Não é uma novidade que a vontade de ter itens exclusivos, o apego à moda de outras décadas, um preço convidativo ou a preocupação com a sustentabilidade sejam motivos comuns dos interessados no mercado de revenda, como a designer Mary Arantes. No último fim de semana, a mineira foi a responsável pela curadoria de mais uma edição do Sobretudo Reuse, evento que reuniu uma seleção de moda consciente da cidade com a presença de 12 brechós.

Diante das urgentes necessidades que os atuais problemas ambientais causados pelos hábitos humanos trazem, Mary Arantes observa que é preciso mudar a forma como produzimos e consumimos o mercado de roupas e artigos à nossa volta. De acordo com ela, em tempos de crise econômica – acirrada especialmente pela pandemia do coronavírus –, o interesse nesse setor cresceu consideravelmente. “Este universo vai muito além da moda, propõe um olhar sustentável para o consumo contribuindo para a prática da economia circular, promovendo uma maior vida útil às peças, ressignificando o conceito de consumo, trazendo itens de boa qualidade, atuais e que podem circular por muito mais tempo”, disse.

Um levantamento do Sebrae, com base em dados da Receita Federal, mostra que a abertura de estabelecimentos que comercializam produtos de segunda mão teve um crescimento de 48,58% entre os primeiros semestres de 2020 e 2021. E não só. Segundo dados da ferramenta de buscas do Google, as pesquisas por peças de segunda mão cresceram 572% no Brasil entre os primeiros semestres de 2019 e de 2022. Renata Alamy acredita que a relação de revenda está relacionada ao fato de encontrar nesses objetos uma forma de conexão com as pessoas.

“Curiosamente, já tem muito tempo em minha trajetória que trabalho com planejamento estratégico para marcas que pensam em ficar antenadas ao mercado de segunda mão. É a minha paixão, está em tudo o que eu faço”, relembra ela, que hoje comanda também a Bumerangue, empresa virtual de desapegos e achados que também esteve presente durante o evento Sobretudo Reuse.

Sua curadoria passa como premissa de vida: ela só adquire uma peça pensando no potencial de venda para outra pessoa no futuro. “Só compro algo pra mim quando entendo que serão passageiras e que vou conseguir vendê-la depois e pertencer a outra pessoa. Faço a curadoria de algo para o outro e, por isso, fico feliz de ver quando alguém compra algo que era meu entender o valor disso”, disse. 

E parece que ela não está só. De acordo com Renata, pessoas andam perdendo o preconceito sobre esse tipo de consumo e virando verdadeiros fãs do mercado de segunda mão. “Quando você conhece, entende e curte essa experiência, você não para mais. Ao contrário de uma loja, a revenda é mais sensorial, afetiva e causa até bem-estar. É uma autonomia do que você está vestindo”, pondera ela.

Novas nomenclaturas para o conceito do usado

Diante das urgentes necessidades que os atuais problemas ambientais causados pelos hábitos humanos trouxeram, a compra e venda de peças de segunda mão deixou de ser uma mera tendência para ser uma realidade. Mas para falar deste tema, a designer Mary Arantes também enumera a importância de falar sobre novas nomenclaturas e perceber que cada um desses serviços têm seu estilo e nicho de mercado. Há espaços com peças de segunda mão que se dedicam ao garimpo de peças exclusivas e de décadas passadas – o chamado vintage; têm outros que transformam completamente as peças usadas dando novas usabilidades às antigas ou ainda fazendo o reaproveitamento de roupas e tecidos – upcycling. E os brechós são mais organizados e passam por um olhar e curadoria de achados imperdíveis.

Há aqueles que se dedicam à criatividade aplicada sem limites e customizam peças dando um toque simples que promovem um outro significado. É o caso de Bianca Poppi, do Brechó da Poppi, estilista com seu negócio aqui em BH. “Quando comecei o meu próprio brechó, eu já tinha um acervo grande de peças porque eu mesma já frequentava e era consumidora desse mercado. Eu comecei a vender os meus próprios desapegos”, relembra ela. Hoje, o brechó conta com uma linha especial de roupas de linho, garimpadas por ela, bordadas à mão com frases como: “cansei de ser chique”, “viver é um rasgar-se e remendar-se” e “roupa velha futurista”, que se tornaram desejáveis pelas clientes.

“Dessa forma, as peças ficaram mais jovens e frescas e foram virando um diferencial do brechó”, explica. “É uma customização simples, um trabalho diferenciado que gosto de fazer e que não gera mais resíduo ambiental”, conclui.

Para Renata Alamy, a Bumerangue já ultrapassa o conceito do brechó. “Lá tem a roupa vintage, e 40 anos atrás, mas tem a roupa contemporânea que não faz mais sentido para ela,  que faz limpa de peças visando o consumo mais consciente. Nosso critério passa por uma curadoria e não por tempo. Passamos pela revenda do passado, presente e futuro da segunda mão para a moda circular”, explica.