As mineradoras Gute Sicht e Fleurs Global, que atuavam na serra do Curral, em Belo Horizonte, tiveram suas atividades suspensas pela Justiça Federal. A decisão foi proferida na última segunda-feira (23) e determinou, ainda, que uma multa de R$ 300 mil por dia seja aplicada em caso de descumprimento. Saiba detalhes da decisão: 

Sem licença

As empresas Gute Schit LDTA. e Fleurs Global mineração, conforme a decisão da Justiça, não tinham, em 2020, licença para minerar. Elas teriam usado a liberação ambiental dada para a empresa Valefort para realizar a terraplanagem do espaço para acobertar a atividade de extração de minério.

“O modus operandi dos investigados consiste na prática da atividade de terraplanagem de terrenos, regulares ou invadidos, sem autorização ou em discordância com o autorizado pela Prefeitura local, para dissimular a extração irregular de minério (pois o solo da região é rico em minério), comercializando o minério assim retirado para siderúrgicas ou empresas de beneficiamento de minério (conhecidas como “peneiras”), burlando, deste modo, a fiscalização dos órgãos ambientais competentes” (sic 341044852, fl. 01)”, escreveu a juíza federal Gabriela de Alvarenga Silva.

É importante explicar que a liberação de licença ambiental para realizar a terraplenagem consiste no preenchimento de um documento eletrônico no site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). 

Desculprimento de ordem da Prefeitura de Belo Horizonte

A juíza informou que a prática de mineração na área havia sido impedida pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), no dia 15/05/2022. No entanto, as empresas preferiram descumprir a medida e pagar a multa diária de R$ 25 mil — isso significa que elas descumpriram a determinação e seguiram minerando.

A decisão municipal se deu porque a área onde estava ocorrendo a atividade é tombada visto que está localizada na serra do Curral. Conforme a lei, a proteção ambiental é dever do município, Estado e União.

“A competência para a proteção ambiental é comum para todos os entes federativos segundo a CF/88, portanto, pertencendo o terreno a área tombada da serra do Curral, imprescindível a autorização de licenciamento ambiental por parte do Município para que a ANM (Agência Nacional de Mineração) autorizasse a concessão de lavra naquele local, o que por si só torna o ato da autarquia federal viciado, já que nenhuma consideração foi feita a este respeito. Aliás, como não houve licenciamento ambiental, não houve no processo administrativo da ANM qualquer referência a respeito”, explicou a juíza.

Falsa garagem

A Valefort havia firmado um contrato com a Assembleia dos Santos para supostamente construir a garagem da Fleurs no local. O direito de minerar pertencia à Mineração Gute Sicht (antiga Boa Vista). No entanto, nunca foi construída uma vaga de garagem no local, conforme a perícia da Polícia Federal (PF). A atividade de terraplanagem (que precisa de uma autorização municipal) teve apenas a dispensa da licença ambiental por parte da Semad. 

Uso indevido de documentação

A Gute Sicht usou a certidão de licença de licenciamento ambiental dada à atividade de terraplanagem para a Valefort e um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado com a Semad para conseguir, em 05/11/2021 a licença para minerar no local dada pela ANM. Porém, a empresa já estava atuando no desde fevereiro de 2020.

É importante ressaltar que, conforme a Justiça, a ANM concedeu a autorização mesmo sabendo que a licença para a terraplanagem não estava no nome da empresa mineradora. Além disso, o TAC (firmado em julho de 2019) foi usado como uma espécie de licença ambiental. Não houve, então, nenhum tipo de estudo de impactos ambientais da atividade mineradora na área.

“Assim, sem qualquer estudo de impacto ambiental, esta certidão de dispensa de licenciamento para a atividade de terraplanagem obtida pela Valefort foi utilizada pela mineração Gute Sicht para obter a guia de utilização mineral junto à ANM. Contudo tal não poderia ocorrer, pois sequer a dispensa de licença ambiental havia sido expedida no nome da mineradora e não é possível utilizar a licença ambiental de outra empresa. Primeiro dos problemas”, esclarece a decisão. 

Irregularidades nos TACs

Conforme a investigação da Polícia Federal, os TACs assinados entre a empresa mineradora e o governo de Minas apresentam uma série de irregularidades. O primeiro documento foi assinado em julho de 2019. Depois, o acordo foi renovado em março de 2020 e em fevereiro de 2022.

A Justiça afirma que a renovação desse tipo de termo não foi correta, já que o TAC não é uma licença ambiental, documento essencial para a atividade minerária. Além disso, a renovação do termo chamou a atenção da Justiça, uma vez que houve descumprimento das questões acordadas. A Semad autuou as empresas e, mesmo assim, renovou o TAC.

Um dos pontos descumpridos foi a supressão da vegetação de Mata Atlântica sem qualquer compensação. “Desta forma, o descumprimento reiterado das cláusulas do TAC firmado em 2019 deveria ter provocado a rescisão do termo de ajustamento de conduta, porém, não só foi renovado, como as cláusulas de obrigações para a empresa foram retiradas, contrariamente ao interesse público e moralidade”, afirmou a juíza na decisão.

Indiciamentos

O então chefe de divisão da ANM, indiciado no processo, continua na agência, como membro da diretoria colegiada da ANM. O mandato dele se encerra em dezembro de 2024. Ele foi indiciado por prevaricação (uso do cargo público para realizar atos contra a administração em geral)

Também foi indiciado o responsável pelas empresas Gute Sicht e Fleurs (que são do mesmo dono).

O que diz a Semad

Poir meio de nota, a Semad informou que anteriormente já havia suspendido administrativamente as atividades das empresas Mineração Gute Schit Ltda e Fleurs Global Mineração Ltda, mas que elas atuavam "amparadas por liminares judiciais".

"A Semad tem conhecimento da decisão judicial mais recente sobre ambas, proferida pela juíza da 3ª Vara Federal, na última segunda-feira (23), que determinou a suspensão imediata da atuação das empresas, e cumprirá seu dever de fiscalização. Cabe frisar que o Estado não é parte desta ação judicial", finalizou. 

Atualizada às 08h08 do dia 27 de janeiro de 2023