O setor cultural ficou de fora do tarifaço para a importação de produtos brasileiros imposto por Donald Trump, que entrou em vigor nesta quinta-feira (7/8). Apesar do alívio, ainda é cedo para produtoras de cinema e galerias de arte respirarem despreocupadas.

Isso porque o clima de tensão instaurado pelo presidente dos Estados Unidos com o Brasil deve afetar futuras negociações nas áreas da arte e do audiovisual, nas quais a parceria com empresas norte-americanas é cotidiana e vital.

Segundo a Pesquisa Setorial do Mercado da Arte do ano passado, os Estados Unidos foram o destino de 56% do total de exportações de galerias brasileiras em 2023. A tendência vem crescendo nos últimos anos - em 2016, esse percentual era de 48%.

A insegurança econômica despertada pela guerra comercial freia possíveis compradores de arte, diz Thiago Gomide, dono da galeria paulistana Gomide & Co e membro da Associação de Galerias de Arte do Brasil. Os colecionadores, pessoas abastadas e gestoras de outros negócios, possivelmente em áreas afetadas pelo tarifaço, preferem se dedicar a investimentos mais seguros em momentos de crise, ele afirma.

"Doadores ficam mais tímidos também de dar dinheiro aos museus, por medo de represálias", afirma Gomide. Ele diz que há uma preocupação geral do setor com os cortes de verba do governo Trump para museus norte-americanos, clientes das galerias brasileiras que agora devem diminuir suas aquisições.

Embora a exportação de filmes brasileiros seja ainda muito baixa, profissionais da indústria cinematográfica norte-americana afirmaram à reportagem, em condição de anonimato, que há receio em relação à resposta de Lula, devido a uma cláusula na Lei da Reciprocidade que prevê a quebra de direitos autorais de produtos importados pelo Brasil — como franquias de cinema ou streaming.

Embora a chance de Lula recorrer a essa medida seja vista como remota, existe a preocupação de que a erosão da relação entre os dois países possa fazer com que Lula acelere a regulamentação do streaming no Brasil. É o que afirma Mauro Garcia, presidente da Brasil Audiovisual Independente, associação que reúne 600 produtoras nacionais.

"O Brasil não é um exportador de audiovisual, mas ocupamos bem o mercado interno na última safra, nesse declínio do cinema americano", diz ele. A regulamentação obrigaria empresas dos Estados Unidos, como Netflix e Amazon Prime Video, a dar contribuições maiores para o desenvolvimento do audiovisual brasileiro.

Trump, por sua vez, pode tentar interferir na regulamentação do streaming, na visão de Garcia. "Ele pode, por exemplo, aplicar mais tarifas como represália, para defender as big techs americanas", ele afirma.