Rainha dos Baixinhos

Xuxa faz 60 anos nesta segunda; conheça um pouco da história da apresentadora

Um dos maiores ícones da TV brasileira, artista celebra seis décadas em ano cheio de projetos

Por Jéssica Malta
Publicado em 27 de março de 2023 | 06:30
 
 
 
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Nesta segunda-feira, 27 de março, Xuxa chega aos 60 anos. Consagrada no Brasil, e fora dele, como a “Rainha dos Baixinhos”, Xuxa havia deixado de ser uma “baixinha” quando deu os primeiros passos rumo à fama. Com uma carreira de modelo, que teve início quando ela ainda tinha 16 anos, Maria da Graça Xuxa Meneghel não demorou a estampar capas de revistas ao redor do país. 

A guinada mais intensa, porém, aconteceu quatro anos depois, em 1983, quando ela foi convidada para comandar o programa “Clube da Criança”, na extinta TV Manchete. A figura da loira, que ainda povoava o universo mais adulto - ela já tinha posado para a "Playboy" no ano anterior e estrelado também o filme “Amor Estranho Amor’, que, embora seja creditado como “o filme pornográfico da Xuxa", nada mais é que um drama surgido nos moldes do movimento da Pornochanchada - começou, então, a ser relacionada ao universo infantil. 

“Ela vai para a televisão e você passa a ter uma modelo apresentando um programa infantil sem o menor preparo para tal, sem a menor abordagem pedagógica”, pontua Reynaldo Maximiano, professor de jornalismo e publicidade da Universidade Estadual de Minas Gerais (Uemg), especialista em telenovelas e crítico de TV. 

Embora a nova função na televisão fosse uma completa novidade para a artista, Xuxa acaba tendo êxito no programa da Manchete e, em 1986, é convidada pela Globo para comandar o “Xou da Xuxa”. Apesar do sucesso que mantém o programa no ar até 1992, Xuxa não passa despercebida pela crítica. “Havia um apelo de erotização dos corpos, as roupas que ela vestia eram sempre muito curtas, as pernas muito expostas e isso deu margem para uma série de discussões sobre o tema e sobre como esse conteúdo chegava a crianças de tenra idade”, conta Maximiano. 

Apesar das críticas e polêmicas que envolviam o nome da artista, Xuxa não deixa de representar uma inovação para a televisão. “Até os anos 1980, os programas infantis eram comandados por palhaços e figuras que já eram identificadas como sendo do universo infantil. Eles também tinham uma linguagem que tratava as crianças de uma forma que subestimava a inteligência delas, ou as tratavam como pequenos adultos, com palavras difíceis. Já a Xuxa chega com gírias, com maneirismos”, explica. 

Com a consagração na televisão, foi a vez de Xuxa expandir a atuação para a cena musical - algo que tinha sido feito na TV Manchete, com a participação no disco “Clube da Criança", mas ganha mais intensidade na Globo com os discos anuais do “Xou da Xuxa”. “O primeiro desafio havia sido transformar uma modelo em uma apresentadora infantil e, o segundo, seria fazer com que ela cantasse”, observa Reynaldo. 

Mais uma vez, a empreitada se provou um sucesso, a ponto de a apresentadora conquistar, em 2002 e 2003, dois prêmios do Grammy Latino com “Xuxa Só Para Baixinhos 2” e o “Xuxa Só Para Baixinhos 3 - Country”. A artista também recebeu indicações em outras quatro ocasiões, a mais recente em 2013, com mais uma edição do projeto “Xuxa Só Para Baixinhos”. 

Se Xuxa teve uma importância grande para a televisão brasileira, o sucesso dela no país também se expandiu e o formato de seus programas acabaram se transformando em uma franquia que foi exportada para países da América Latina, para os Estados Unidos e, também, para a Espanha. “Eram vendidos os cenários, personagens e os figurinos da Xuxa, que incluíam aquelas xuxinhas sempre muito extravagantes, o que era algo bem anos 1980”, explica Maximiano.

O cinema, território onde Xuxa já havia estado antes de iniciar a carreira no universo infantil, também foi palco para produções que tinham o nome e a assinatura da artista - aliás, com um de seus longa-metragens, o filme “Lua de Cristal”, a artista alcança uma das 30 maiores bilheterias do cinema brasileiro, alcançando um público de mais de 4,1 milhões de pessoas, segundo dados da Ancine. 

Amadurecimento e ida para a Record 

Já consagrada como “Rainha dos Baixinhos”, Xuxa se lançou a novos desafios. Na TV Globo, apresentou programas que partiam para um público mais jovem e também para toda a família, como “Planeta Xuxa” e “TV Xuxa”. “As pessoas que viam a apresentadora no ‘Xou da Xuxa’ já estavam envelhecendo, então a ideia de partir para esses programas também me parece uma forma de acompanhar a audiência que também crescia”, analisa Maximiano. 

 

O período de amadurecimento de Xuxa também marca uma transformação em sua carreira, principalmente com o rompimento da parceria entre a apresentadora e a diretora Marlene Mattos - a quem Xuxa acusa, inclusive, de impedir que seus programas tivesse mulheres negras como suas famosas assistentes de palco, as “Paquitas”, e também de organizar cirurgias plásticas sem seu consentimento, episódio que ela compartilhou em uma entrevista ao canal pago GNT. 

Depois de quase três décadas na Globo, a apresentadora encerra também a parceria com a emissora. Na Record, Xuxa busca a reinvenção novamente, desta vez em um programa inspirado no talk-show comandado pela atriz e apresentadora norte-americana Ellen Degeneres. Lá, ela também esteve à frente de reality shows como o “Dancing Brasil” e “The Four Brasil”. 

“A ida para lá não vinga muito, mas é engraçado porque isso mostrou também uma maturidade dela como artista, que fica evidente até com a participação dela no ‘Porta dos Fundos’, em uma esquete que faz uma sátira dela”, observa Reynaldo Maximiano. 

Além da TV, do cinema e da música, Xuxa também se aventurou no YouTube com um canal oficial, que mesmo sem atualizações há quatro anos, mantém cerca de 205 mil inscritos. Agora, aos 60 anos, a apresentadora relembra a carreira em um documentário para a Globoplay e se lança, ainda, em outro desafio: o de apresentar o “Caravana de Drags”, reality show do Prime Video, da Amazon. 

Importância da Xuxa para o público LGBTQIA+

A empreitada de acompanhar e divulgar a arte drag queen pelo reality acabou evidenciando a relação da apresentadora com o público LGBTQIA+. Embora já tenha um discurso que defende a diversidade, Xuxa possuiu, ao longo da carreira, elementos que a aproximam deste segmento da sociedade. 

Não por acaso, durante a homenagem recebida pela apresentadora no programa “Altas Horas” (Globo), no último dia 12 de março, Xuxa teve sua importância destacada pela drag queen e cantora Gloria Groove. “Falo por todas as drags queens quando digo que, sem a Xuxa, não faríamos metade do que fizemos. Sem contar que não teríamos inúmeras referências de moda, arte, música”, disse a cantora. 

O ator Silvero Pereira reforçou o coro, e comparou a artista com a drag queen norte-americana RuPaul.
No relato feito no programa, ele contou que costumava se fantasiar escondido para dançar. "Eu não sou cria da RuPaul, sou cria da Xuxa. A nossa RuPaul é a Xuxa", disse emocionado.

Pesquisador de diversidade e cultura pop, Christian Gonzatti destaca os símbolos que fazem com que a apresentadora se insira nesse universo. “Praticamente todos os programas da Xuxa tinham uma característica que é muito próxima de pessoas LGBTQIA+: o camp”, pontua ele, explicando que o termo qualifica aquilo que é muito exagerado, teatral, brilhante, colorido e que acaba sendo visto como algo de mau gosto pelas figuras de poder. 

“O camp seria o gay feminino em contraponto à heteronormatividade em uma dimensão simbólica. Em Xuxa, havia tanta coisa para crianças queer se imaginarem em um mundo colorido e exagerado. Uma nave rosa com boquinhas pintadas de batom vermelho mandando um beijo. Ou ainda a Xuxa se apresentando em roupas que poderiam ter saído de uma competição de drag queens. Ela também cantava músicas que, para uma criança LGBTQIA+, funcionam como a possibilidade de imaginar um mundo em que elas não precisam ter medo”, exemplifica o especialista, que também é criador do Diversidade nerd e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS).

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