A confecção de uniformes para três escolas particulares é o carro-chefe do ateliê que Tainá Roberta, 20, compartilha com a mãe, Lenilda Gularte, 47, no aglomerado da Serra, em Belo Horizonte. A loja fica na entrada do beco União, lugar aonde carro não chega, mas é referência há gerações quando assunto é costura. 

“Além dos uniformes, a gente trabalha com consertos de roupas, e também faço algumas peças como pano de prato e bate-mão. A gente é quem faz tudo, confecciona do zero”, conta a jovem. A costura tece a história da família há décadas.

Tainá aprendeu o ofício ainda na infância com a avó paterna, dona Maria da Penha Ribeiro, de 82 anos – 60 deles dedicados a alinhavar e coser roupas dos mais diferentes formatos na maior favela de Minas.

“Comecei fazendo roupa de igreja. A primeira costura que fiz foi um blazer e uma calça social. Aí chegava gente para fazer aquelas roupas difíceis. Eu ia lá no caderno, tirava as medidas que eu dava conta de tirar e fazia. E assim foi, por muitos e muitos anos”, conta a idosa. Ela se orgulha de ter criado os seis filhos e ajudado o marido, que era servente de pedreiro, a sair do aluguel e comprar uma casa, com dinheiro da costura.

Dona Maria da Penha começou a costurar por necessidade. Aprendeu sozinha. “A gente era muito pobre. Comecei a costurar roupa para os meus meninos vestirem. Aí comecei a costurar para os outros pra poder ajudar em casa e comprar as coisas pra eles”, relembra. 

Ganhou escala

A profissão deslanchou quando a costureira começou a fazer uniformes escolares. Já chegou a fazer roupas para 20 escolas e creches da região, sozinha. “Eu trabalhava até meia-noite. Fui parar várias vezes no hospital por esgotamento”, recorda a idosa. Ela ainda preserva todo o maquinário em casa, mas hoje a costura é só para ocupar a cabeça, pois já não recebe mais encomendas.

“A costura significa tudo para nossa família. Começou com a minha avó, ela passou para filhos e netos. Tenho muito orgulho dessa guerreira. Todo mundo queria as roupas delas. Vou dar sequência nessa história”, afirma a jovem Tainá.

Quando Lenilda, mãe de Tainá, perdeu o emprego, dona Maria da Penha também ensinou a nora a costurar. “Ela me chamou para fechar uns uniformes, mas eu nunca tinha mexido. Fazia errado e tinha que desmanchar, mas foi assim que aprendi”, conta.

Em 2017, Lenilda comprou máquinas novas, abriu um ateliê e levou a filha para trabalhar com ela. No período da pandemia, a costura passou a ser o ganha-pão da família toda. Até o pai de Tainá, que é motorista de aplicativo, passou a fazer parte da equipe.
 
“Daqui, dessas máquinas, sai a maior parte da nossa renda hoje”, comenta a jovem costureira. Em meses mais movimentados, segundo ela, dá para faturar até R$ 6.000. 

Filho herda o dom da mãe para confecção 

Dona Maria da Penha se aposentou, mas deixou seu legado. Ensinou o ofício para todos os filhos, quatro homens e duas mulheres. “Na hora que eu mais precisei, foi de onde consegui tirar renda para me manter, pagar as contas e estar mais perto dela”, relata o filho Romildo Ribeiro, 59. Ele largou a carreira de professor e voltou a morar na casa da mãe para se dedicar à costura. 

“Acho que está na genética a facilidade de costurar, prestar serviços à comunidade, que sempre nos procura com satisfação pelos trabalhos realizados”, acredita o costureiro. Ele também faz uniformes escolares, reparos em roupas e artesanato. “Quando cai a procura por reformas e consertos, confecciono fantoches de espuma, tapetes de retalhos, puxa-saco e porta-papel higiênico. Quando chega o mês de junho, também faço roupas de festas juninas, e assim vai”, comenta.

A renda, segundo Romildo, varia bastante. Os três primeiros meses do ano são os melhores. “No início dá pra ganhar um pouco mais por causa dos uniformes, é em média R$ 3.000 por mês. Deixo (o dinheiro) depositado para pagar as contas durante o ano. Depois, cai bastante, mas dá pra sobreviver”, explica ele.