Larissa Nunes ainda era criança quando descobriu seu amor pela música. “Eu devia ter uns 5 anos quando comecei a cantar em casa”, contou a paulistana, relembrando que cantava para a avó e com a mãe, com quem morava. O tempo foi passando, e Larissa encontrou mais uma paixão além da música: a atuação. Ela trocou o curso de jornalismo pela Escola de Arte Dramática da USP e, hoje, aos 24 anos, celebra a primeira protagonista de sua carreira, na segunda temporada da série “Coisa Mais Linda”, que estreou recentemente na Netflix. Ela é Ivone, uma jovem negra dos anos 60 que precisa driblar as próprias inseguranças, o machismo e o racismo para se lançar na carreira musical.
Para a nova fase da personagem, que está na história desde a primeira temporada de “Coisa Mais Linda”, Larissa precisou soltar a voz – literalmente! A paulista, que também é cantora, gravou as músicas cantadas por Ivone na trama. “Quando eu entrei em contato com o João Erbetta (responsável pela trilha sonora da série), ele me disse para aproveitar o amadurecimento da Ivone para mostrar o que eu também gostava de fazer”, relembrou, comemorando o fato de poder mostrar para mais pessoas o seu lado musical.
Larissa revelou que começou a escrever as próprias canções ainda na adolescência. Mas, tal como sua personagem em “Coisa Mais Linda”, precisou vencer algumas barreiras para seguir na carreira artística. “Quando eu saí do ensino médio, vi que minha mãe não estava muito contente com o fato de eu ir para a arte, então entrei para o curso de jornalismo e fiz um ano. Nessa época eu também trabalhava como jovem aprendiz em um banco”, disse ela.
Mudança
Aos 19 anos, ela percebeu que aquilo tudo não era a praia dela e decidiu seguir outro caminho. Larissa, que havia descoberto o teatro e se apaixonado por ele, trocou o jornalismo e o emprego no banco pela Escola de Arte Dramática da USP. “Eu achava que na atuação eu poderia unir as coisas, eu poderia cantar atuando”, contou.
A mudança, ela garante, valeu muito a pena. “Eu larguei tudo me sentindo muito sozinha na minha escolha. Logo depois que as coisas foram se ajeitando e as oportunidades foram aparecendo eu puder ver um apoio maior da minha família, e isso me deu um pouco mais de coragem para entender que era esse o meu caminho”, comentou.
Trajetória
Atualmente, Larissa Nunes traz no currículo espetáculos teatrais como “Ícaro and The Black Stars” (protagonizado pelo ator Ícaro Silva e que passou por Belo Horizonte); participação na série “3%”, também da Netflix (que marcou a estreia dela no audiovisual); além de projetos musicais. Em 2017, ela lançou seu primeiro EP, “Larinu”, com três canções autorais. Durante a quarentena, ela gravou e lançou seu segundo projeto musical, também autoral: o EP “Quando Ismália Enlouqueceu…”.
"É um EP muito confessional, caseiro. É para você ouvir com fone de ouvido, no seu aconchego, porque são palavras que eu escrevi que têm a ver com a sensação do isolamento social e de coisas que a gente está vivendo neste momento”, explicou. Segundo ela, o EP foi totalmente gravado em casa com o celular. O trabalho foi feito, de maneira remota, com o hitmaker Eric Beatz, amigo de Larissa que mora no Rio de Janeiro.
“Eu fui gravando no celular, ele foi me passando as músicas instrumentais, e outro amigo nosso foi mixando. Escolhemos a linguagem radiofônica, aquele barulhinho de vinil, para todas as músicas, para que fosse uma estética bem intimista”, revelou. Ela destacou que os dois EPs foram lançados de maneira independente. “Eu sou uma artista independente neste momento, mas tenho muita vontade de encontrar um selo para viver uma nova fase”, afirmou.
Larissa revelou que tem aproveitado a quarentena – que ela está passando em casa, com a mãe – para compor novas canções e planejar os passos futuros. “Eu nunca fiz novela, mas tenho muita vontade. Também tenho vontade de fazer cinema”, contou ela, que disse estar aberta a convites.
Racismo
Larissa Nunes, que apareceu de mansinho na primeira temporada da série “Coisa Mais Linda” como a jovem Ivone, lembra que ficou surpresa quando soube que iria dividir o protagonismo com Pathy Dejesus (Adélia), Maria Casadevall (Malu) e Mel Lisboa (Thereza) na continuação da história. “Quando eu soube que a série seria renovada, eu esperava que a Ivone aparecesse porque ela é do núcleo familiar da Adélia. Mas quando eu recebi os roteiros e fiz a primeira leitura é que eu tive o real impacto e a surpresa de que ela também teria o sonho e o desejo de ser cantora”, contou a artista.
A atriz comemora o espaço que sua personagem ganhou na história, discutindo a questão do machismo e, principalmente, do racismo. “Eu fico muito animada com o fato de aparecer uma segunda protagonista negra, que também coloca a situação da mulher negra nos anos 60 de uma perspectiva diferente da Adélia. Ivone não viveu como a irmã e não passa ilesa pelo racismo quando entra de cabeça na indústria da música”, explica.
Para Larissa, “Coisa Mais Linda” é importante por trazer uma reflexão sobre a questão do preconceito racial. “Acredito que a série não tem o intuito de resolver nada, trazer uma solução mágica para o racismo. Até porque eu acredito que nós, na nossa vida real, não estamos trazendo nenhuma solução mágica para isso. Estamos falando de racismo porque o racismo existe e persiste”, afirmou. “O racismo é um problema que passam anos e anos e a gente ainda precisa falar dele e agir sobre ele, principalmente”, completou.
A artista paulista comentou os recentes movimentos, como o Black Lives Matter, que tomaram as ruas e as redes sociais. “A gente não precisar ir para os Estados Unidos para constatar que o racismo acontece”, ponderou ela, referindo-se ao assassinato de George Floyd. “Mas são fatos que chamaram a atenção, finalmente, do público em geral, e que fizeram com que pessoas que têm o nome na mídia se posicionassem sobre a questão do racismo. Eu acho isso muito bom e favorável para a luta”, destacou ela.
Larissa completou: “Eu tenho o desejo de que essa mudança seja efetiva, verdadeira, e que seja no campo do trabalho, da educação, das políticas públicas... Eu sou otimista em alguns aspectos, mas eu preciso cobrar, de alguma forma, que essa mudança seja ativa, que não seja apenas um discurso, que não seja apenas uma hashtag que a gente vai esquecer daqui a dois meses”.