“Doida pra Escrever”, mais recente livro da Ana Elisa Ribeiro, demandou algo em torno de seis anos (“pelo menos”) para ser considerado pronto pela autora. Pode até parecer um período longo, mas Ana Elisa trata de explicar: “Os livros de crônicas geralmente têm um processo mais lento mesmo, que tem mais a ver com a periodicidade da publicação das crônicas – ao longo do tempo, às vezes anos – do que com uma ideia ou uma centelha que os dispare. Diferentemente de pensar e planejar um livro de poesia ou um romance, ele nasce um dia, depois de muito tempo, quando achamos que o volume de textos publicados já dá um tanto bom. Passamos, então, a reler, a escolher, a pensar critérios para formar um conjunto – e foi o que aconteceu nesse caso”. O conjunto em foco traz 37 crônicas agrupadas em quatro partes, intituladas “Doida por palavras”, “Memória & tempo”, “Educações” e “Amor & outros quiproquós”. 

As crônicas da obra, vale dizer, foram publicadas originalmente na revista eletrônica paulistana Digestivo Cultural, que já contabiliza 20 anos de existência. “Na verdade, escrevo lá há 18. Nesse período, aliás, publiquei outros dois livros de crônicas (lançados em 2012 e 2013, ambos semifinalistas de prêmios e adotados em escolas). Para este novo, reuni textos posteriores a 2015 – inclusive escritos já durante a pandemia – e (versando) sobre muitos assuntos. Assim, ‘Doida pra Escrever’ juntou textos nem sempre publicados originalmente próximos. Daí falei com a Moinhos, e a editora topou a encrenca de publicar”, brinca ela, antes de explanar um pouco sobre o gênero que abraça nessa empreitada. “A crônica é um gênero razoavelmente popular, que ainda acha espaço na imprensa, por exemplo, mas que não é dos mais prestigiados literariamente. Uma pena, mas nem por isso a gente para de fazer. O amor é maior que isso”. 

Ana Elisa Ribeiro, diga-se, escreve crônicas há bastante tempo, e em vários espaços. “Há alguns anos, escrevo também para a ‘Revista Pessoa’, para o jornal ‘Rascunho’ e para o blog da editora Relicário. É muito gostoso de fazer, sempre em processo – o que significa que talvez venham outros livros por aí”, aventa. 

Questionada sobre o título que escolheu para a obra, ela responde de pronto: “É um título gostoso, não é? Me identifico muito com ele. É o nome de uma das crônicas e acabou sendo plasmado no livro inteiro. Este é um dos processos possíveis para intitular um livro de textos unitários, digamos assim”. Ana Elisa lembra tratar-se de uma estratégia comum também em livros de poesia. “A gente pensa, reúne os textos e depois procura um título ou mesmo um verso que possa batizar o volume inteiro”.  

Em “Doida pra Escrever”, ela avalia que “colou bem isso”. “E várias pessoas me falaram de um gostoso duplo sentido. Eu sou uma doida pra escrever porque fico muito ansiosa, muito a fim de escrever. É uma tarefa pela qual sou apaixonada, mas que preciso proteger, persistir. Embora a escrita seja um dos eixos da nossa sociedade, escrever literatura às vezes é algo considerado ‘inútil’, perda de tempo, algo assim. Imagine se vou deixar de fazer o que mais amo... sufocada por esse tipo de coisa. Não deixo. E sustento essa loucura, essa doideira por escrever. Mas a outra ideia que esse título pode passar também é válida. É preciso ser um pouco doidinha pra escrever neste mundo”.  

Instigada a se deter sobre alguns textos, Ana aponta “Relatório de Compra”, uma das crônicas que estão mais ao final da obra, quando narra uma tarde passada em uma floricultura. “É mais ou menos recente e foi uma cena muito surreal. O jeito como eu conto também me deu prazer ao escrever. Outra crônica (“12 Tipos de Cliente do Revisor de Textos”) que me aliviou – e que sei que circula mais – está na primeira parte, quando trato dos tipos de clientes dos revisores de textos. Fui e sou revisora, sei como a coisa acontece e resolvi brincar com isso, dando também umas alfinetadinhas. Vingança de revisora”, ri.  

Outra que a divertiu – “Meu Reino por uma Webcam” – foi sobre o dia em que decidiu comprar uma webcam. “Foi engraçada – e de pouca visão – a forma como as atendentes me ridicularizaram por procurar uma webcam em loja. Coisa velha, coisa sem uso... E dali a alguns dias (com o advento da pandemia) as webcams viraram um dos artigos mais procurados do mundo”, narra ela, acrescendo a observação de que qualquer coisa pode ser tema para uma crônica. “Crônica é vida, é viver, é estar atenta, é ouvir conversa alheia, é anotar, é registrar... Mas dando aquela ajeitada que faz disso um texto bacaninha”.  

E arremata: “Coisas incríveis, inesperadas, podem acontecer a qualquer um(a)”. Da mesma maneira, acontecimentos nem sempre bem-vindos. “Em algumas crônicas eu falo sobre essas expectativas frustradas e sonhos altos demais. O início da minha trajetória foi há bastante tempo, talvez minha frustração já seja muito sólida, meu otimismo esteja abalado. Então, o jeito é brincar. Falando sério”.