A prefeitura de Belo Horizonte autorizou a retomada parcial das aulas presenciais para alunos entre 6 e 8 anos. A medida é válida para escolas públicas e particulares, conforme comunicado divulgado ontem pelo Comitê de Enfrentamento à Covid. O Executivo, no entanto, omitiu a data exata dessa reabertura das instituições de ensino e disse que a informação será divulgada somente na próxima semana. A reportagem de O TEMPO apurou que o retorno das aulas deve ocorrer ainda neste mês.
A reabertura das escolas será no formato de bolhas, conforme já anunciado anteriormente pela prefeitura. Cada bolha é formada por um grupo de seis alunos que terão aulas presenciais duas vezes por semana durante três horas. O objetivo é promover um revezamento entre os grupos, de forma a promover o ensino presencial a todos os alunos.
O anúncio pegou de surpresa as equipes que atuam no segmento, tanto da rede privada, da rede pública e até mesmo os técnicos da Secretaria Municipal de Educação, que não esperavam que a prefeitura fizesse o comunicado agora. Conforme reportagem publicada ontem em O TEMPO, uma nota técnica formulada pelo Executivo calculava que as atividades presenciais para estudantes de 6 a 12 anos seriam retomadas somente em agosto.
Apesar de não ter cravado nenhuma data oficialmente, a prefeitura informou, por meio de nota, que o planejamento será divulgado na próxima semana. A administração municipal acompanha com atenção o avanço da Covid na capital durante o feriado prolongado de Corpus Christi. Os números de casos irão ajudar a definir o calendário de retorno das aulas presenciais. Em uma hipótese otimista, as atividades voltariam daqui a duas semanas. Essa versão, no entanto, é pouco provável, já que ainda serão realizadas reuniões com vários setores para essa definição, entre eles o Comitê de Enfrentamento à Covid, representantes dos professores, sindicato das escolas particulares, rede estadual de ensino e também com o Ministério Público.
O início da vacinação dos docentes e demais trabalhadores da educação, ocorrido nesta semana, foi um dos motivos que tornaram essa retomada viável. Conforme dados do boletim epidemiológico, 31.339 trabalhadores da educação foram imunizados até dia 2 de junho. Ontem foram vacinados professores do ensino básico, mas a prefeitura não informou quantas pessoas receberam as injeções.
O efeito protetivo da vacina anti-Covid também vai ajudar a decidir qual o melhor momento de reabrir as escolas. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a primeira dose da AstraZeneca já alcança eficácia de 76%. Vale lembrar, no entanto, que a imunização com a segunda dose é fundamental para completar a proteção.
Impacto educacional preocupa prefeitura
Sobre risco de infecção nas escolas, o infectologista Unaí Tupinambás avaliou que essa ameaça seja mínima, já que os grupos de alunos são pequenos. “Vamos ampliando à medida que a vacinação e o efeito do imunizante vão avançando. O risco é reduzido e traz benefícios”, disse o integrante do comitê municipal de enfrentamento à Covid.
O impacto negativo de mais de um ano com escolas fechadas também tem preocupado os infectologistas, especialmente nessa faixa etária com estudantes em fase de alfabetização. “A perda escolar nessa faixa etária é muito grande. Nossa ideia é reduzir danos”, explicou.
A saúde mental, socialização e desempenho motor das crianças são outros fatores lembrados pela epidemiologista Aline Dayrell. “Do ponto de vista epidemiológico, se pudesse dizer ‘fica em casa’ seria o ideal, mas isso traz outros danos”, informou a coordenadora da disciplina de epidemiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela afirma que a reabertura do comércio acaba aumentando os riscos de infecção em crianças, já que os pais cumprem menos o isolamento social com essa flexibilização. Nesse cenário, segundo ela, a escola se apresenta como um lugar com grau menor de insegurança. “Desde que sigam protocolos, as atividades precisam retornar. As crianças apresentam menor risco de infecção e transmissão, e agora veio a vacinação dos professores. Então é uma tentativa”, disse.
A doutora em educação Vitória Régia Izaú discorda. Para ela, as aulas presenciais só deveriam ser normalizadas após a vacinação de toda a comunidade escolar. “(O retorno) é uma decisão surpreendente. Cria-se um clima de medo muito grande. Os professores precisam ser ouvidos, e isso não está acontecendo”, protestou. Apesar de reconhecer as complicações do ensino remoto, ela avaliou que a modalidade é a que melhor resguarda a vida das pessoas. “A substituição desse modelo deve ocorrer quando há segurança alimentar, sanitária, calendário (de vacinação) e testagem”, opinou.
Professores dizem que não foram comunicados
Membro do Comando de greve sanitária do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de BH (Sind-Rede BH), a professora Adriana Souza informa que muitas famílias não estão se sentindo seguras em enviar seus filhos para a sala de aula. Esse temor, segundo ela, já foi sentido no ensino básico, cujas aulas foram retomadas no fim de abril. A docente informa que inexiste diálogo com a prefeitura sobre o tema. “Temos comissões instituídas nas escolas para fazer o debate do retorno presencial desde o ano passado e elas não são levadas em consideração nesse debate”, questionou.
Falta de conversas também é a alegação do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG). Conforme a presidente Zuleica Reis, a entidade não foi comunicada sobre a decisão e não sabe quais critérios foram utilizados para a reabertura das escolas. “Estamos prontos, mas sequer fomos comunicados sobre essa determinação”, criticou. A representante informou que a categoria demanda o retorno integral do ensino fundamental, e não somente de algumas séries. "As escolas particulares não estão dispostas mais a esperar", finalizou.