Imagine que você está dirigindo na terceira pista de um viaduto, e, de repente, uma seta indica que ela vai acabar e você tem que conseguir mudar para a outra faixa. Ai você se pergunta: por que o viaduto não segue com todas as faixas do início ao fim? Em várias situações, o motorista encontra problemas parecidos que dificultam o trânsito em Belo Horizonte ou podem provocar acidentes. São verdadeiras pegadinhas construídas com dinheiro público.
O especialista e professor de trânsito Luiz Roberto Silva vem pesquisando as obras de mobilidade da capital desde 1967 e encontrou diversos erros de projeto e execução, alguns mais antigos e outros recentes, de intervenções inauguradas em 2008, dentro do pacote da Linha Verde. São viadutos, trincheiras, curvas e elevações, que poderiam ter sido melhor aproveitados, sem causar prejuízos ao tráfego. Muitas vezes, o motorista leigo só consegue perceber a consequência das obras erradas: congestionamentos e acidentes. Mas, se você olhar bem, vai ver onde surge o problema.
A reportagem de O TEMPO percorreu as avenidas Antônio Carlos e Cristiano Machado com o especialista e encontrou, pelo menos, dez erros que estão listados nesta matéria . Silva conta que a avenida Antônio Carlos, por exemplo, construída na década de 40, tem várias curvas desnecessárias. “São erros históricos. A Antônio Carlos tinha condições de ter 120 metros de largura, o equivalente a duas Afonso Pena e uma Augusto de Lima – seria uma das maiores do Brasil. Estava tudo desapropriado. Não foi feito porque, em Belo Horizonte, não se planeja o futuro, então, os imóveis ocuparam as margens. Ela segue um traçado reto até o viaduto São Francisco e, depois, fica sinuosa”, destacou. Segundo Silva, sem as curvas, o trajeto de Venda Nova ao centro seria reduzido em cerca de 2 km. Mas o especialista explica que o projeto acompanhou o leito do córrego. “Vira pra esquerda, depois para a direita, sem necessidade”, disse.
Os erros não se restringem aos viadutos e trincheiras – ou, muitas vezes, pela falta deles –, mas atinge também o metrô. De acordo com Silva, a estação Vilarinho, a última da única linha em operação na capital, foi construída à esquerda da avenida Cristiano Machado, impossibilitando que o metrô continuasse, no futuro, para o bairro Serra Verde, sentido Cidade Administrativa.
Para o engenheiro civil José Aparecido Ribeiro, especialista em transportes, os projetos executivos da capital são mal-elaborados e sem planejamento a longo prazo. “Se as obras seguissem projetos benfeitos, sairia mais barato, mais rápido e mais eficaz. Belo Horizonte tem 150 gargalos que travam o trânsito e não se resolve com puxadinhos. Engenheiros e população devem participar da decisão de uma obra para evitar desperdícios”.
Resposta. A Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas (Setop) – responsável pelas obras da Linha Verde em Belo Horizonte – e a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) informaram que apenas executaram os projetos elaborados pela Empresa de Transportes de Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans). A autarquia, por sua vez, negou que seja autora dos projetos e disse que a responsabilidade pelos planejamentos é da Setop e da Sudecap.
'Impossível' acessar viaduto
Para quem vem da praça da Estação, na avenida Antônio Carlos, ficou quase impossível pegar o viaduto para acessar a avenida Pedro II, porque o motorista tem que transpor três faixas à direita, passando pelos carros que vêm da Via Expressa, em um espaço de aproximadamente 150 metros. De acordo com o especialista, a estrutura tinha que ter sido construída um pouco mais à frente.
Voltas em estrutura 'invertida'
A estrutura sobre a avenida Antônio Carlos fica numa posição invertida, em relação ao padrão. Quem vem no sentido centro tem que dar a volta pela praça São Cristóvão e acessar o viaduto como se estivesse voltando na contramão da via. Para quem vem no sentido Pampulha e quer fazer o retorno, tem que acessar a marginal bem antes e dar uma grande volta também.
De repente, a pista acaba
Ainda na Antônio Carlos, o viaduto que dá acesso à avenida Abrahão Caram começa com três faixas e termina com duas. O motorista que está na pista que acaba precisa entrar na frente do outro ou parar, o que gera lentidão.
Uma curva no lugar da reta
Na barragem da Pampulha, no encontro das avenidas Antônio Carlos e Pedro I, quem segue no sentido centro passa por uma curva acentuada, em ‘V’, sendo que poderia haver uma reta no lugar, sem risco de acidentes.
Fácil de errar
Na avenida Cristiano Machado, a trincheira que dá acesso à avenida Vilarinho é no meio da via. Quem não estiver atento, ou não conhece o local, pega a trincheira e vai parar em Venda Nova. O certo seria a intervenção estar na lateral da avenida.
Semáforo para viaduto passar
O viaduto Hélio Pellegrino, próximo ao Anel Rodoviário, desemboca na avenida Cristiano Machado na pista do meio. Foi necessário colocar um semáforo para que os motoristas que seguem pela via deem passagem aos carros que descem o viaduto, e vice-versa. O correto seria que se a estrutura tivesse fim na lateral da avenida.
Só serve para fazer o retorno
O viaduto Carlos Drummond de Andrade, na avenida Cristiano Machado, na região Nordeste da capital, serve apenas como retorno para a via, nos dois sentidos. A obra poderia ter sido melhor aproveitada, ligando os bairros Palmares, Fernão Dias e São Paulo, que são bem populosos.
Faixa só ilude
Em vários pontos da avenida Cristiano Machado, foi criada uma terceira faixa que não tem continuidade, já que, um pouco à frente, ela acaba. O motorista, que pega essa terceira pista, ‘iludido’ que vai prosseguir nela, tem que dar um jeito de voltar para a faixa ao lado e contar com a gentileza dos demais condutores.
Confusão no Anel
Quem segue pelo Anel Rodoviário sentido Caeté, na região metropolitana, deveria passar em linha reta por baixo do viaduto, mas tem que virar à direita passando a ser uma via secundária. Quem vai para Sabará, na mesma região, deveria passar por cima do viaduto, mas é obrigado a usar a opção da esquerda para depois virar à direita. Para alcançar o bairro Nazaré, tem que atravessar três faixas.
Podia ser por baixo
Na avenida Cristiano Machado, no cruzamento com a avenida Waldomiro Lobo, os semáforos e a confluência de carros poderiam ter sido evitados se tivessem aproveitado a obra do metrô e feito com que a Cristiano Machado passasse por baixo, evitando o encontro com a Waldomiro Lobo.