CINEMA

Filme 'Napoleão' acompanha a ascensão e queda do imperador francês

Joaquin Phoenix vive o polêmico personagem no filme dirigido por Ridley Scott

Por Paulo Henrique Silva
Publicado em 23 de novembro de 2023 | 07:00
 
 
 
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Napoleão não é muito diferente dos replicantes de “Blade Runner”, o clássico filme de ficção científica lançado em 1982. Em seu mais recente trabalho, em cartaz nos cinemas a partir de hoje, o diretor Ridley Scott investe num drama histórico de quase três horas de duração em que o protagonista – Napoleão Bonaparte, célebre imperador que liderou a França em diversas guerras – tem um grande desejo: a continuidade.

Esse anseio está na essência de boa parte da filmografia do cineasta britânico, sendo o grande motivador dos androides de “Blade Runner” liderados por Roy Batty, em busca do Criador para garantir a longevidade.  “Napoleão” segue o mesmo caminho, com o personagem vivido por Joaquin Phoenix querendo não só a permanência no poder, mas também que, na sucessão, os seus herdeiros estejam à frente.

A questão da linha sucessória é outro tema importante, pois Scott mostra que as aspirações de Bonaparte não eram muito diferentes dos princípios do monarquismo que a República derrubou – o ponto de partida do filme é a morte por guilhotina da rainha Maria Antonieta. O imperador é mostrado como herói e vilão, responsável pela morte de  mais de dois milhões de soldados.

O lado mais humano vem de  sua relação doentia com a mulher Josefina (Vanessa Kirby, da série “The Crown” e dos últimos filmes de “Missão: Impossível”). Ao mesmo tempo que exibe um grande amor por ela, manifesto na troca de cartas que seguiu até mesmo ao divórcio (motivado pelo fato de ela não poder gerar um filho), Napoleão a trata da mesma forma como se estivesse num campo de batalha.

Esses dois momentos, juntos,  ilustram a condução masculina das coisas, em que a palavra subjugar se torna o elo entre os universos privado e institucional, entre o marido e o chefe de uma nação. Napoleão “ataca” a sua esposa na cama de uma forma completamente patética, sem se preocupar com o prazer de Josefina, cada vez mais escanteada no palácio até viver seu exílio nos arredores de Paris.

Nas muitas contendas que o filme acompanha (a principal delas contra a força austro-russo, em 1805, conhecida como a Batalha de Austerlitz), há o charme das vitórias movidas por estratégias, mas Scott não vê glamour nelas, enxergando conquistas como um grande amontoado de corpos. Esse é um dos aspectos mais interessantes do filme, ligando Napoleão à história de líderes atuais que trocam poder por vidas perdidas de seu próprio povo.

Scott, comprovadamente, consegue segurar uma narrativa quando entra na seara épica – vide “Cruzada” (2005), “Êxodo: Deuses e Reis” (2014) e “Gladiador” (2000), quando trabalhou com Phoenix pela primeira vez. Mas, ao querer contar com detalhes a ascensão e queda de Napoleão, o realizador perde de vista pontos cruciais, como a própria relação com Josefina, personagem que poderia ser mais aproveitada no sentido de valorizar o empoderamento feminino.

Não deixa de ser um filme vigoroso, especialmente pelo trabalho intenso de Phoenix, aqui numa chave mais introspectiva, geralmente com um ar entediado e falando por murmúrios, mas a sensação é que falta alguma coisa, após duas horas e 38 minutos. O que talvez será corrigido na versão de quatro horas que será disponibilizada na plataforma de streaming da Apple TV.

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