Audiovisual

Mostra Ecofalante de Cinema exibe 69 filmes em 12 espaços de BH até o fim do mês

A partir desta terça-feira (9), a produção de 26 países será representada no festival dedicado às temáticas socioambientais

Por Bruno Mateus | @eubrunomateus
Publicado em 08 de agosto de 2022 | 15:18
 
 
 
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No dia 5 de novembro de 2015, aproximadamente às 15h30, a barragem da Samarco/BHP Billiton em Mariana rompeu. A destruição foi tanta que a comunidade de Bento Rodrigues foi soterrada pela lama de rejeitos. Ao todo, 19 pessoas morreram e diversos municípios e comunidades rurais foram impactados com a contaminação do rio Doce, atingido pela avalanche de rejeito de minério de ferro. Um mês depois do crime ambiental e social da Samarco, o cineasta Lucas Bambozzi e a roteirista e escritora Christiane Tassis se encontraram para um café em Belo Horizonte. Christiane tinha a ideia de um filme. Dias depois, a dupla começou a trabalhar no roteiro.

Agora, “Lavra” estreia na capital mineira como um dos destaques da Competição Latino-Americana da 11ª Mostra Ecofalante de Cinema, que volta ao formato presencial em BH após dois anos restrita ao universo online. Voltado às produções audiovisuais que trazem o debate socioambiental como foco, o evento começa nesta terça-feira e exibe 69 filmes de 26 países até o fim do mês (veja detalhes no fim da matéria).

“Lavra” conta a história da geógrafa Camila, que volta à sua terra natal depois de o rio de sua cidade ser contaminado pelo maior crime ambiental do Brasil, provocado por uma mineradora transnacional. Ao fazer o mapeamento dos impactos da mineração em Minas Gerais, ela repensa sua vida e se envolve com ativistas e movimentos sociais. Rodado no estilo road-movie, o filme é uma ficção que não se descola da realidade.

Quando a barragem da Vale em Brumadinho rompeu, deixando 272 mortos e um rombo ambiental incalculável, o plano de filmagem foi alterado após mais um crime ambiental das mineradoras em Minas. “O filme acaba sendo sobre isso, sobre a perspectiva de não haver muita trégua, de que essa tragédias vão continuar acontecendo”, pontua Bambozzi.

Para o diretor, o longa também traz aspectos do cinema documental. “Essa definição se é ficção ou documentário é um pouco fluida. É curioso porque dá para pensar que é uma ficção, mas podemos entender também como um documentário que acaba buscando elementos ficcionais para discutir filosoficamente aspectos mais subjetivos sem se valer de especialistas ou de informações técnicas”, afirma Lucas Bambozzi.

Aprovado em 2016 no Fundo Setorial do Audiovisual da Ancine, a ​​Agência Nacional do Cinema, “Lavra” é, segundo o diretor, uma bandeira de resistência à política que despreza e ignora a cultura e a arte. “É uma terra arrasada desde então, com a destituição da Dilma, e essa ideia de terra arrasada está no filme. O filme é muito sobre montanhas destroçadas e sobre essa terra arrasada na cultura, na produção cultural.

“Lavra” foi premiado no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro e selecionado para o IDFA-Amsterdã, o mais importante festival internacional de documentários. Em setembro, o filme entra no circuito nacional, distribuído pela Pandora Filmes. Bambozzi espera que o público, ao ver o longa, possa entender extrativismo como um processo ligado à história do país desde a colonização.

“A gente espera que ele tenha público, que funcione como esse despertar. Podemos usar o termo denúncia, mas vamos pensar também na ideia de evidenciar nuances que nem sempre estão associadas à discussão sobre mineração”, pondera o cineasta.

Democratização

Diretor da Mostra de Cinema Ecofalante, Chico Guariba celebra a retomada do formato presencial em Belo Horizonte. Em São Paulo, a mostra, que é itinerante, termina no dia 17 deste mês. Porto Alegre deve receber o festival ainda em 2022. Na capital mineira, entre os quase 70 filmes do festival estão os indicados ao Oscar “Ascensão”, de Jessica Kingdon, e “Escrevendo Com Fogo”, de Rintu Thomas, além de “Mil Incêndios”, premiado nos festivais de Locarno, e “Território”, laureado em Sundance.

A programação da Ecofalante ainda exibe o clássico "Koyaanisqatsi", de Godfrey Reggio, marco do cinema socioambiental lançado há 40 anos. Menção também para a homenagem ao ator e diretor francês Jacques Perrin, que terá seus filmes exibidos nesta edição.

“O cinema está em crise no mundo inteiro, seja pela pandemia, seja porque as pessoas se acostumaram a ver filmes em casa. O papel do festival é trazer produções de primeira linha para ajudar os cinemas a recuperarem o público. Não está fácil em lugar nenhum do mundo”, ele comenta.

Um aspecto importante da Ecofalante é a busca pela democratização do cinema nas capitais. Em BH, por exemplo, nove centros culturais das periferias da cidade receberão a programação da mostra. Bairros como São Bernardo, Vila Nossa Senhora de Fátima, São Cristóvão, Urucuia e Regina terão sessões de cinema abertas aos moradores. “Essa é uma estratégia da mostra: democratizar o acesso aos filmes e ao debate socioambiental. Fazer formação de público nas periferias também é nossa ideia”, diz Chico Guariba.

O diretor da Ecofalante ressalta que em tempos de crise ambiental no Brasil e no mundo, acompanhada de um permanente colapso social e econômico. Guariba diz que refletir sobre a crise causada pela ação do homem na natureza e pelos ataques aos povos tradicionais é uma das missões do festival, “além de trazer cinema de qualidade, com informação, com forte embasamento científico, para iniciar a população a discutir mais essas questões”.

Em período de processo eleitoral, ele completa, a sociedade deve estar mais atenta. “Estamos num cenário de degradação e isso deve ser levado em conta nessas eleições. O Brasil, em particular, está pior que os outros países”, conclui Chico Guariba.

Programe-se

A 11ª Mostra Ecofalante de Cinema, realizada pela ONG Ecofalante, começa nesta terça-feira (9) e exibe 69 filmes de 26 países até dia 31 deste mês. Gratuito, o evento ganhará as salas do Cine Santa Tereza, do Centro Cultural UFMG, do Sesc Palladium e de nove centros culturais da prefeitura de Belo Horizonte. Informações completas sobre a programação podem ser acessadas no site oficial da mostra

 

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