Para mudar a forma degradante de trabalhar a terra, avançar na regularização ambiental, proteger nascentes e, ao mesmo tempo, continuar produzindo, não basta mudar a mentalidade. É preciso também aplicar técnicas adequadas de manejo do solo. Com esse objetivo, a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), por meio do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), desenvolveu cursos que levam conhecimento e suporte técnico ao produtor rural.
“O agricultor depende de duas matérias-primas básicas, o solo e a água. Se não cuidar delas, o ganha-pão estará comprometido. Mas muitas vezes não se trata de má vontade, e sim de falta de conhecimento. O produtor precisa de orientação técnica, e é aí que entramos”, afirma o analista de sustentabilidade Guilherme Oliveira, do Sistema Faemg/Senar.
Entre as formações oferecidas estão os cursos de proteção e de recuperação de nascentes. O primeiro trabalha a conscientização e a prática de cercamento, preservação e manejo adequado do entorno do olho d’água. O segundo, realizado após análise técnica e autorização do Instituto Estadual de Florestas (IEF), permite intervenções para devolver vida a nascentes degradadas.
“As capacitações são presenciais, em turmas pequenas, de 10 a 12 pessoas, realizadas nas próprias propriedades. Os alunos aprendem na prática a medir Áreas de Preservação Permanente (APPs), aplicar técnicas de manejo do solo, construir terraços, barraginhas e até sistemas de tratamento de esgoto rural”, explica o engenheiro agrônomo.
Isaac Malta Junior, de 62 anos, é mobilizador dos cursos do Senar/Faemg no Sindicato dos Produtores Rurais de Manhumirim, na Zona da Mata mineira. Desde de 2019, já organizou cerca de 20 turmas de capacitação voltadas à proteção e recuperação de nascentes.
Ele conta que, embora a água não tenha acabado, muitos produtores procuravam o sindicato preocupados com o enfraquecimento das nascentes. Foi então que decidiram se antecipar ao problema, investindo em preservação.
Na própria propriedade, onde cultiva cem pés de café, Isaac cercou a nascente que brota debaixo de uma pedra e, ao redor, plantou árvores para protegê-la. “Hoje os produtores da região estão bem mais conscientes, graças aos cursos de capacitação. O produtor precisa de conhecimento, porque a vontade de melhorar ele já tem”, destaca.
Para ele, ser agricultor é mais do que produzir alimento. “Nós conservamos nossa propriedade e ajudamos a preservar a água, que garante nossa sobrevivência aqui, no campo, mas também chega até quem está na cidade”, diz Isaac.
Segundo dados do Senar, de 2015 a 2024, foram 2.306 nascentes recuperadas em todo o estado e mais de 27 mil pessoas capacitadas. “É um dos cursos mais demandados pelos sindicatos rurais. A procura vem do próprio produtor, que já percebe que a água está diminuindo e quer se antecipar ao problema”, afirma Oliveira.
Minas conta hoje com 401 sindicatos de produtores rurais ligados ao Sistema Faemg. São eles que mobilizam os interessados, formam as turmas e solicitam a presença de instrutores credenciados. Só o Senar mantém cerca de 570 instrutores ativos e uma rede de mais de 2.000 técnicos credenciados em todo o estado.
O trabalho ambiental também fortaleceu a organização social em Córrego do Outro, na área rural de Manhumirim, na Zona da Mata Mineira. Há dois anos, os moradores da comunidade criaram uma associação que reúne cerca de 35 famílias, quase todas da agricultura familiar. O café é o carro-chefe da produção, mas a pauta ambiental ganhou espaço entre as prioridades.
Além da proteção de nascentes, os agricultores têm construído caixas de contenção em estradas de lavoura para reduzir erosão e assoreamento dos rios. A associação planeja ainda propor parcerias com o poder público para expandir essas práticas a todas as propriedades da comunidade. “É um processo de formiguinha. A conscientização ainda é pequena, mas já existe mudança. E isso é o que nos dá coragem para continuar”, afirma o morador Elio Rodrigues, que se transformou em um multiplicador de boas práticas ambientais.