Transporte público

Empresas de ônibus de BH venderam 417 veículos para evitar colapso

O motivo: evitar o colapso do transporte público durante a pandemia – 14,5% da frota à época. E a situação vai piorar, já que outros 39 veículos estão sendo negociados e devem ser enviados para o Nordeste

Por Vitor Fórneas
Publicado em 18 de março de 2022 | 03:00
 
 
colapso-ônibus-BH Foto: Videopress Produtora

As empresas de ônibus de Belo Horizonte venderam 417 veículos entre abril e dezembro de 2020. O motivo: evitar o colapso do transporte público durante a pandemia – 14,5% da frota à época. E a situação vai piorar, já que outros 39 veículos estão sendo negociados e devem ser enviados para o Nordeste – em um momento em que o número de passageiros está em ascensão e cresceu 6,4% entre janeiro e fevereiro deste ano, segundo a Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans). Em média, cada veículo foi vendido por R$ 90 mil – totalizando cerca de R$ 41 milhões.

De acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH), que repassou os dados à reportagem, a redução da frota ocorreu devido às medidas de isolamento, que “afastaram” os usuários dos ônibus. “Antes da Covid-19, tínhamos 1,2 milhão de passageiros diariamente, e o número caiu para 900 mil. Tivemos que reduzir a frota quando se viu que a pandemia não seria resolvida rapidamente”, justificou Raul Leite, presidente do SetraBH.
 
A chamada “baixa dos veículos” no sistema aconteceu com o aval da BHTrans. “Isso não foi feito de maneira unilateral. Ela (a empresa) permitiu a adequação. Tudo isso aconteceu para evitar o colapso naquele momento. Os empresários precisavam de recursos financeiros para suportar o pagamento dos salários”. O balanço mostra que o consórcio Pampulha, que atende a população da região de mesmo nome, além de Venda Nova, foi o que mais “dispensou” ônibus: 151. 

Leite explica que a venda também ocorreu levando em consideração à vida útil de alguns veículos que estaria perto do fim. O contrato vigente entre a prefeitura e as empresas determina que os veículos podem circular até completar 10 anos de fabricação. Com a pandemia, esse período foi aumentado para 12 anos.
 
Análise
 
Para o engenheiro civil e mestre em transporte, Silvestre de Andrade, a prática adotada pelas empresas não é ilegal, mas o especialista faz uma ressalva. “A venda, diante da falta de passageiros, até faz sentido, pois é gestão empresarial. Só que a demanda de passageiros está aumentando e tem que analisar se faz sentido manter as práticas adotadas no momento do pico da pandemia. Aparentemente não (faz sentido)”.

Quem mora em Venda Nova e na Pampulha tem percebido, na prática, a redução no transporte. “A venda dos ônibus pode ter sido boa para as empresas, mas para nós, que somos usuários, só piorou. O coletivo está rodando muito mais cheio e sem falar que demora demais”, comenta o fotógrafo Elton do Carmo, 30, morador do bairro Lagoa.

O estoquista Guilherme Soares, 22, não poupa críticas. “Só piora e nada de melhora. É uma pouca vergonha o que fizeram. Tinham era de aumentar os ônibus, principalmente nos horários de pico”, desabafa. A BHTrans confirmou que a redução da frota foi autorizada, já que “o número de usuários caiu”. Fiscalizações são feitas, segundo a autarquia.

Empresas devem 74 mil multas à BHTrans

A BHTrans aplicou, entre 17 de março de 2020 até meados de fevereiro deste ano, cerca de 74 mil autuações às empresas de ônibus. A motivação foi o “descumprimento das diretrizes estabelecidas em função da pandemia”. A autarquia explicou que o número de passageiros por coletivo e a disponibilização de álcool, por exemplo, são pontos avaliados.

O valor de cada penalidade é de R$ 568,89, conforme a autarquia. O não pagamento das multas ocorre devido aos diversos recursos apresentados pelas empresas. O especialista Silvestre de Andrade alerta que é preciso analisar o cenário e ver se, de fato, essas penalidades têm algum efeito. “O problema maior não é o valor da multa, mas a repetição pelas empresas.
Quanto tempo vai passar multando? Tem um momento que é preciso tomar outro tipo de decisão e punir de outra forma”, explica o especialista. 

A situação caótica no transporte público de BH se dá, na visão de Márcio Aguiar, especialista na área de trânsito, pela ausência de solução dos problemas que foram aparecendo ao longo dos anos. “Nosso sistema de transporte está sem controle algum e é o pior dentre as grandes cidades. A prefeitura não consegue resolver, e quem sofre é o usuário”, considerou. Ainda assim, a BHtrans incentiva que usuários reclamem de ônibus que apresentem problemas e identifiquem a linha, o horário e o número do veículo no PBH APP ou no portal de serviços.