OMISSÃO

Estudante é vítima de homofobia em faculdade de Belo Horizonte

Laís conta que há mais de um ano é ameaçada por um colega de turma e que a faculdade nunca se posicionou

Por JULIANA BAETA
Publicado em 22 de novembro de 2017 | 13:35
 
 
Laís conta que há mais de um ano é ameaçada por um colega de turma e que a faculdade nunca se posicionou Foto: Arquivo pessoal

“Eu tenho medo de ir para a aula todos os dias”, relata a estudante de Educação Física Laís Figuerôa, de 30 anos. Há mais de um ano, ela é ameaçada por um estudante de sua turma dentro da faculdade onde estuda, a Estácio de Sá, unidade Prado, por causa de sua orientação sexual. Neste período, ela não conseguiu sequer formalizar um boletim de ocorrência contra o agressor e, tampouco, a faculdade se posicionou em relação às ameaças.

Laís conta que as provocações começaram em agosto do ano passado quando, em uma aula, um professor citava o exemplo de uma escola onde os alunos do sexo masculino poderiam ir a aula de saia, se quisessem. “Foi quando esse menino disse que se fosse seu filho, ele o matava. Eu me posicionei dizendo que era preconceito, e perguntei como ele tinha coragem de falar isso comigo presente. A partir daí, a perseguição começou”, lembra.

O estudante passou a deixar bilhetes na moto de Laís, com mensagens homofóbicas e ameaças de estupro. Além disso, Laís passou a receber e-mails e mensagens no Facebook de um perfil "fake" com as mesmas ameaças e ofensas homofóbicas. No último sábado (18), a aluna se deparou com a sua foto no banner de formatura pregada na parede da faculdade escrito “aberração” em cima. “Foi tirado um direito meu de ter a minha foto de formanda na parede. Ele faz duas matérias comigo aos sábados e sempre que estamos no mesmo lugar eu sinto pânico. Ele é um cara grande, é homem, eu tenho medo todos os dias de que algo aconteça comigo”, conta.

Em contato com a coordenação do curso ela recebeu apenas a resposta de que a instituição não poderia fazer nada, apenas palestras sobre o assunto, o que também nunca foi feito. Em outra ocasião, a reitoria chegou a pegar o telefone de Laís, mas nunca entrou em contato para tratar sobre o assunto. Quando a aluna falou com professores sobre o caso, ela recebeu a resposta de que isso não era problema da faculdade e que ela deveria resolver diretamente com o aluno. A omissão da instituição e o despreparo da polícia para lidar com essas situações fazem com que os caminhos de Laís entre sua casa e a faculdade sejam mais longos devido ao medo e a insegurança.

“O que eu questiono é: como a faculdade vai formar um cara desses? Ele vai ser professor também, ele vai dar aula. Atualmente as crianças estão mais abertas sobre isso, elas falam sobre isso, elas entendem a diversidade. Eu dou aula para uma creche e tenho várias alunas trans. O que ele faria se desse aula para elas? Ela vai matar todas elas?”, conta.

Por meio de nota, a faculdade Estácio de Sá informou que repudia "qualquer forma de manifestação discriminatória". Veja a nota na íntegra:

"Além do compromisso em formar alunos preparados para o mercado de trabalho, está entre suas missões formar cidadãos conscientes do seu papel transformador na sociedade.

Assim que a Estácio tomou conhecimento dos episódios, prontamente entrou em contato com os envolvidos e agendou uma reunião para apuração dos fatos, a fim de tomar as providências administrativas que são cabíveis a uma instituição de ensino, referentes a qualquer evento ocorrido dentro das instalações da Estácio". 

Falta de acolhimento 

Após o ocorrido com a foto de formatura, no último sábado (18), a estudante Laís Figuerôa fez uma verdadeira via sacra na segunda-feira (20) percorrendo várias delegacias para registrar um boletim de ocorrência.

“Fui na delegacia do Floresta, do Lourdes, do Santo Antônio e do Barro Preto. Em todas elas, fui informada de que deveria sim fazer um registro da ameaça, mas que deveria ir em outra delegacia para conseguir. Na delegacia de atendimento à mulher, no Barro Preto, onde fui por último, sequer fui atendida, fiquei cinco horas esperando. Minha advogada me orientou então a ir ao Núcleo de Atendimento e Cidadania à População LGBT, onde consegui fazer um registro de injúria, danos morais e ameaça de estupro. Mas o boletim de ocorrência mesmo só vou conseguir fazer na próxima terça-feira (28), por causa desta questão burocrática. A pessoa que me atendeu no núcleo terá que ir lá pessoalmente levar o registro”, explica.

A assessoria da Polícia Civil informou que em casos de injúria, ameaça e perseguição, é necessário que haja uma representação da vítima para que se inicie a investigação. Mas a partir do registro já feito no Núcleo de Atendimento e Cidadania à População LGBT, a vítima será intimada a prestar depoimento e poderá assinar o termo para que se dê prosseguimento às investigações.

Sobre a falta de atendimento nas delegacias por onde Laís passou, a Polícia Civil informou que seria necessário saber caso a caso o que aconteceu nas unidades para se apurar porque não houve o registro da ocorrência. A corporação informou que qualquer ocorrência policial pode ser feita em qualquer delegacia da Polícia Civil ou unidade da Polícia Militar.

Apoio

Com a omissão da faculdade, Laís encontrou apoio nos colegas de turma, amigos e movimentos feministas. Um abaixo-assinado foi feito para pedir que a instituição tome providências em relação ao estudante e já conta com mais de 4.000 assinaturas até a tarde desta quarta-feira (22).

Acusado

A reportagem tentou contato com o acusado de homofobia, mas ele não atendeu as ligações.