A ausência de apetite e as reclamações constantes de fortes dores de cabeça apareceram como os primeiros indícios de que algo não estaria certo com Carlos Eduardo, 8. Preocupada com a temperatura da criança, que permaneceu durante horas entre 38°C e 39°C, a mãe do menino, Glaucimara Rodrigues dos Santos, 25, decidiu levá-lo até uma UPA em Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, próxima de onde mora com o filho.
Segundo ela, a unidade não aceitou testar a criança para Covid-19, apesar dos sintomas, situação que se repetiu no Centro de Saúde Morro da Cruz, para onde a mãe seguiu com o menino após atendimento na UPA. A Prefeitura de Sabará encaminhou à reportagem uma nota com os critérios definidos pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) para aplicação de testes rápidos, e crianças não são contempladas no documento.
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Diante das recusas, Glaucimara decidiu pegar um ônibus com o filho ardendo em febre até encontrar um laboratório particular em Belo Horizonte que aceitou examiná-lo pelo preço de R$ 298. A conclusão do teste chegou na segunda-feira (6) e apontou diagnóstico de Covid-19. Entre os dias que se passaram do aparecimento dos primeiros sintomas, ainda no começo do mês, até a conclusão do exame, Carlos Eduardo andou de ônibus, esteve em contato com os avós, que pertencem ao grupo de risco, e com a própria mãe, que precisou permanecer em observação em um hospital de Sabará após dar entrada com dificuldade para respirar e outros sintomas de coronavírus.
A consultora de vendas Glaucimara Rodrigues dos Santos critica a postura do município de não ter testado a criança logo que ela deu entrada na unidade de saúde e aponta que o menino pode ter contaminado outras pessoas no trajeto até o laboratório que o testou.
“O que mais me revoltou é o descaso com uma criança. Ele estava com muitos sintomas, dor de cabeça forte, gosto amargo na boca, febre de 39°C, ausência de apetite e diarreia. Só porque é criança ele podia ir para casa? Acho que deveriam ter feito o teste nele até para que tivéssemos feito o isolamento desde o início. Eu precisei ir até um laboratório com meu filho, sem conseguir andar, para testar. No posto de saúde, me disseram que o exame só serve para entrar na estatística e me mandaram para casa com uma medicação”, detalha.
Ela esclarece que os avós maternos de Carlos Eduardo entraram em contato com ele após a recusa do sistema municipal de saúde em testá-lo. O pai de Glaucimara foi até o hospital na terça-feira (7) após apresentar sintomas. A avó do menino também está com suspeita de Covid-19. “Meu pai não está sentindo gosto, está com muita dor de cabeça, dor acima dos olhos. Minha maior preocupação é que ele é hipertenso e diabético. Minha mãe não está bem”, afirma.
Glaucimara também precisou comparecer a uma unidade de saúde após ter tido contato com o filho, que, provavelmente, se infectou após abraçar o padrinho. “Fui até o hospital com muita dor no corpo, tosse e dificuldade para respirar. Me pediram um raio-x, que apontou pneumonia. Também não quiseram me testar, disseram que eu não precisava fazer o exame e que era melhor não sair de casa. Eu creio que tinha que fazer o exame para realmente saber se tenho o vírus ou não”, critica.
Segundo ela, uma grande preocupação é que ela e o filho entraram em contato com muitas pessoas após o sistema de saúde de Sabará ter se recusado a testar o menino. “Acho que deveriam ter feito o teste nele. Se tinha o teste, por que não fazer? Ele é uma criança. Nós pegamos ônibus para ir a Belo Horizonte e tentar encontrar o exame, o contato foi enorme com muitas pessoas, mesmo ele tendo usado máscara e nós termos tomado os cuidados no trajeto. Existe o teste, mas não quiseram fazer, disseram que não era caso grave e que era criança”, relata.
Glaucimara Rodrigues dos Santos e os pais ainda estão com sintomas de Covid-19, mas Carlos Eduardo já está se recuperando da doença. “Ele está bem melhor, os sintomas passaram, e ele voltou a comer”, conclui. Apesar de passado o susto, ela decidiu alertar outros moradores da cidade publicando uma queixa na página da Prefeitura Municipal de Sabará. Nos comentários, outros moradores relataram situações parecidas e criticaram a postura do município no combate à pandemia de coronavírus.
Determinação
Procurada, a Prefeitura de Sabará encaminhou à reportagem uma nota técnica produzida pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) e que é seguida pelo município no que tange à aplicação de testes rápidos. O documento aponta obrigatoriedade de testagem em casos de pacientes sintomáticos enquadrados em categorias muito específicas.
São testados aqueles profissionais da saúde e da segurança pública, pessoas que moram nas residências desses funcionários, idosos com idade igual ou superior a 60 anos, pacientes com comorbidades ou condições médicas subjacentes, população economicamente ativa com idades entre 15 e 59 anos e óbitos suspeitos de Covid-19.