A conjuntura mundial tem favorecido os políticos brutos em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. O psicólogo americano Dan MacAdams, especializado em personalidades e professor da Universidade de North Western, fez um estudo sobre o fenômeno, representado com honras por seu próprio presidente, Donald Trump, em uma eleição que surpreendeu o mundo, no ano passado. McAdams estudou a evolução humana para concluir que, em tempos de incertezas, líderes com tendência dominadora são preferidos em relação a candidatos que são apenas respeitados e admirados. E ele usou uma analogia, no mínimo, curiosa ao comparar o comportamento dos políticos com uma colônia de chimpanzés.
Ele explicou à reportagem que os indivíduos brutos têm um apelo profundo e primordial pela maneira eficaz com que canalizam a psicologia de dominância. Trata-se de uma forma de pensar e sentir a liderança em grupos que remonta a milhões de anos na evolução humana e na dos primatas. “Tanto na natureza quanto em cativeiro, o chimpanzé atinge sua posição de poder por meio da agressão, da intimidação e da ameaça. Ele deve ser dotado de temperamentos que impulsionam o domínio social”, diz.
O pesquisador esclarece que o grupo dos chimpanzés, assim como muitos outros no reino animal, costuma dar o poder aos machos com maior tamanho, e que oferecem maior intimidação e ameaça, seja por gestos ou exibições vocais poderosas. “Na liderança pelo domínio, o líder depende exclusivamente da força bruta, da intimidação e do blefe”, destaca.
McAdams afirma que essas intimidações táticas fazem parte da chamada “exibição de comando”. “Ela acontece quando o líder enlouquece, gritando, zombando e gesticulando de maneira descontrolada enquanto ataca os machos que estão por perto. Nesse momento, as fêmeas e os filhotes buscam abrigo para se esconderem”, diz MacAdams.
Com os políticos, isso pode ser traduzido em discursos inflamados, frases de efeito e postura ameaçadora diante de adversários, daqueles de quem discordam ou simplesmente sobre pontos de vista polêmicos.
Assim é Trump nos Estados Unidos e são os líderes da extrema direita em alta mundo afora. No Brasil, a popularidade do deputado Jair Bolsonaro – e esse é apenas um dos exemplos – encaixa-se nesse perfil. Na última quinta-feira, ele inclusive disse que dará carta-branca para policiais matarem se for eleito presidente.
Outra característica desses seres são as alianças de curto prazo. “Os chimpanzés dominantes não definem acordos com base em conhecimento ou estratégia. Em vez disso, prendem-se a acordos instáveis, incluindo aqueles com grupos rivais, que eles logo abandonam quando deixam de ser vantajosos no momento seguinte”, explica.
Na governança, McAdams exemplifica esse fator com alianças entre políticos adversários para alcançar benefícios mútuos, que logo se rompem quando o objetivo é conquistado. “Muitas vezes, são favores econômicos ou governamentais, que se extinguem com a mesma rapidez que surgiram e nem chegam ao conhecimento público”, declara.
Busca por um salvador explica popularidade
O pesquisador americano Dan McAdams ressalta que, conforme se tornam mais inteligentes, os chimpanzés vão seguindo o mesmo padrão de organização que os seres humanos desenvolvem. É nesse momento que se chega à liderança de prestígio. De acordo com o psicólogo, ela apareceu há cerca de 5 milhões de anos, quando a ideia de cultura surgiu nas sociedades humanas.
Esses líderes por prestígio alcançam a autoridade no grupo por demonstrar em bom desempenho em atividades valorizadas. No lugar da agressão física e do grito, eles são escolhidos por conseguirem fazer coisas igualmente importantes para a sobrevivência na comunidade. Ele cita como exemplos os primeiros como homens que caçavam e produziam armas. Em seguida, evolui-se para habilidades como negociar e fazer as pazes com outras tribos.
MacAdams expõe que, nesse caso, a dominação não deixa de existir, apenas é mais bem trabalhada, isto é, quando se julga necessária a demonstração da força. “Os líderes políticos brutos costumam apresentar tanto liderança por dominância quanto por prestígio. Eles sabem a importância de trabalhar com os dois estilos”, garante.
O argumento de McAdams é reforçado pelo antropólogo Eduardo Fontes, mestre em antropologia social pela Universidade de Brasília (UNB).“Vale lembrar, também, que o ambiente social molda os processos e preferências cognitivas das pessoas, influenciando, assim, suas decisões de buscar e eleger o mais dominante líder como meios para recuperar o seu senso de controle pessoal”, aponta.
Já a cientista política Bárbara Ferreira, mestre em ciência política, destaca como essa tese se aplica no ambiente político e econômico atual. “As pessoas se veem incapazes de agir por conta própria e passam a buscar um ‘salvador’. O presidente americano se impôs e conseguiu. Por aqui, temos candidatos com o mesmo perfil, atraindo muita gente com discursos enfáticos, comportamento ameaçador. A princípio, não importa se esses políticos têm ou não conhecimento, basta a postura que apresentam”, defende.
FOTO: arquivo pessoal |
O pesquisador americano Dan McAdams afirma que os políticos brutos costumam ser escolhidos pelas pessoas em períodos de crise |