Entrevista

Leônidas Oliveira sobre obras no Palácio das Artes: 'Reforma total do espaço'

Secretário de Cultura e Turismo de Minas Gerais faz balanço de sua gestão, fala sobre Lei Aldir Blanc, reabertura da Biblioteca Pública Estadual e anuncia R$ 150 milhões para a Lei Estadual de Incentivo à Cultura em 2023

Por Bruno Mateus | @eubrunomateus
Publicado em 22 de dezembro de 2022 | 06:52
 
 
 
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O arquiteto e urbanista Leônidas Oliveira assumiu a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult) em um período extremamente crítico e caótico para as duas áreas. Em maio de 2020, quando ele aceitou o convite do governador Romeu Zema para chefiar a pasta, o mundo ainda buscava entender o que era a pandemia da Covid-19 e os desdobramentos que ela causaria na economia, na saúde e nas relações sociais.

Pouco mais de dois anos e meio depois, a vacina se mostrou eficaz no combate ao vírus, e o isolamento já não faz mais parte da vida dos brasileiros. As cidades voltaram a receber turistas, e a agenda cultural foi reaberta. Agora, é nesse contexto que Oliveira olha para o que passou, faz um balanço da atuação da Secult nos últimos 30 meses e mira o futuro à frente da secretaria em um segundo mandato do governador Romeu Zema (Novo).

Nesta entrevista a O TEMPO, Leônidas Oliveira elenca os desafios nos próximos anos, anuncia a reabertura da Biblioteca Pública Estadual em janeiro, a mudança da sede da Fundação Clóvis Salgado da Afonso Pena para a praça da Liberdade e a iminente reforma do Palácio das Artes, que deve ser confirmada até meados de janeiro: “Uma grande reforma está nos nossos planos: troca de cadeiras do teatro, reforma do piso, dos banheiros, do sistema de segurança, troca de ar-condicionado, entre outras melhorias. Será uma reforma total do espaço, com investimento previsto em R$ 18 milhões”.

Leônidas Oliveira também faz um balanço da Lei Aldir Blanc em Minas Gerais, fala da importância de uma segunda edição do auxílio e se mostra otimista com a reconstituição do Ministério da Cultura no governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Como a Secult se organizou, ainda num cenário de pandemia, para a retomada da agenda do setor cultural?

No pós-pandemia, fizemos sobretudo a nossa lei de incentivo, que disponibilizou R$ 120 milhões. Pedi também que houvesse um olhar das nossas autarquias para essa retomada. A Cemig, por exemplo, abriu edital de R$ 10 milhões para patrocinar projetos da lei estadual. Contratamos 1.200 professores, num investimento no valor de R$ 2,5 milhões, que estão dando qualificação e capacitação para os gestores aprenderem a fazer e inscrever projetos na lei de incentivo. O grande problema do interior de Minas Gerais, e nós percebemos isso com a Lei Aldir Blanc, é a falta de qualificação para elaborar projetos. Temos investido muito pesado nisso. Com muito diálogo, fizemos mais reuniões do Conselho Estadual de Cultura que nos últimos dez anos. Com o Secult no Município, um programa muito importante, nossa equipe já visitou 147 municípios, andando, em média, 10 mil quilômetros por mês.

O que a Secult propôs para também contemplar aquelas pessoas e grupos que não têm capacitação para acessar um edital de lei de incentivo, que não estão nos grandes centros de Minas?

Temos um programa chamado Afromineiridade, que contempla as comunidades tradicionais de matriz africana via ICMS Cultural. Damos incentivo para que municípios façam o mapeamento dessas comunidades, tenham cadastramento sistemático dessas comunidades, dos congados, dos quilombos. Chegamos ao cadastro de 500 comunidades. Quando o Descentra vier, essas comunidades não vão precisar fazer projetos, vamos repassar o recurso diretamente para a comunidade.

Gostaria que o senhor fizesse um balanço da operacionalização da Lei Aldir Blanc em Minas.

O balanço foi o seguinte: a lei mostrou um problema gravíssimo, a falta de cadastramento dos gestores culturais de Minas Gerais. Não tínhamos cadastros, a informação não chegava. Outro problema enfrentado foi a dificuldade de entendimento das prefeituras de Minas: 75% das prefeituras não só de Minas, mas do país, nunca haviam recebido nenhum centavo para a cultura, nunca tinham feito editais para o setor. Mas também tivemos diversos pontos positivos. Foi o processo mais participativo que o governo do Estado já fez, todas as diretrizes de distribuição de recursos foram dadas e cumpridas. Empenhamos R$ 2,5 milhões para que gestores fossem capacitados para saber fazer projetos, inscrever projetos em leis; durante o processo, surgiu o programa Afromineiridade, com fórum de debates para proteger a cultura afro em Minas Gerais e refletir sobre a história do povo negro. Executamos 100% dos recursos da Lei Aldir Blanc. Foram R$ 300 milhões investidos em diversas manifestações artísticas, do circo ao congado, passando por teatro, música… A importância da Lei Aldir Blanc e de uma possível segunda versão é fundamental. A lei não teve marco regulatório, os recursos podem ser utilizados também para restauração do patrimônio histórico. As leis de incentivo fiscal que temos dependem muito da iniciativa privada, sobretudo das grandes empresas, e atendem um nicho da cultura, que são os grandes produtores. Na Aldir Blanc, há uma maior democratização dos recursos em todos os âmbitos. Estou na torcida para que a Lei Aldir Blanc II saia do papel. Ela foi o maior avanço que já tivemos na gestão cultural do país.

Quais são as expectativas e desafios para 2023 em um cenário de segundo mandato do governador Romeu Zema?

Temos, liberados para captação, a partir de 1º de janeiro de 2023, R$ 150 milhões para a Lei Estadual de Incentivo à Cultura e R$ 22,1 milhões para o Fundo Estadual de Cultura. A Secult e suas entidades vinculadas têm, para o orçamento do ano que vem, R$ 179, 6 milhões. Há ainda, R$ 120 milhões para levar o sinal da Rede Minas para todos os municípios de Minas - hoje, ele chega a 350. A municipalização das políticas públicas de cultura e a diversificação das ofertas turísticas municipais são o maior desafio que temos num Estado imenso e diverso como o nosso. Avançamos na descentralização dos recursos, na presença junto aos municípios. No entanto, é um trabalho incessante e permanente. Para se ter uma ideia, dados dão conta de que, por meio da Lei Aldir Blanc, foi a primeira vez que 75% dos municípios do país receberam recursos para a cultura. Isso mostra de forma clara essa necessidade de dar acesso à cultura e, no caso de Minas Gerais, falamos do Estado com maior número de municípios do país, ou seja, foi somente em 2021 que mais de 600 municípios receberam recursos para a cultura. Dentro desse contexto, nesse objetivo de estar junto aos municípios, que é a meta mais presente que temos, temos um programa na secretaria chamado Secult no Município. Acreditamos que pode contribuir muito também o Projeto de Lei Descentra Cultura, elaborado pelo Executivo juntamente com o Conselho Estadual de Cultura, que será levado à ALMG, e esperamos que seja aprovado. No turismo, a diversificação da oferta turística, ou seja, das locações, é outro assunto extremamente importante, além da transversalidade entre cultura e turismo, que já está posta. Nosso turismo é um turismo de cultura, de ver o patrimônio histórico, as festas populares e tradicionais.

O senhor assumiu a pasta em maio de 2020, logo no início da pandemia. Pouco mais de dois anos e meio depois, qual é a marca que acha que deixa à frente da Secult neste primeiro mandato?

Interiorização e descentralização, os números mostram isso. E não tem como falar somente da cultura, porque turismo também é cultura, com o entendimento de que a economia criativa traz turistas para Minas Gerais, traz o turista para consumir a cultura de Minas. Esse foi um grande marco e o que levou, por exemplo, Minas a ser o primeiro destino de cultura do país e o segundo destino em todas as áreas do turismo. Superamos o Rio de Janeiro. Outro ponto a se destacar é a criação de emprego e renda. Desde que assumi, criamos pouco mais de 150 mil empregos nas áreas de cultura e turismo, 50% em cada uma.

Como o senhor vê a reconstituição do Ministério da Cultura pelo futuro governo Lula e a indicação da cantora Margareth Menezes para comandar a pasta?

Estou extremamente otimista com relação à retomada do Ministério da Cultura. Esse meu otimismo é o mesmo da própria classe cultural. Vejo em todos os lugares o otimismo dos diversos setores, e esperamos o pleno funcionamento, sobretudo, dos mecanismos de fomento, que é um grande problema que temos hoje. Eles estão travados, desde projetos envolvendo setores público e privado, está tudo travado. Eu espero um olhar mais humanista para as pessoas. Em vez de falarmos em guerra cultural, falemos da cultura da paz. A indicação de um técnico, que é o (historiador, curador e gestor cultural) Márcio Tavares, para ser o braço direito da Margareth Menezes também traz muita esperança. E a Margareth tem um olhar amplo sobre a cultura negra, afro-brasileira, que é extremamente relevante. Ela entende a arte, o papel da mulher. É um avanço muito importante para pensarmos a Fundação Palmares, por exemplo. Espero que tenhamos um diálogo democrático.

Em entrevistas, o senhor chegou a criticar a interferência ideológica na Secretaria Especial de Cultura. O senhor assumiu a Secult mais ou menos no período da saída da Regina Duarte, e de lá para cá passaram também Mario Frias, Hélio Ferraz de Oliveira e André Porciuncula. Com tantas mudanças no comando da pasta, teve uma relação difícil com o governo federal?

Só houve relação com o Hélio Ferraz, com os demais realmente não houve. Com Mario Frias simplesmente não houve diálogo, nós tínhamos pensamentos diametralmente opostos. Certa vez, o governador Romeu Zema pediu a ele que nos ajudasse a destravar alguns projetos. Ele foi extremamente deselegante com o governador. Em plena pandemia, mandou o povo da cultura trabalhar em vez de reivindicar projetos. Faço ressalvas importantes: a Funarte foi parceira o tempo todo do governo de Minas, o Iphan também, do início ao fim do governo. 

O que não foi feito em sua primeira gestão que não poderá deixar de ser executado neste segundo mandato que se aproxima?

A aprovação do Projeto de Lei Descentra Cultura, que não foi realizada por várias circunstâncias, entre elas o problema de relação da Assembleia Legislativa com o governo de Minas. O projeto não ficou muito tempo na ALMG, depois resolvemos recolher, e agora esperamos que ele seja realmente aprovado, porque vamos reenviar para a Assembleia. Não adianta fazer as coisas sem fazer o principal, e o principal era democratizar e modernizar os recursos, mas alguns recursos ainda dependem da aprovação dessa lei. Com ela, comerciantes e grupos de empresas vão conseguir patrocinar a cultura. Me dá muita pena não ter conseguido aprovar o Descentra, fico chateado com isso. Outra coisa que me dói o coração é não ter conseguido ir a todos os municípios. Nos faltam tempo e equipe para atender os prefeitos como deveríamos. 

Sobre equipamentos culturais do Estado e Circuito Liberdade: haverá novidades?

A novidade é que a sede da Fundação Clóvis Salgado vai sair da Afonso Pena e será transferida para a praça da Liberdade, na Casa Amarela, onde hoje funciona o Cefart Liberdade. 

E a reabertura da Biblioteca Pública Estadual, adiada por duas vezes?

Está na fase final a reforma, poderíamos inaugurar na semana que vem, mas decidi que será reaberta em janeiro, com o lançamento de um projeto de férias para crianças.

Quanto às políticas públicas na área da preservação do patrimônio histórico, um tema muito caro ao senhor, o que esperar da atuação do Iphan e do Iepha-MG?

Espero um projeto, ou melhor, a volta de um projeto de restauração do patrimônio histórico, como foi o PAC Cidades Históricas, a maior iniciativa nesse sentido que o país já teve, que colocou em Minas mais de R$ 300 milhões. Esse projeto foi fundamental, e a retomada de um projeto vigoroso é muito necessária. Espero a retomada do incentivo, do pleno funcionamento de um programa de requalificação do patrimônio histórico. Se isso acontecer, estaremos satisfeitos. O Iphan não teve nenhum projeto nos últimos quatro anos para a restauração do patrimônio histórico em Minas sem ser os que já estavam caminhando.

A reforma do Palácio das Artes é uma realização que a população pode esperar para 2023?

A possibilidade é muito grande, mas ainda não foi confirmada. Nós passamos pelas duas fases em um projeto do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de restauração de patrimônios históricos, e o Palácio das Artes se encaixa nessa proposta. Estamos na fase final de classificação. Uma grande reforma está nos nossos planos: troca de cadeiras do teatro, reforma do piso, dos banheiros, do sistema de segurança, troca de ar-condicionado, entre outras melhorias. Será uma reforma total do espaço com investimento previsto em R$ 18 milhões. O BNDES tem até meados de janeiro para definir os contemplados. Talvez uma confirmação já saia nos próximos dias.

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