Artes plásticas

Victor Brecheret, ícone da Semana de 22, ganha mostra inédita em BH

Com foco na temática indígena, exposição reúne, a partir desta quarta (5), no Museu Inimá de Paula, cerca de 57 trabalhos emblemáticos do escultor ítalo-brasileiro

Por Alex Ferreira | @alexnycman
Publicado em 05 de abril de 2023 | 05:30
 
 
 
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O reconhecimento do potencial cultural dos povos originários na formação da identidade nacional é o mote central da exposição “Brecheret Modernista: A Imagem Indígena como Símbolo de Brasilidade”, do ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1884-1955), que o Museu Inimá de Paula, no centro da cidade, inaugura nesta quarta-feira (5). 

Ícone do modernismo no Brasil, o escultor foi um dos primeiros a assimilar temas e lendas indígenas na vanguarda artística do país. Divididas entre esculturas, fotos e desenhos originais, as 57 obras que compõem a mostra fazem alusões diretas à mitologia e ao universo dos índios. 

A curadora Maria Izabel Branco Ribeiro explica que os trabalhos refletem bem o idealismo do importante movimento artístico e cultural, que desde o início buscava criar um estilo novo e antropofágico, que valorizasse as contribuições nativas e africanas. 

“O projeto modernista tinha como foco produzir obras culturais e literaturas condizentes com o momento vivido (na época) e que espelhasse o Brasil em sua população e natureza. A intenção deles era fazer uma arte livre de restrições e padrões importados e que não sofresse de imposições da academia”, observa a professora e doutora em história da arte. 

“A busca de uma 'face brasileira' era preocupação comum na década de 1920. Porém, foi só a partir de 1930 que escritores como Guilherme de Almeida (1890-1969) passaram a desenvolver interesses regionalistas, evidenciando aspectos e mitos da tradição paulista”, contextualiza a pesquisadora. 

Nascido na Itália, Victor Brecheret iniciou sua formação artística em 1912, no Liceu de Artes e Ofícios, em São Paulo. Depois, ele estudou em Roma, onde se tornou pupilo do pintor e escultor Arturo Dazzi.  

Descoberto em 1920 pelos modernistas Mário de Andrade (1893-1945) e Oswald de Andrade (1890-1954), Di Cavalcanti (1897-1976) e Menotti del Picchia (1892-1988), o jovem acabaria se tornando uma das figuras de destaque daquela geração. 

“Em uma visita ao edifício do Palácio das Indústrias – ainda em construção em 1920 –, Menotti, Guilherme de Almeida e Helios Seelinger foram informados sobre um artista solitário que trabalhava no local. Então decidiram conhecê-lo com o objetivo de troçar de suas obras. Ficaram surpresos, pois as esculturas dele propunham algo desconhecido. A partir dali, Brecheret não só foi acolhido pelo grupo, mas passou a representar a bandeira que levantavam em favor de uma nova escultura”, revela Maria Izabel. 

Um ano após o encontro, Brecheret embarcou para Paris com uma bolsa de estudos de cinco anos. Porém, mesmo de longe, o escultor participou com suas obras da Semana de Arte Moderna de 1922. 

“Antes da viagem, ele foi aconselhado por Mário de Andrade a não se esquecer dos indígenas brasileiros”, revela a curadora, citando que Victor Brecheret levaria a recomendação do amigo a sério e acabaria absorvendo aquelas ideias ao voltar da Europa, já nos anos 1930. 

Maria Izabel diz que tudo isso ganha evidência na exposição. 

“Além de peças com temática indígena realizadas após meados da década de 30, a exibição conta ainda com referências a artistas que desde o começo do século 20 se dedicaram ao tema”, indica. 

Dessa forma, o recorte apresenta esculturas de Brecheret feitas nos anos 1910, 1920 e 1930, que foram escolhidas especialmente para contextualizar a formação de sua linguagem plástica. Há ainda desenhos indicativos de seu processo de criação, assim como fotos de usos e costumes de povos originários relacionados a situações abordadas nas esculturas e muito material referente à sua proximidade com outros modernistas. 

“Brecheret teve sólida formação técnica e contato com diversas propostas artísticas relacionadas às vanguardas internacionais. Esses aspectos, somados à sua sensibilidade, permitiram a criação de peças compassadas com seu tempo e a formulação de linguagem escultórica própria, como atestam suas obras com temática indígena. Pode-se dizer que isso é algo único na arte brasileira daquele período”, informa a curadora. 

Destaques 

Entre os highlights de “Brecheret Modernista” estão as esculturas “Drama Marajoara”, “Onça” e o bico de pena sobre papel “Estudo para Indígena”, que confirmam a preocupação do escultor com herança nativa do Brasil. 

Outro trabalho que chama atenção é “Soror Dolorosa”, que se inspirou no “Livro de Horas de Sóror Dolorosa”, de Guilherme de Almeida, e foi exposta na Semana de Arte Moderna de 1922. 

Artista influente 

Maria Izabel aponta que o trabalho de Brecheret também influenciou outros nomes da arte nacional. 

“Ele mantinha contato próximo com escritores de vanguarda e, em alguns casos, serviu de referência para muitos deles. Por exemplo, sua escultura ‘Cabeça de Cristo’ (1919) foi comprada por Mário de Andrade e se transformou numa fonte de revolta para os familiares do poeta, situação que o levou a escrever o livro ‘Pauliceia Desvairada’”, esclarece a curadora. 

Para a estudiosa, exatamente por ter ajudado a dar cara à arte brasileira é que a obra do escultor continua tão relevante. 

“Brecheret é uma referência não só na arte feita no Brasil durante a primeira metade do século 20, mas também nos dias atuais. O fato de ter tido esculturas premiadas na I Bienal de São Paulo, em 1951, é significativo do reconhecimento de um artista já consagrado e aberto a novas possibilidades. Suas esculturas demonstram grande potência plástica e sensibilidade, permitindo uma riqueza de leituras e experiências. Tudo isso faz dele um artista atemporal”, arremata Maria Izabel. 

Serviço 

O quê: Exposição “Brecheret Modernista: A Imagem Indígena como Símbolo de Brasilidade” 

Onde: Museu Inimá de Paula (rua da Bahia, 1.201, centro) 

Quando: A exibição começa nesta quarta-feira (5) e segue até o dia 25 de junho 

Quanto: Gratuito

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