Nas avenidas, milhões de carros e ônibus que provocam longos engarrafamentos. No céu, a emissão constante de gases que poluem e destroem o meio ambiente. Cenas que antes eram típicas em qualquer metrópole do mundo, a pandemia do coronavírus e a necessidade do isolamento social fizeram o ritmo de vida e os danos causados pela atividade humana mudarem drasticamente. E com a desaceleração da rotina, a natureza só tem a agradecer.
Em Belo Horizonte, levantamento realizado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) mostrou que, ao esvaziar ruas e indústrias, o coronavírus reduziu pela metade a emissão de gases poluentes na atmosfera. Através das duas estações de monitoramento na capital, localizadas na PUC São Gabriel, região Nordeste da capital, e avenida do Contorno, no Centro, foram analisadas a qualidade do ar nos horários de pico, entre 6h e 8h e das 17h às 19h.
De acordo com os dados, as chamadas partículas respiráveis, que são substâncias tóxicas liberadas dos veículos ou de atividades industriais, registraram uma queda de 47% na concentração máxima emitida no ar. Já em relação ao dióxido de nitrogênio, a queda chegou a 40%. Para fazer os cálculos, os técnicos da pasta compararam o período entre 1º e 19 de março, antes da paralisação, aos dias entre 20 e 24 de março.
O principal motivo da queda, conforme a secretaria, foi a menor emissão de gases dos ônibus, carros, caminhões e motos. "Foi possível verificar diferenças nos valores médios de concentração horária de alguns poluentes atmosféricos em estações presentes no município de Belo Horizonte, a partir da comparação entre o período anterior e posterior à paralisação de atividades em função de Decreto Municipal", conclui em nota.
'Impacto notável'
Para o geógrafo e professor Alessandro Borsagli, a menor circulação dos veículos traz um impacto "notável" na qualidade do ar. "Ao mesmo tempo, apesar das atividades industriais serem fiscalizadas quanto à exigência de filtros, por exemplo, a queda das atividades também acarreta na melhora. No meio urbano, são milhões de carros emitindo gases", complementa.
O especialista lembra da greve dos caminhoneiros, que também paralisou praticamente todas as atividades do país no fim de maio de 2018. "Estávamos em um período de estiagem e, durante a semana mais intensa do movimento, houve uma melhora visível no meio ambiente. Fui para a PUC fazer uma análise e, ao visualizar a Serra do Curral, a diferença era nítida em toda a capital e na Cidade Industrial [em Contagem]", enfatiza.
Alessandro Borsagli afirma que a pandemia mostra muito à humanidade como é a sua relação conturbada com os recursos naturais. "Temos que aprender que o planeta não nos pertence, que habitamos ele. Há a arrogância da sociedade de achar que controlamos os fenômenos naturais e provocamos um consumo excessivo, que já acarreta em problemas ambientais. Precisamos deixar esses valores de acumulação para pensar em uma questão coletiva sobre esse momento, de como a falta de contato social não é preenchida pelo material. A Terra mostra que se recupera, as espécies voltam a ocupar seu espaço", pontua.
Melhoria dos rios e córregos
Esquecidos abaixo do concreto e do asfalto, os rios e córregos que atravessam Belo Horizonte também deixam de agonizar em meio à poluição crescente. No ribeirão Arrudas, que nasce na Serra do Rola Moça, na região do Barreiro, e vai até o rio das Velhas, em Sabará, na região metropolitana, a melhoria das águas é visível. Mais límpidas, elas começam retomar o vigor de outrora – pelo menos até o fim da pandemia.
O coordenador do projeto Manuelzão, Marcus Vinícius Polignano, acrescenta que o principal problema do Arrudas é o lançamento irregular de esgoto. "Com o comércio e a indústria parados, percebe-se que tirando essas fontes poluidoras há um efeito aparente em relação à qualidade da água. Muitos esgotos de atividades comerciais, principalmente na região Central, não são interceptados pela Copasa e caem direto na rede pluvial, sem tratamento", explica.
De acordo com o ambientalista, devido às ligações irregulares, a Copasa trata, na prática, cerca de 70% de todo o rejeito gerado em Belo Horizonte. "É um volume razoável que ainda precisa ser interceptado", resume. Já a estatal informou, por nota, que as análises da Estação de Tratamento de Esgoto do ribeirão Arrudas apontam que não houve uma alteração significativa na qualidade dos efluentes do curso d'água.
"A Companhia esclarece, ainda, que a vazão média afluente da ETE Arrudas, se mantém nos mesmos patamares dos últimos três meses, bem como a quantidade de resíduos sólidos que chegam na unidade. As variações desses patamares estão dentro da normalidade, não podendo ser associada à suspensão dos alvarás de localização e funcionamento das atividades comerciais", conclui.