A filipeta anunciava, no alto da página, que haveria xote, maracatu e baião naquela noite no Circo Voador, icônico espaço cultural do Rio de Janeiro, localizado na Lapa. A informação de um show-baile com Lula Queiroga, Lenine e Tadeu Martins aparecia logo acima da atração principal, destacada em negrito com os dizeres: “E a presença muito especial do Rei do Baião Luiz Gonzaga”.
Lenine, 60, guarda suas memórias daquele sábado de 1984, quando o país já vivia a ebulição do movimento Diretas Já, que culminou com a eleição, por um colégio eleitoral, de Tancredo Neves (1910-1985) à Presidência da República. “Uma multidão que estava do lado de fora do show quebrou o alambrado para invadir o espaço e nos ouvir”, recorda Lenine.
Essa foi uma das oportunidades que o pernambucano teve de estar ao lado de seu ídolo. “Dividi o palco com Luiz Gonzaga em outras duas ocasiões e tenho lembranças muito afetuosas desses momentos”, declara ele, guardando para si confidências mais íntimas dos encontros. Ao lado de Gonzaga, Lenine coloca na conta de Jackson do Pandeiro a responsabilidade pela “formatação do que conhecemos como música nordestina”, diz.
Esse repertório será a base do espetáculo que o músico realiza neste sábado (23), em BH, prestigiando outros nomes do Nordeste, com canções do paraibano Sivuca, o alagoano Hermeto Pascoal e o baiano Dorival Caymmi, como parte do projeto Mano a Mano. O centenário de nascimento de Jackson do Pandeiro serviu como gancho. Em 1999, o entrevistado lançou “Jack Soul Brasileiro”, um dos maiores sucessos da sua carreira, que celebrava “o país da contradição” por meio da figura do Rei do Ritmo. “Jackson é um dos mestres da música brasileira”, destaca.
Mas Lenine não estará só em cena. Na primeira parte, ele recebe Dudu do Cavaco, em uma parceria ainda inédita. “Não nos conhecemos pessoalmente, e isso vai acontecer da melhor maneira possível, que é fazendo música”, afiança. Dudu do Cavaco, que tem síndrome de Down, é irmão de Leonardo Gontijo que, em 2010, idealizou o Instituto Mano Down, também envolvido na iniciativa.
Na segunda parte da apresentação, é a vez de Lenine abrir os braços para a Orquestra de Câmara Sesiminas. “Não são todas as músicas populares que se encaixam ao universo de uma orquestra. Então, há que se ter esse tipo de discernimento, de entender quais melodias e canções estimulam essa palheta de sons orquestrais”, afirma ele, que admite ter “assistido e vibrado com a libertação” do ex-presidente Lula, seu conterrâneo de Pernambuco, e lamenta o momento político do Brasil. “É muito triste e dolorido a gente ver tanta barbárie e dissimulação. Fico angustiado”, encerra o cantor.
Serviço. Show de Lenine, neste sábado (23), às 21h, no Centro Cultural Minas Tênis Clube (rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Ingressos: R$ 30 (inteira)