Autoprazer

Empresa estimula masturbação durante expediente para aumentar a produtividade

Não há evidência científica de que estratégia funcione


Publicado em 11 de junho de 2021 | 03:00
 
 
 
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Uma mão lava a outra. É o que diz o dito popular que remete à ideia de cooperação, de trabalho em equipe e de solidariedade. Valores que Erika Lust, 44, busca estimular entre os 36 funcionários da produtora espanhola de filmes adultos independentes que ela lidera. Percebendo que, em reação à pandemia da Covid-19, sua equipe estava agitada e “atuando com menos energia”, a empresária decidiu inovar: em maio, os trabalhadores passaram a gozar de um intervalo de 30 minutos, durante os quais poderiam se masturbar. Para ela, ao contribuir para o alívio do estresse, a ação poderia, em tese, reverberar no aumento da produtividade. 

A insólita medida virou notícia e repercutiu nas redes sociais. “Imagine isto: uma equipe de funcionários felizes com suas capacidades criativas, fluindo e sendo produtivos porque eles tiveram algum tempo programado para se sentirem bem. Uma pausa para masturbação no trabalho pode resultar em mais, menos agressividade, mais produtividade e melhor trabalho em equipe”, disse Erika ao jornal britânico “The Sun”. 

Mas será mesmo que a masturbação pode ser um fator para a melhora do desempenho profissional? Além disso, a decisão não denunciaria uma visão excessivamente utilitária do prazer sexual? Foram esses questionamentos que deixaram a sexóloga Lelah Monteiro inquieta diante da notícia. “Vejo (a decisão) como bastante polêmica. Primeiro, porque o autoprazer é importante para que a pessoa conheça o próprio corpo e o autoerotismo é importante na dinâmica de um relacionamento”, diz, demonstrando um quê de estranhamento pelo fato de a prática ser instrumentalizada para o aumento da produtividade. 

Além disso, Lelah afirma desconhecer estudos que comprovem que exista, de fato, uma evidência da correlação entre masturbação e aumento da disposição laboral. Ela contextualiza que, no caso em questão, estamos falando de uma empresa que cria conteúdo erótico. “Então, dentro do universo desse nicho de mercado, talvez o expediente funcione. Por outro lado, em termos de fisiologia, sabemos que, após a masturbação, quando há o orgasmo e o gozo, o que ocorre é um relaxamento muito profundo”, avalia, ao indicar ser improvável que essa condição física possa, em um primeiro momento, repercutir em mais eficiência.

Quem não estranhou a estratégia da empresa espanhola foi o corretor de investimentos André*, 33. “Eu trabalho sozinho em um pequeno apartamento na Savassi (na região Centro Sul de Belo Horizonte). Realizo todas as minhas tarefas online e estou solteiro. Eventualmente, eu simplesmente acordo pensando em sexo e com muito desejo (erótico)”, relata. “O problema é que, nesses dias, me sinto mais desconcentrado e perco o foco com mais facilidade. Noto que essa carga sexual acumulada acaba me atrapalhando. Só quando me masturbo, consigo retomar a atenção e seguir com minha rotina”, diz. “Pelo menos para mim, ter esse momento é importante. É algo que me ajuda a voltar a colocar a mão na massa pra valer”, garante o investidor. 

Abstinência, orgasmo e desempenho

Na contramão do que defende Erika Lust, a sexóloga Lelah Monteiro lembra ser comum que atletas, sobretudo homens, sejam desestimulados a se masturbarem antes de competições esportivas. Isso porque alguns treinadores acreditam que a prática seria prejudicial para o desempenho. Ela também cita que alguns líderes religiosos pedem que as pessoas evitem práticas que levem ao orgasmo antes de participarem de certos ritos – “porque creem que há uma grande descarga energética (no ato sexual) e que a pessoa precisa estar com muita energia para aquela iniciação”, assinala. 

Contudo, não há consenso sobre os impactos negativos das atividades sexuais para a performance esportiva. Foi o que constatou uma revisão científica, de 2016, que analisou mais de 500 publicações sobre o tema. Segundo o levantamento, ao contrário do que se acreditava, o orgasmo pode influenciar positivamente os resultados alcançados em provas físicas. Mas, até onde se sabe, a regra só vale no caso de a transa ou masturbação ter acontecido na noite anterior ao evento atlético – e não em um intervalo entre uma prova e outra. O estudo também indicou que a manutenção da rotina sexual favorece a disciplina.

*Nome fictício, a pedido do entrevistado

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