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No Brasil, saúde mental afasta um trabalhador por minuto

Dados do governo Federal indicam que problema atinge todos os Estados, e, por isso, depende de uma solução unificada; NR-1 é esperança dos trabalhadores

 

O aumento nos afastamentos no trabalho por problemas de saúde mental não são exclusividade de Minas Gerais, já que os números nunca foram tão altos em todo o Brasil. Dados do Ministério da Previdência Social mostram que, em 2024, o problema levou ao afastamento de uma pessoa por minuto do serviço. A média é de 1.205 afastamentos por dia, totalizando cerca de 440 mil casos no último ano, o maior número já registrado pela pasta. Em comparação a 2023, os dados saltaram quase 67%.

Conforme o levantamento do ministério, entre os motivos mais frequentes para os afastamentos estão transtornos de ansiedade (141.414), episódios depressivos (113.604), transtorno depressivo recorrente (52.627), transtorno afetivo bipolar (51.314), transtornos mentais causados pelo uso de drogas e outras substâncias psicoativas (21.498), além de reações ao estresse grave e transtornos de adaptação (20.873). Em 10 anos, os afastamentos por ansiedade dispararam mais de 400%, enquanto aquelas pessoas que deixaram o trabalho temporariamente por episódios depressivos são quase duas vezes mais que em 2014.

Psicóloga , psicanalista, doutora e mestra em estudos psicanalíticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Elisa de Santa Cecília Massa destaca que não é possível analisar o impacto do trabalho na saúde mental sem pensar em diversos recortes sociais, como raça, renda e gênero. “Na psicologia, não temos uma única causa a ser privilegiada em detrimento de outras. Temos que analisar como estes trabalhadores estão inseridos no recorte racial, na renda das famílias dessas pessoas. Não podemos ter uma visão reducionista, simplista, sobre um assunto tão complexo, grave e abrangente. Mas fica evidente que não apenas o ofício, mas as condições de trabalho também têm um efeito em relação ao adoecimento psíquico. O não acesso às políticas de cuidado também podem ter um efeito nefasto”, pondera.

Uma das primeiras Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a chamada NR-1, é vista como uma esperança para amenizar os impactos do mercado de trabalho na saúde física e mental da população brasileira. A norma, que estabelece as diretrizes gerais de saúde e segurança no trabalho, estava prevista para entrar em vigor, pela primeira vez, em 2021, por conta da pandemia de Covid-19, mas passou por diversos adiamentos.

Debatida pelo governo Federal, representantes de empregadores, trabalhadores e especialistas em segurança do trabalho, a nova NR-1 tem o objetivo de sistematizar e tornar mais efetiva a prevenção de acidentes e doenças ocupacionais, por meio da obrigatoriedade do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), que substitui o antigo Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA). Essa nova estrutura permite a avaliação contínua dos riscos e a implementação de medidas de controle específicas para cada ambiente laboral.

Os adiamentos da aplicação da norma ocorreram, em síntese, pela resistência de setores produtivos que apontaram dificuldades em absorver os custos de implementação no curto prazo. Diante desse cenário, o governo federal optou por prorrogar o prazo para 25 de maio de 2026, ampliando também a divulgação de manuais, cursos e sistemas digitais de apoio para garantir uma transição mais estruturada e uniforme em todo o país.

“A mãe das normas reguladoras”, diz superintendente do trabalho

Para o superintendente regional do trabalho em Minas Gerais, Carlos Calazans, a NR-1 “é sensacional por dialogar com a saúde mental e os riscos psicossociais de forma mais ampla possível”, diz. Durante entrevista concedida a O TEMPO, ele chegou a afirmar que a NR-1 é a “mãe” de todas as normas reguladoras para o trabalho e que o novo adiamento é, na verdade, uma oportunidade para sugestões e diálogos com a sociedade, empresários e com trabalhadores. “Nesse período, a ideia da Superintendência Regional do Trabalho é fazer palestras, debates e discussões para aprimorar a norma e a tornar enxuta e bem concreta para não ter subjetividade, para não ter achismo, para que as pessoas cuidem da saúde mental dos seus funcionários”, garantiu.

O especialista acredita que as empresas terão que contratar profissionais de saúde mental como integração aos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) e nas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e de Assédio (Cipas) para cuidar, de perto, de trabalhadores com algum tipo de transtorno mental.

O vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho em Minas (TRT-MG), Sebastião Oliveira, defende que a NR-1 não deve ser vista como negativa pelos empregadores. “Os estudos já chegaram à conclusão que, para o empresário, ter um trabalhador insatisfeito resulta em baixa produtividade. Ele (trabalhador) acaba boicotando inconscientemente a sua atividade. Então, para o empregador é rentável ter um trabalhador satisfeito, motivado, que ele possa sair de casa para ganhar a vida e não para encontrar doenças, a morte ou mutilações”, conclui.