Música

Encontros com Ney Matogrosso e Elis Regina marcaram trajetória de Tetê Espíndola

Intérprete do Mato Grosso do Sul carrega influências de Björk, Joni Mitchell, Janis Joplin e da dupla Cascatinha & Inhana em seu canto plural e diverso

Por Raphael Vidigal Aroeira
Publicado em 12 de fevereiro de 2024 | 06:30
 
 
 
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Os tios trigêmeos tocavam piano a seis mãos, e chegaram, inclusive, a ter o então presidente Getúlio Vargas (1882-1954) na plateia. A mãe, Alba, vivia cantarolando os sucessos de Dalva de Oliveira (1917-1972) e Carmen Miranda (1909-1955). Dos oito filhos, apenas uma não se encaminhou para as artes ao formar-se como enfermeira. 

Foi nesse ambiente que Tetê Espíndola cresceu em Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul. Com 20 anos, o irmão Geraldo Espíndola a presenteou com uma craviola – instrumento brasileiro inventado por Paulinho Nogueira, ideal para explorar o alcance agudo de sua “voz cada vez mais potente e alta”. 

“Acabei de ganhar uma craviola nova de Papai Noel”, brinca Tetê, que a apelidou de “onça-pintada”, e ainda está decidindo se ela vai ser elétrica ou se permanecerá acústica. Ao estrear no mercado fonográfico, em 1978, ela e os irmãos Alzira, Celito e Geraldo acabaram batizados pela indústria de “Tetê e o Lírio Selvagem”. 

O grupo se desfez antes do segundo LP, mas, como tinha contrato assinado com a multinacional, Tetê teve que entrar novamente em estúdio, o que resultou em “Piraretã”, onde ela fez questão de gravar uma música do irmão Geraldo Espíndola. “Vida Cigana” cativava o público desde as rodas de violão informais no Mato Grosso do Sul.

“Todo mundo adorava! Fui a primeira a lançar e, depois, um monte de gente regravou”, pontua Tetê. À sua versão original, sucederam-se registros do grupo de pagode Raça Negra, da dupla sertaneja César Menotti & Fabiano e do cantor romântico José Augusto. 

Referências

“Ó meu amor, não fique triste/ Saudade existe pra quem sabe ter”, dizem os versos iniciais do hit. A música, porém, não foi trabalhada pela gravadora, que preferiu investir em “O Cio da Terra”, composição de Milton Nascimento e Chico Buarque, com direito a clipe no “Fantástico”. No álbum seguinte, após “receber um toque” de Arrigo Barnabé, Tetê cantou “Sertaneja”, pérola de René Bittencourt lançada por Orlando Silva em 1939, que ela transformou em uma guarânia. “São músicas que vieram para ficar, fazem um sucesso danado nos meus espetáculos”, afiança. 

Outra que não pode faltar é “Na Chapada”, que propiciou o primeiro encontro com o conterrâneo Ney Matogrosso, no dueto para o LP “Gaiola”, de 1986. Parceria de Tetê com Carlos Rennó, a música nasceu em um dos habituais passeios da cantora pela Chapada dos Guimarães.

Extasiada com um banho de cachoeira, que ainda é um de seus “programas preferidos”, Tetê deu vazão à melodia na craviola de uma só tacada, no quarto de hotel em que estava hospedada para um show. Ao relatar a história da inspiração para Rennó, o resultado foi “essa letra maravilhosa”, que poetiza: “Há um chuvisco na chapada/ Em toda a mata um cochicho em cê-agá”. 

A ideia de convidar Ney Matogrosso partiu do produtor do disco. “Ney é maravilhoso, adoro essa gravação”, enaltece Tetê. Quem também marcou sua trajetória foi Elis Regina (1945-1982), sua “primeira referência musical”. Com dez anos, Tetê não podia comparecer às apresentações da estrela, e qual não foi sua surpresa quando ela apareceu em sua própria casa, já recheada de músicos, no auge do sucesso, logo depois de vencer o 1º Festival de Música Popular Brasileira da TV Excelsior, em 1965, com “Arrastão”, de Edu Lobo e Vinicius de Moraes. “Aquilo me encantou muito”, afirma.

Na adolescência, ela foi aplicada em Janis Joplin (1943-1970) e embarcou no blues rascante da intérprete norte-americana. “Só escutava essas loucuras e Beatles”. Posteriormente, voltou-se para um “período raiz, da fronteira”, com os conjuntos paraguaios que aportavam em seu lar. Foi quando se ligou em Cascatinha & Inhana, a mais tradicional dupla caipira do Brasil. Esse caldeirão adensou-se, na maturidade, com a canadense Joni Mitchell, a islandesa Björk, e, há bem pouco tempo, a brasileira Pabllo Vittar. “Acho essas garotas novas o maior barato”, elogia. 

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