jeitos, com corpos variados e idade entre 52 e 80 anos. A convivência em grupo tornou-se uma ocupação prazerosa. Às vezes, aparecem algumas, que além das limitações físicas da idade, têm problemas de depressão e de solidão. Mas aí logo elas passam a sorrir, como todas as outras.”

Lúcia Paulino descobriu a paixão pelo balé depois dos 70 anos - Foto: Flávio Tavares/O Tempo

Lúcia criou dois filhos, se aposentou, e agora entende que essa etapa da vida também precisa ser desfrutada. “Precisamos ter esperança quanto à qualidade do tempo que nos resta. Porque você cria filhos, se aposenta, aí, de repente, fala: o que vou fazer agora? Eu comecei a pesquisar tudo que era artístico. Também gosto de escrever e tenho um pensamento que a arte é libertadora. Então, na dança, encontrei minha felicidade. Mas, conheço pessoas da minha idade que estão dentro de casa, deprimidas. Isso é muito comum.” 

A coordenadora do departamento de Psicogeriatria da Associação Brasileira de Psiquiatria, Tânia Ferraz Alves, afirma que as pessoas envelhecem como vivem. “Chega um momento, que a gente chama de ninho vazio — quando as pessoas se veem sozinhas após cumprirem o papel de pais e de profissionais. Se elas conseguem se reinventar, alçam novos voos. Quando não o fazem, ficam isoladas em casa. Sempre pergunto: o que você quis fazer na vida, mas não teve tempo ou dinheiro para isso? Geralmente, os pacientes têm uma lista de sonhos ou de hobbies. Então digo, vamos começar por isso.” 

Projeto de vida 

Rosimeire Augusta Vaz, de 53 anos, diz que para viver o sonho do balé e também de viajar pelo mundo após a aposentadoria, precisou cuidar de suas finanças ao longo do tempo. “Fico feliz porque tenho minha independência financeira que me permite fazer o que amo. Inclusive, falo com meus filhos e sobrinhos o quanto é importante se organizar e até ter um cofrinho. Nunca gostei de fazer dívidas, sempre fiz o que estava de acordo com minha realidade, fui poupando e hoje posso desfrutar com mais tranquilidade deste momento.”

Para Cecília Xavier, consultora de carreira e aposentadoria, a preparação para o futuro é um fator protetivo para os momentos de transição. “Ter um projeto de vida é um processo de educação para a longevidade, para que a pessoa tenha as rédeas da vida nas mãos e não fique vivendo de forma aleatória. É uma metodologia de autocuidado, o que não significa que a gente vai evitar todas as mazelas, porque faz parte sofrer, perder, se frustrar, mas com o planejamento isso vai acontecer menos.” 

Gina Lapertosa, aos 63 anos, inspira mulheres com treinos de crossfit e vida ativa nas redes sociais - Foto: Flávio Tavares/ O Tempo

Referência na maioridade 

Aos 63 anos, Gina Lapertosa inspira mulheres com rotina de treinos e vida ativa nas redes sociais. A ex-professora de educação infantil conta que foi incentivada pelo pai a praticar esportes desde a infância. “Ele dizia: comece agora porque lá na frente vai ficar mais fácil para você dar continuidade.” Gina fez natação por décadas, e, aos 55 anos, foi apresentada ao crossfit pela filha. “Estava entrando no climatério, então resolvi fazer a reposição hormonal, vitamínica e alinhar isso ao esporte, porque ele te desafia a ter metas, o que é ótimo para essa fase da minha vida.” 

Atualmente, a influencer fitness conta com 1,1 milhão de seguidores no Instagram. Ela treina diariamente e recentemente aderiu a Hyrox, prova que combina corrida com exercícios funcionais. “Meu objetivo não é virar celebridade, mas mostrar que é possível envelhecer com saúde, movimento e alegria. Não estou dizendo que todo mundo tem que fazer crossfit, mas sim que todos devem se exercitar. Se você tem um novo dia, então pode vivê-lo do jeito que quiser. E é preferível fazer boas escolhas para não se arrepender depois”, finaliza.