Trânsito

Prioridade a pedestre pode deixar condutor mais tempo nos sinais

Espera em semáforos para andantes reduziu 30 segundos em 190 pontos da cidade

Por Mariana Nogueira
Publicado em 21 de abril de 2019 | 03:00
 
 
Entre a praça Sete, no centro, e o limite com Contagem, reportagem gastou quase uma hora e ficou parada 22 minutos em sinais Foto: Uarlen Valério

Não é segredo para o motorista belo-horizontino que os cerca de 8,5 km da avenida Amazonas, que vão da praça Sete, no centro da capital, até o limite com Contagem, na região metropolitana, podem ser percorridos em mais de uma hora em horário de pico. Grande parte do tempo, contudo, é gasta com pausas nos semáforos. Nesse trecho, é possível ser parado 25 vezes pelos 45 semáforos da via, o que representa mais de 22 minutos de espera nos sinais. E as pausas ocorrem, geralmente, logo após se passar por um semáforo verde. Esse é um dos exemplos da “falta de sincronia” enfrentada pelos motoristas na capital. Para especialistas, a situação é reflexo de uma prioridade da Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) dada aos transeuntes.

Desde o fim de 2018, muitos pedestres de Belo Horizonte circulam pela cidade com mais oportunidades de travessia. É que o tempo de espera nos sinais para eles foi reduzido de 120 segundos para 90, elevando o número de travessias de 30 para 40 no período de uma hora. A medida já foi implantada em mais de 190 pontos de Belo Horizonte e deve chegar a toda a cidade.

A opção, no entanto, pode ser mais um empecilho para que a chamada “onda verde” – programação que deixa todos os semáforos de uma mesma via livres – não seja vista na capital. “A viagem fica mais lenta. Quando a cidade opta por priorizar o pedestre, ela está dando menos prioridade ao veículo, e ele vai pagar o preço”, afirma o mestre em transportes Silvestre de Andrade Puty Filho.

COP. A reportagem acompanhou, na quinta-feira, os trabalhos da BHTrans no Centro de Operações (COP) para a mudança diária das 1.043 intercessões semafóricas da cidade. Segundo a empresa, 80% delas podem ser alteradas dentro do centro ao longo do dia. Ainda conforme a BHTrans, a onda verde existe em pontos como em trechos das avenidas Antônio Carlos e Cristiano Machado, mas a liberação no restante da cidade é difícil devido à estrutura da capital. “Em uma via de mão única, é fácil obter esse sincronismo, mas a gente dá prioridade a um maior fluxo nos horários de pico”, diz o assessor da Diretoria de Sistema Viário, José Maurício Pinto Júnior.

O gerente de Integração de Operação de Tráfego, Wesley Alves Rodrigues, explica que, em um único dia, os semáforos de diferentes pontos podem ficar mais ou menos tempo no verde: “Podem ser geradas (as mudanças) por uma manifestação, por um veículo danificado ou por um defeito no semáforo”.

A reportagem constatou que também é possível ficar parado em sinais vermelhos logo após se passar pelos verdes nas avenidas Bias Fortes, até a praça da Liberdade, na Olegário Maciel, em direção ao elevado Dona Helena Greco, e na avenida do Contorno, em direção à trincheira da Raja Gabaglia. “A sensação é a de que estamos sempre perdendo tempo”, reclama o advogado Joav Vieira, 24. “Temos equipes tanto em campo como na central empenhadas para oferecer o melhor fluxo de trânsito”, diz Wesley Rodrigues.

O consultor em assuntos urbanos José Ribeiro avalia que “a redução de travessia do pedestre vai piorar o que já está ruim”.

Trabalho. Segundo a BHTrans, 82 pessoas atuam na operação dos semáforos da capital por dia.

Ranking. Pesquisa do Índice 99 de Tempo de Viagem de 2018 apontou BH como a oitava capital com o pior trânsito do país.

Aumento. De 2009 a 2019, interseções semaforizadas na cidade aumentaram 28%.

BH precisa de mais de 200 intervenções

Para o consultor em assuntos urbanos e autor do blog SOS Mobilidade Urbana, José Ribeiro, em vez de a BHTrans liberar a chamada “onda verde” na cidade para que trânsito tenha mais fluidez, o ideal seria a prefeitura realizar obras para eliminar grandes gargalos que há em Belo Horizonte. Segundo ele, é necessária a realização de ao menos 200 intervenções. “Precisamos de corredores sem sinais. Nós temos uma topografia que contribui para fazer tudo, mas não se fala em obras em BH. São necessárias intervenções de engenharia, com trincheiras, viadutos e passarelas. A cidade precisa ter corredores capazes de atravessá-la sem a intervenção de tráfego”, diz.

José Ribeiro elenca algumas obras que contribuiriam para a melhoria do trânsito: “O complexo da Lagoinha poderia ser transformar na conexão dos corredores; o trevo do BH Shopping, o cruzamento das avenidas Raja Gabaglia e Barão Homem de Melo, bem como o das vias Afonso Pena e Getúlio Vargas, precisam de obras”.

Ele cita ainda a avenida do Contorno, os cruzamentos do Anel Rodoviário com a Pedro II e a Antônio Carlos.