Diversidade e segurança psicológica nas empresas são sinônimos de produtividade e resultados, mas também de saúde dos funcionários e menos baixas nas equipes. E o contrário pode ser destruidor. Pelo menos assim o foi para Maria, 44, que preferiu não ter o nome identificado na reportagem. Contratada para trabalhar na gestão de uma equipe de redes sociais em uma empresa de Belo Horizonte, ela chegou ao limite por uma cultura corporativa de exploração máxima e medo extremo de demissão – principalmente entre os funcionários com mais de 40 anos – e teve que se afastar das atividades por 15 dias em função de burnout, ou esgotamento.
“O meu trabalho triplicou no primeiro ano na empresa, pois eu tinha que liderar mais de 20 pessoas. Trabalhava no meu horário e fora dele. Era uma rotina pesada e cansativa”, relembra. Até que veio a exaustão: “Chegou a um ponto em que meu corpo parou. Entrei em um estado que não consigo colocar em palavras. Eu faço tratamento psiquiátrico há alguns anos, mas nunca tinha passado por um episódio semelhante. Eu só chorava e não sabia o que seria da minha vida. Era desesperador”, diz. Para ela, a idade em um mercado que exclui pessoas mais experientes foi uma pressão extra. “O medo de perder o emprego é grande e faz com que a gente, nessa idade, aceite coisas que não são mais toleráveis no ambiente de trabalho”, justifica.
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O adoecimento mental sentido por ela tem sido um desafio vivido em todo o país. Em 2024, foram concedidos 478,3 mil benefícios por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença) em função de transtornos mentais e comportamentais, segundo dados do Ministério da Previdência Social. O número foi o maior em dez anos e supera em 66% os 283,4 mil de 2023. Em Minas Gerais, os principais motivos para incapacidade temporária de trabalhar no ano passado foram transtornos ansiosos, episódios depressivos e transtornos depressivos recorrentes. Uma verdadeira epidemia que motivou uma atitude por parte do governo federal.
A Norma Regulamentadora (NR) 1 cria a obrigatoriedade das empresas de identificarem e gerenciarem os riscos psicossociais no ambiente de trabalho. Coautora no livro “Um Olhar para Saúde Mental”, a psicóloga e especialista em inclusão e bem-estar no trabalho, Jocácia Rocha, explica que o caminho para reduzir o adoecimento passa, necessariamente, por políticas de diversidade e inclusão nas empresas: “Quando a empresa valoriza a inclusão e o respeito às diferenças, promove um ambiente mais seguro psicologicamente, onde as pessoas se sentem livres para ser quem são, expressar suas ideias e buscar apoio quando necessário. A inclusão fortalece o senso de pertencimento e reduz experiências de exclusão e preconceito, fatores que impactam diretamente na saúde mental”, avalia.
Se para Maria o etarismo serviu como um peso para puxá-la para um poço emocional ainda mais fundo, para o auxiliar administrativo André de Souza, de 39 anos, o racismo é que está na base do adoecimento. Quando ele trabalhou em um escritório vinculado ao diretório de um partido político em Belo Horizonte passou por muitas humilhações. “Sou um homem negro e uso tranças. As primeiras ofensas foram com relação ao meu cabelo. Eles diziam: ‘Isso aí lava? É sujo demais’”, conta. Em uma das ocasiões, chegou a ouvir de uma liderança que seria “levado para o tronco”, em uma alusão às violências sofridas por pessoas negras escravizadas. A situação não parou até ele denunciar, vencer na Justiça do Trabalho e pedir demissão.
Mas antes disso, veio o adoecimento. “Passei a ter crises de pânico, ficava muito desmotivado, pois era humilhado. Tive sérios danos psicológicos”, conta.
O desafio está lançado: como preparar as empresas a receber pessoas mais experientes, em um país onde 78% delas se assumem etaristas, e com a previsão de que 60% dos trabalhadores terão mais de 45 anos até 2040? Os dados da Ernst & Young em parceria com a agência Maturi comprovam a urgência de ações na área.
“Essa mudança no perfil das organizações é algo difícil, mas necessário. Elas precisam lidar com as mudanças da sociedade”, avalia a artista plástica Claudia Cardoso, 50. Em 2022, depois de três décadas de atuação em uma empresa de tecnologia, ela decidiu mudar de profissão e participou do programa Novos Começos, do Boticário. A iniciativa oferece capacitação para mulheres com mais de 45 anos para impulsionar carreiras e fortalecer negócios.
Uma oportunidade não tão comum para mulheres depois de 45 anos. “Mulheres dessa faixa etária estão sendo repelidas do mundo corporativo. As que se mantêm estão, muitas vezes, se aprisionando em determinados padrões de rejuvenescimento. É uma pressão estética para que ela consiga permanecer na empresa”, diz a consultora de diversidade, Letícia Alves Lins.
Segundo o gerente de ESG e DEI, Rony Santos, do Grupo Boticário, a empresa busca fortalecer a autonomia econômica das mulheres e já contemplou mais de 2 mil pessoas. As ações de diversidade do grupo permitiu ampliar em 23% a presença de pessoas com 45 anos ou mais no grupo. Em cargos de liderança, a alta foi de 17%.
A empresa Futurotec, com unidades em Ipatinga e Timóteo, no Vale do Aço, também tem apostado em diversidade etária. “Temos uma agenda de integração. Se a gente contratar um profissional mais jovem, por exemplo, ele vai “pegar uma carona” com um profissional mais experiente na empresa para poder se adaptar. Essa estratégia reduz preconceito etário”, afirma a especialista em diversidade da empresa Elis Souza. O grupo de tecnologia tem 80 colaboradores, sendo 23 acima de 45 anos. Entre eles, o analista de sistemas Fabiano Martins da Costa, de 45. “Essa troca de saberes colabora com o desenvolvimento de todos, e dá resultados para a empresa”, diz.