Capacitação gratuita

Participação feminina no setor de tecnologia cresce 60%

Iniciativas como o projeto Reprograma, oferecem cursos de programação para mulheres em vulnerabilidade

Por Cristiana Andrade
Publicado em 07 de março de 2024 | 08:00
 
 
 
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A participação feminina no mercado de tecnologia aumentou 60% no Brasil, entre 2015 e 2022, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Mesmo assim, ele ainda é composto majoritariamente por homens. Eles são 83,3%, enquanto as mulheres ocupam apenas 12,3% das vagas. No mês internacional das mulheres, é interessante mostrar que, para mudar esse cenário, iniciativas Brasil afora vêm crescendo em terreno fértil e ajudando a construir um time potente para atuar cada vez mais nesse segmento do mercado de trabalho.

Quando consideradas carreiras de programação, como full stack, infraestrutura e back-end, a desigualdade é ainda maior: são dez homens a cada uma mulher, conforme indica uma pesquisa feita pela Revelo, uma das grandes empresas de tecnologia no setor de recursos humanos na América Latina.

A Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom) estima que a demanda atual no país seja três vezes maior do que o total de formados. Em média, 53 mil pessoas se formam na área por ano, mas seriam necessárias 159 mil para atender o mercado. 

De olho nessas oportunidades e com o intuito de reduzir a desigualdade de gênero e raça na tecnologia, alguns projetos no país têm crescido, principalmente os que se voltam para mulheres – em especial as negras, periféricas e LGBTQIAPN+. Exemplo disso é a Reprograma, iniciativa criada em 2016 e que oferta cursos de programação gratuitos para mulheres e adolescentes em situações de vulnerabilidade social, econômica e de gênero, priorizando as negras, trans e travestis. 

“Foi a partir da demanda do mercado que me conectei à Mariel Reyes Milk e à Fernanda Faria, e, depois de muitas trocas de ideias, criamos a Reprograma, pois nosso objetivo era promover a inclusão de mulheres na tecnologia por meio de um projeto de impacto social”, diz a cofundadora e diretora de inovação da Reprograma, Carla de Bona. 

O projeto inicial ofertou um curso de front-end, de seis semanas presenciais, em São Paulo, incluindo o transporte e a alimentação para as alunas. A coisa deu tão certo que o curso evoluiu e hoje é feito em 18 semanas. 

Os próximos passos se deram de forma natural: foram realizadas parcerias com empresas de tecnologia, como Accenture, Facebook, Mercado Livre, B3, Amazon, Prefeitura de São Paulo, Senai, entre várias outras, para ampliar a oferta dos cursos e workshops online. 

Até que veio a pandemia, e a Reprograma lançou todos os seus cursos na modalidade a distância. “Para nossa sorte, antes da pandemia, tínhamos testado o modelo online para criar um ambiente de comunidade. Então não foi difícil girar a chave”, conta Carla. 

Desde sua fundação, a Reprograma contou com mais de 23 mil inscrições em 54 cursos de programação; sensibilizou mais de 4.000 mulheres por meio de suas oficinas de seleção e teve 2.000 mulheres como alunas. Agora, tem a meta de entregar mais 440 diplomas. 

Guinada

Uma das beneficiárias da Reprograma, Liana Alice, mulher trans e ex-aluna, é a atual coordenadora de ensino do projeto. Formada em marketing, nunca teve uma oportunidade na área e chegou a trabalhar como recreacionista infantil e babá, de maneira informal. Até que, em 2019, se inscreveu para participar do Reprograma. Após finalizar o curso, voltou ao projeto como monitora voluntária, apoiando outras meninas interessadas.

Formação para mudar o entorno

Além dos cursos em tecnologia, a Reprograma tem plataforma de recrutamento. O projeto que capacita mulheres oferece mentorias para as alunas e organiza eventos de networking com representantes de empresas, recrutadores e outros profissionais da área. “Como nossas alunas são pessoas vulneráveis, estamos sempre acompanhando o que o mercado está demandando, avaliando as taxas de empregabilidade e revendo nossas metas, afinal, o cenário de tecnologia muda o tempo todo”, avalia a cofundadora e diretora de inovação da Reprograma, Carla de Bona. 

Para 2024, um dos focos é atuar no Norte e Nordeste brasileiro, regiões consideradas importantes para desenvolver oportunidades para mulheres trans, travestis, negras e pardas. Novos cursos para adolescentes estão previstos, além da criação de método mais eficaz de parceria com empresas que possam empregar as recém-formadas.

“As mulheres que se formam em um dos nossos cursos acabam mudando o entorno de onde vivem, e isso é de grande relevância: mudar realidades. Ainda não conseguimos medir o impacto do que fazemos na ponta, mas já temos ex-alunas que estão criando seus projetos em suas comunidades e outras se tornando educadoras, via o programa Educa. Precisamos entender que haverá muitas barreiras para essas mulheres, mas temos o cuidado de ajudá-las a construir novas possibilidades e oportunidades de mudar de vida, por meio de uma nova formação e da conexão que fazemos com empresas parceiras que podem oferecer uma colocação no mercado. Esse é um ciclo de ESG que gera impacto social, econômico e pessoal muito positivo”, acrescenta Carla de Bona.

A capacitação da Reprograma tirou Liana Alice da informalidade. “A maioria dos meus trabalhos foram informais até eu migrar de carreira. Comecei trabalhando numa imobiliária, usando a identidade masculina. Nessa época, eu já queria começar a transição de gênero. Quando mudei de empresa, meu chefe direto disse que estava tudo bem eu ser do jeito que era. Trabalhei uma semana e me mandaram embora”, lembra.

Logo depois do curso na Reprograma, ela conseguiu o primeiro trabalho na área de tecnologia, como desenvolvedora. “Tive duas oportunidades em empresas pequenas de tecnologia, mas ganhava bem. Em 2022, participei de uma seleção para ser coordenadora fixa na Reprograma, na área de gestão e educação. Estar nessa posição era algo que eu não imaginava”, afirma.

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