Aos 83 anos, Mauricio de Sousa vê sua trajetória com orgulho e seu trabalho com responsabilidade. Há muitas gerações, as revistinhas da Turma da Mônica têm sido uma espécie de “cartilha extraoficial”, como ele mesmo define, que auxilia o processo de alfabetização de muitas crianças no Brasil. Quem nunca pegou um gibi ou uma tirinha da Mônica para ler aos 7, 8 ou 9 anos, levante a mão! Alguém? Mauricio de Sousa é pop. Tanto que ele próprio aparece, vez ou outra, nas páginas das HQs da turma do Bairro do Limoeiro, inspirado nas lembranças do autor.

“Minha infância é inesquecível”, fala Mauricio. “Às vezes, acho que ainda não saí da infância, e, dessa forma, me sinto livre para criar e me aproximar desse leitor jovem, sempre com essa responsabilidade de conversar de igual para igual”, afirma. Esse é um dos segredos na criação de qualquer obra para o público infantil: nunca subestimá-lo. “Continuo usando o mesmo senso que tinha há 60 anos, com a mesma vontade de conversar com as crianças ainda hoje, aos 83 anos. E tudo continua dando certo. Meus personagens ainda funcionam bem”, diz ele.

Para os próximos anos, o ilustrador tem o desejo de seguir fazendo histórias divertidas e sempre alegres. “Devemos pregar para as crianças a alegria de estudar, de ler e, principalmente, de viver a infância”, defende ele.

Primeira tirinha

Mauricio, desde jovem, tem essa característica e astúcia de buscar tendências internacionais e transformá-las em projetos sólidos. Sua primeira tirinha nasceu desse talento, lá em 1959, quando era repórter policial no jornal “Folha de São Paulo”. “Queria abandonar a reportagem policial e chegar nos quadrinhos”, conta Mauricio, que não via sentido em importar histórias de quadrinistas internacionais, cujos contextos nada tinham a ver com a realidade brasileira. “Então pensei: ‘Olha, posso substituir os americanos’. Assim, comecei a copiar mesmo o sistema de criação, produção e distribuição dessas tirinhas para reproduzi-las aqui”, lembra o quadrinista.

Assim, em 1959, depois de esquecer a tirinha duas vezes dentro de um táxi antes de conseguir entregá-la aos editores do jornal, Mauricio conquistou espaço com a história muda do cachorro que fica preso embaixo de um caixote usado como palanque para um político. Bidu foi um nome sugerido por colegas de redação. Franjinha, seu dono, foi inspirado em um sobrinho de Mauricio. O sucesso foi imediato e, a partir do schnauzer, muitos outros personagens foram surgindo. Após quatro anos, as tirinhas do Mauricio já tinham aparecido em 400 publicações.

Bidu nasceu cinza e, quando os jornais ganharam cores, o cão espertalhão não poderia ser apenas marrom ou preto. “Achei que os bichinhos ficariam perdidos lá no meio das histórias se fossem comuns, então resolvi colocar essas cores mais chamativas: o Bidu azul, o Floquinho verde, o Bugu azul...”, justifica.

Evolução

Nesses 60 anos, muita coisa aconteceu. A Turma da Mônica ganhou mais personagens, diversidade racial, social, viajou para o futuro com a Turma da Mônica Jovem, modernizou seus traços na versão “toy”. Além disso, a galerinha de Mauricio encontrou Ziraldo, Monteiro Lobato, Paulo Coelho. Os personagens foram parar em obras como a Monalisa no projeto “Histórias em Quadrões”; conquistaram as telinhas e as telonas, em 2D, 3D e, agora, em live-action.

“Sou muito curioso e vou atrás de novidades. Quero sempre saber o que é feito, como é feito, e contrato uns jovens talentosos para me ajudar. Isso me rejuvenesce”, fala Mauricio, que nem pensa em parar. “Passei esse tempo todo querendo mais. Sempre que ouço alguém falando: ‘Puxa, trabalhei muito e quero descansar’, não me identifico. Comigo não tem essa de jeito nenhum”, conclui.