Morosidade

Tragédia ainda sem respostas 

Quinze dias após o desastre, multas não foram entregues à Samarco, e investigações estão no início

Por Luciene Câmara
Publicado em 20 de novembro de 2015 | 04:00
 
 
Apagado. Subdistrito de Bento Rodrigues deixou de existir após passagem de onda de rejeitos de minério Alex de Jesus/O Tempo

Já fazem 15 dias que uma enxurrada de lama atingiu o subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na região Central, provocando mortes e destruição. As toneladas de água e rejeitos de minério seguem até hoje descontroladas por Minas e pelo Espírito Santo e, por onde passam, deixam um rastro de revolta e desejo de justiça. No entanto, até agora ainda não se sabe o que causou o rompimento da barragem da Samarco nem quem serão os responsáveis a serem punidos e a pagar a conta da tragédia.

Cerca de 600 desabrigados ainda permanecem em hotéis, e outras 12 pessoas estão desaparecidas. As buscas continuam, segundo o Corpo de Bombeiros, mas a cada dia diminui a esperança de encontrar vítimas com vida e aumenta a dor das famílias. Nem sequer as multas aplicadas por órgãos competentes, com valores considerados irrisórios, foram entregues à Samarco para pagamento. Outras penalidades aguardam para serem aplicadas.

As cinco autuações emitidas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), na semana passada, somaram R$ 250 milhões. O máximo permitido para cada multa é de R$ 50 milhões, por conta de lei defasada de 1998. Outras cinco penalidades ainda podem ser aplicadas, mas o órgão informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “aguarda o final do desastre para verificar a dimensão dos danos e talvez multar o que ainda não multou”. Se pagar a multa do Ibama em 20 dias, a empresa ainda terá desconto de 30% no valor.

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente também aplicou, nesta quarta, punição de R$ 112 milhões (faixa máxima permitida para o tipo de punição) e declarou que, “após o término dos trabalhos de identificação e quantificação dos danos, o órgão ambiental poderá aplicar outras penalidades específicas”. A Samarco alegou que não tinha recebido nenhuma notificação. Nos casos de multas administrativas, a empresa é obrigada a pagar tanto as punições aplicadas por órgãos federais, quanto de órgãos estaduais e até mesmo de órgão municipais, se houver.

Para o professor Valdir Costa e Silva, da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), faltam definições sobre uma questão prioritária, que é a reparação dos danos ambientais. “Diversos órgãos estão estabelecendo multas, mas será que o valor vai dar para cobrir todos os custos?”.

Ao mesmo tempo, investigações foram iniciadas em diversas esferas para apontar as causas e os responsáveis, mas ainda seguem sem conclusões. O promotor de Justiça Carlos Ferreira Pinto afirma ser prematuro apontar causas. “Só posso dizer que não tem nada de fatalidade natural, de acidente. É realmente uma intervenção equivocada que gerou o rompimento”. 

Pendências
Dúvidas
. Algumas das perguntas sem resposta: De quem é a culpa? O que causou o rompimento da barragem? Quem vai pagar por todos os danos? Onde estão as pessoas desaparecidas?

Saiba mais
Resgate
. O Corpo de Bombeiros encontrou um braço próximo ao rio Doce, na altura do município de mesmo nome, na Zona da Mata. Exames de DNA devem confirmar se ele tem relação com o rompimento da barragem de Fundão.

Mortes. Até o momento, 11 corpos já foram achados, sendo que quatro ainda
não foram identificados. Doze pessoas estão desaparecidas – nove funcionários da Samarco e três moradores. 

Polícia Civil. O delegado da Aloisio Fagundes, da Delegacia de Crimes contra o Meio Ambiente, informou que ouviu 12 pessoas. Ele analisa cópias das plantas do projeto de construção e
de monitoramento da barragem de Fundão e realiza uma perícia técnica no local, com apoio de geólogo contratado.

Outras investigações. A Polícia Federal também apura a tragédia, mas não deu informações sobre o inquérito. A BHP Billiton, uma das controladoras da Samarco, informou que realizará uma investigação independente sobre o rompimento da barragem.

Fundo. Termina segunda prazo do MPMG para que a Samarco crie fundo de R$ 1 bilhão para a recuperação do rio Doce. A multa diária para descumprimento é de R$ 200 mil.

Famílias cobram buscas e moradia

Mariana. 
Quanto mais o tempo passa, mais as famílias atingidas pela tragédia temem que o problema caia no esquecimento e na impunidade. Até hoje, questões básicas, como acomodação dos desabrigados, ainda não foram resolvidas. Segundo a Samarco, 1.265 pessoas foram alocadas em hotéis da região e 300 casas estavam sendo vistoriadas para receber as famílias até que uma solução definitiva seja realizada, como a reconstrução de Bento Rodrigues.

Antes de responder como está sendo a vida no hotel, a dona de casa Terezinha Custódio, 45, hesitou, mas afirmou desesperançosa: “O que a gente pode fazer? Estou esperando para ver se eles arrumam uma casa, se decidem alguma coisa. Hotel é ruim demais. Não gosto de depender dos outros. Tinha uma vida tranquila, e depois descontrolou tudo em um piscar de olhos”, disse.

O prefeito de Mariana, Duarte Júnior, também cobra que as buscas aos desaparecidos não parem. Esse foi um dos pedidos prioritários feitos por ele em Brasília, na última quarta-feira, quando solicitou também multas mais altas à Samarco. “Não se deve estabelecer um valor máximo de multa.

Ela deve ser de acordo com o levantamento feito diante dos danos causados a cada família e ao meio ambiente. O valor (R$ 250 milhões) é muito baixo para uma empresa que lucrou R$ 2,8 bilhões só no ano passado”, afirmou.