Baseado em fato real, 'O Sequestro do Voo 375' estreia mesclando ação e emoção
História, que acontece há 35 anos envolvendo um avião que decolou de Confins, teria inspirado Bin Laden no atentado do 11 de Setembro e agora chega aos cinemas
Nonato (Jorge Paz) e Danilo Grangheia (comandante Murilo)Foto: Estúdio Escarlate/Divulgação
Muito antes de a rede fundamentalista islâmica Al-Qaeda planejar os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, em que sequestrou e jogou aviões contra edifícios públicos dos Estados Unidos, um tratorista maranhense de 28 anos, que havia sido demitido da construtora Mendes Júnior, conseguiu embarcar, em Confins (MG), num voo comercial da Vasp com 105 pessoas a bordo, rumo ao Rio de Janeiro, também num setembro, mas de 1988, com uma arma calibre 32 e mais de 100 balas – naquela época, os aparelhos de raio-x e detectores de metal não eram utilizados para verificar bagagens em aeroportos. Seu nome era Raimundo Nonato Alves da Conceição.
Desempregado e desesperado, o tratorista atirou em um comissário, invadiu a cabine de comando e ordenou que o piloto Fernando Murilo de Lima e Silva desviasse a rota para Brasília. Sua intenção era jogar a aeronave no Palácio do Planalto e matar seu conterrâneo José Sarney, então presidente da República, com quem Nonato “queria acertar as contas”.
Trinta e cinco anos depois, essa história impressionante e verídica finalmente aterrissa nos cinemas. Com direção de Marcus Baldini (“Bruna Surfistinha” e “O Rei da TV”), produção do Estúdio Escarlate, de Joana Henning, argumento do jornalista Constâncio Viana (também pesquisador e coprodutor) e coprodução da LTC Produções e Star Original Productions, o filme “O Sequestro do Voo 375” estreia nesta quinta (7) em 602 salas de 564 cinemas (é o maior circuito de estreia de um filme nacional distribuído pela Disney BR da história).
O curioso é que, como o próprio longa-metragem avisa em seus letreiros finais, quando Bin Laden foi morto, em 2011, matérias sobre o sequestro do voo da Vasp foram encontradas em seu bunker no Paquistão. Os terroristas da Al-Qaeda teriam estudado o caso brasileiro antes dos ataques do 11 de Setembro.
“É muito engraçado como até o Bin Laden sabia dessa história, e a gente, não. O Brasil fez, politicamente, um trabalho de apagamento sobre ocorridos na história, e acho que não foi à toa que esse fato não veio à tona como deveria. E a gente tem que ver as circunstâncias. Estamos falando dos anos 1980, de um momento socioeconômico complexo, saindo de uma ditadura militar e entrando num processo de redemocratização, um período de incertezas. A Constituinte estava vindo aí (a Constituição foi promulgada uma semana após o sequestro). Então, eu acho que nada que pudesse afetar o governo naquele momento, uma notícia dessa proporção, seria saudável para ficar sendo muito propagado”, opina Danilo Grangheia, ator que dá vida ao protagonista, o comandante Fernando Murilo.
A história ainda se torna mais extraordinária justamente por causa da forma como o piloto conduziu o episódio. Mesmo com uma arma apontada para a cabeça durante praticamente todo o tempo e vendo o amigo, o copiloto Salvador Evangelista, o Vângelis, morrer ao seu lado após levar um tiro do sequestrador, Murilo conseguiu manter a calma. E mais do que isso: ele fez duas manobras consideradas impossíveis de serem executadas com um Boeing. Para desestabilizar Raimundo Nonato – interpretado no filme pelo ator Jorge Paz –, que não largava a arma de jeito nenhum, o piloto executou um tonneau (manobra em que o avião dá uma volta completa ao redor de seu eixo longitudinal).
Como ele continuasse de pé, Murilo arriscou ainda mais e colocou a aeronave em estol, ou seja, em uma queda livre de 9.000 m, e em parafuso. Nonato finalmente tombou no chão do avião, já perto do Aeroporto Santa Genoveva, em Goiânia, onde o Boeing acabou pousando, já com o combustível no fim e com os motores praticamente sem funcionar. A façanha do comandante Fernando Murilo, no entanto, não é reconhecida até hoje pela Boeing, mesmo com testemunhas fora e dentro da aeronave.
O diretor Marcus Baldini acredita que seja difícil cravar o real motivo de esse caso não ser tão difundido, mas tem algumas teorias. “Quando a coisa aconteceu, teve uma cobertura da imprensa, mas depois não ganhou proporções e foi meio abafada. Assim como a gente sabe do atestado de óbito do Nonato, que foi uma anemia falciforme, uma doença congênita. Um atestado assinado pelo Badan Palhares (médico-legista que ficou conhecido pelo polêmico caso PC Farias). Tem algumas coisas que soam estranhas, mas não dá para dizer com certeza o que aconteceu. Só acho que essa divulgação de atentados terroristas talvez seja uma coisa que as pessoas tenham contido um pouco pra não estimular outros”, opina.
“O Sequestro do Voo 375” contou com uma megaprodução para fazer tudo isso funcionar e parecer crível. Inclusive, o elenco vira de cabeça pra baixo para tentar simular exatamente o que as pessoas que estavam a bordo passaram. Mesmo com uma falha ou outra nos efeitos especiais e a presença de algumas liberdades dramatúrgicas, nada atrapalha o andamento da história e o clima de tensão e emoção que literalmente paira no ar. Baldini comenta toda essa infraestrutura empregada, inclusive com o apoio da Aeronáutica, e uma reconstituição fiel da época, mas ressalta a importância da conexão emocional envolvida. “Nos chama muito a atenção esse tamanho da produção, dos Boeings, dos caças, da grandiosidade do evento como um todo. Mas, pra mim, também havia os desafios que eram o oposto disso: as sutilezas.
O filme se passa muito em um ambiente interno, com conversas de rádio, a própria relação do Murilo e do Nonato acontece em um cockpit (cabine de pilotagem), que é um espaço mínimo. Era um grande desafio caminhar nessa corda bamba, de não cair num lugar exagerado do melodrama”, salienta o diretor.
Joana Henning, sócia e fundadora da Escarlate, que chegou a contactar até profissionais de Hollywood para o projeto, reitera a importância desse equilíbrio de ação com emoção. “Tem todo um jogo de suspense que o Baldini trabalhou muito bem do início ao fim. Acredito que o filme tem três atos muito bem-definidos. A contextualização, depois a catástrofe em si e em seguida a resolução do caso, consagrando o heroísmo do piloto. Acho que o Baldini foi muito assertivo nesse sentido”, pontua.
Além das grandes atuações de Danilo Grangheia na pele do comandante Murilo e de Jorge Paz, como Nonato, destaque também para a interpretação de Roberta Gualda como Luzia, uma controladora de voo. A preparação dos atores coube ao experiente Emílio de Mello. O elenco ainda conta com Juliana Alves, Gabriel Godoy, César Mello, Wagner Santisteban, Arianne Botelho, Diego Montez, Claudio Jaborandy e o ator belo-horizontino Athos Magno.
Duas perguntas para Danilo Grangheia (ator que interpreta o comandante Murilo)
1 - A história por si é extraordinária. Mas o que mais te impressiona nela?
O que sempre me impressiona é o que você é capaz de fazer em situações-limite. Isso sempre coloca em outro patamar a compreensão das coisas. É óbvio que a circunstância política já era uma coisa impensável, e saber que alguém era motivado por essa circunstância a tomar a atitude que tomou...
Eu também tenho uma lembrança muito sensorial do caos que eram os anos 1980. Então voltar a mexer com isso, com esse material, trouxe uma sensação de estranheza. E um sequestro por si só já é um acontecimento. Ainda mais nessa proporção, nesse tamanho, com as razões todas ali sendo colocadas pelo Nonato, o tipo de negociação com o comandante Murilo, e a estratégia dele passa a ser muito surpreendente em relação a como ele lidou com esse ocorrido. Não só do ponto de vista psicológico, ali na negociação com o sequestrador, mas a alternativa que ele teve de desestabilizá-lo. As manobras que até hoje não reconhecem. Essa história toda é muito surpreendente.
2 - Qual foi o maior desafio desse trabalho?
Tudo (risos). Foi um processo muito desafiador. Primeiro, lidar com toda a questão técnica, que é um material de trabalho de um comandante. Estar num cockpit (cabine de pilotagem), entender aquela geografia, entender aquele instrumental e tentar transmitir segurança e domínio daquele ambiente, de um avião. Essa questão técnica já era um desafio. Eu passei por um treinamento sensacional, com comandantes me acompanhando, a gente passou semanas num simulador de voo e pôde fazer um treinamento incrível de pilotagem.
Uma vez entendendo minimamente isso, como lidar – já que 80% do filme é o comandante Murilo com uma arma na cabeça, numa situação-limite –, aí vem o desafio de circunstância. E dentro do cockpit é muito calor, ele girava de fato, foi feita ali uma maquinaria em que a gente girava, virava mesmo de cabeça pra baixo, como se estivesse mesmo no tonneau (manobra acrobática em que o avião executa um giro rápido completo ao redor de seu eixo longitudinal), e as outras manobras. Toda a questão técnica, junto com essa circunstância de tensão que o personagem estava passando, foi o maior desafio.
Eu acho que essa foi uma das experiências mais difíceis que eu tive de construção de personagem e de construção de energia; de poder estar à vontade ao mesmo tempo pra poder se envolver em uma cena. Foi um trabalho muito preciso e muito delicado. E sem falar a conexão com o Jorge Paz (intérprete de Nonato), que é um ator fantástico, um grande parceiro, com quem eu já havia trabalhado. A gente trocou muito, e sem contar toda a preparação de elenco com o Emílio de Mello.
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