SOLUÇÕES PARA O FUTURO

Quem protege nascente não passa sufoco na seca

Programa pioneiro de Pagamento por Serviços Ambientais fez da cidade referência em conservação de nascentes

 

Em 2015, o Brasil viveu uma seca histórica. Naquele ano, o Sistema Cantareira, principal fonte de abastecimento de água da Região Metropolitana de São Paulo, precisou recorrer ao volume morto, que é uma reserva subterrânea acessada só por meio de bombeamento. Mas, na microbacia do Ribeirão das Posses, em Extrema, divisa dos territórios mineiro e paulista, nenhuma propriedade passou sufoco com nascente secando. “Isso aconteceu porque aquela área estava protegida, ela foi recuperada”, justifica o gerente nacional de água da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, Samuel Barrêto. 

Ele está falando da semente plantada lá em 2007, quando Extrema colocou em prática o programa Conservador das Águas e começou a pagar produtores rurais para preservar nascentes por meio do reflorestamento. De lá para cá, a cobertura vegetal sextuplicou, passando de 5% para 30%. E o resultado dessa restauração vegetal foi sentido nas águas. “Essa era uma microbacia totalmente degradada, que foi restaurada e, ao longo de 20 anos, demonstrou recuperação do regime hidrológico”, analisa Barrêto. O Ribeirão das Posses alimenta o Rio Jaguari, que abastece o Sistema Cantareira. 

A TNC é uma ONG norte-americana criada para proteger terras e águas, fomentar cadeias produtivas livres de desmatamento e fortalecer políticas públicas voltadas para a preservação. Presente em cem países, atua no Brasil há 35 anos e, há 20, acompanha o programa Conservador das Águas, em Extrema.

“No começo, o projeto tinha uma visão de conservação dessa função de paisagem, em que se entende que é possível proteger, produzir e preservar. Tinha a premissa de recuperar a microbacia do Ribeirão das Posses pensando na lógica do planejamento de um conjunto de benefícios composto pela água e pelo solo. Porque, na medida em que você está protegendo o solo da erosão com a floresta, ao invés de a água escorrer superficialmente, isso vai permitir a recarga, vai ajudar no microclima e na questão do carbono, enfim, a biodiversidade”, explica.

Segundo Barrêto, do ponto de vista didático, é possível afirmar que o reflorestamento pode ser comparado a plantar água. “Às vezes a gente quer explicar para a sociedade, mas a questão pode parecer muito técnica. Porque as pessoas não fazem ideia de que, para a água chegar à casa delas, vem de uma área como essa, nos topos dos morros, que são áreas importantes de conservação de água”, destaca o gestor.

Cidade-modelo

Samuel Barrêto lembra que, quando o Conservador das Águas começou, a Prefeitura de Extrema tinha poucos recursos, mas hoje virou uma referência. “Eles começaram com um fusca velho e uma mula para levar os mourões para cercar as nascentes nos topos. E tinham captado um recurso de R$ 20 mil. Hoje, o município arrecada mais de R$ 6 milhões com o projeto. Então, esse é um ponto importante para aqueles que estão começando. É possível trabalhar com os recursos que têm e buscar alianças estratégicas”. 

Na avaliação de Barrêto, talvez esse modelo específico adotado por Extrema, com Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), não seja aplicável a todos os municípios, mas, sem dúvida, a visão de futuro sempre será. E é num futuro próximo que Moeda, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, está de olho. A secretária municipal de Meio Ambiente, Aline Reis, a engenheira agrônoma Paula Campos, da Emater, e vereadores da cidade foram a Extrema para buscar inspiração para desenvolver uma política municipal de reflorestamento. “Estamos maravilhadas com esse projeto e queremos replicar. Já começamos com um pequeno viveiro de mudas, e a intenção é criar uma lei para o município”, afirma.

Aline e Paula foram conhecer o modelo de Extrema para replicar em Moeda. Foto: Fred Magno/O Tempo

“Viemos conhecer de perto a experiência de Extrema, que é reconhecida pela sustentabilidade. Queremos incentivar os moradores e os produtores rurais na conservação e proteção das nascentes”, ressalta Paula. Mais de 700 municípios do Brasil já visitaram o Conservador das Águas.

Para o prefeito de Extrema, Fabrício Bergamin (PDT), a cidade se tornou um modelo a ser seguido porque, junto com o desenvolvimento econômico e o progresso, o município sempre priorizou a sustentabilidade e o meio ambiente. “O pagamento pelos serviços ambientais foi uma grande sacada. Lá atrás, a gente conseguiu levar para o produtor rural uma mensagem e um sentimento da importância de conservar. O próprio agricultor depende que o clima esteja organizado, pois, se não tem chuva, como a plantação vai progredir? Além de levar essa educação, conseguimos fazer com que a ajuda financeira fizesse parte da renda dos produtores. Então, além do gado ou da produção, eles também podem contar com a receita do serviço ambiental”, destaca o prefeito.