Os moradores de São Sebastião das Águas Claras, também como conhecido como Macacos, na região metropolitana de Belo Horizonte, foram surpreendidos, na noite da última sexta-feira, com decisão do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) que suspende a doação dos vouchers de alimentação que vinham recebendo da Vale do Rio Doce. A revolta foi grande por parte da população uma vez que a comunidade não foi ouvida antes da ação ser tomada. 

A mineradora vinha contribuindo com os moradores, desde março de 2019,  depois dos riscos de rompimento de barragens na região, que afetou diretamente o comércio da região, que tinha o turismo como um dos principais atrativos. A associação de moradores esperava por alguma mudança na forma de distribuição, em virtude do coronavírus, uma vez que aglomerações costumavam acontecer no espaço destinado para tal. Mas a decisão surpreendeu os representantes de Macacos. A distribuição de vouchers, que acontecia a cada segunda-feira, está suspensa. Cada morador recebia dois vouchers por dia, equivalentes ao almoço e jantar, tendo estes benefícios, muitas vezes, como fonte de sobrevivência. 

A nova decisão é que os interessados em seguir com o benefício realizem cadastro por meio de uma plataforma digital para, só depois, voltarem a receber recursos, equivalentes a um salário mínimo por adulto, meio salário mínimo por adolescente e 1/4 de um salário mínimo por criança. 

A previsão da Vale é que todos os cadastros sejam feitos em até 30 dias. Um dos entraves é o não acesso de muitos moradores à internet, além de outros serem iletrados e não possuírem sequer conta em banco. Para se registrarem, seriam exigidos documentos como comprovante de endereço. Moradores seriam obrigados a sair de casa para conseguir o comprovante e também para abrir conta em bancos, quebrando a orientação de isolamento em meio à pandemia do coronavírus. Quem tem acesso à internet, informou que tentou fazer o cadastro nesta segunda-feira pela manhã, sem sucesso.  

"Muita gente perdeu o emprego e não tem renda alguma. Essas pessoas estão sem um auxílio mínimo pra comprar comida. Entendemos a situação de emergência em saúde, mas existem outras soluções que não seja retirando os direitos dos atingidos. É inadmissível e desumano retirar direitos das pessoas utilizando o cenário dramático da pandemia que estamos passando, expondo a comunidade a ainda mais riscos, em um momento onde as população precisa estar isolada e em segurança em casa", comenta Melina Borges, presidente da Associação Comunitária de Macacos.

Indenizados são prejudicados

Um outro ponto que incomodou foi a suspensão dos recursos para quem recebeu algum tipo de indenização da Vale nos últimos anos. "Voucher não é indenização, cortaram os direitos sem critérios e ignorando a comunidade. Não fomos sequer consultados. Estão penalizando pessoas que fizeram acordo com a própria Vale pelos danos sofridos, trabalhadores que perderam o emprego por causa desta empresa. Esta decisão é muito prejudicial, principalmente pela forma como foi feita, sem planejamento algum. Precisamos de uma solução imediata", reforça Melina. 

A reportagem fez contato com o Ministério Público, mas não havia recebido resposta até o fechamento desta reportagem. A Vale informa que tal medida aconteceu de forma emergencial, justamente para evitar a aglomeração de pessoas que recebem o benefício durante a pandemia do coronavírus. 

Confira abaixo o posicionamento da Vale na íntegra

Tendo em vista as recomendações de isolamento social diante do quadro de pandemia da Doença do Coronavírus (COVID-19), a Vale realizou um acordo com o Ministério Público, com a anuência da Defensoria Pública de Minas Gerais, para converter o voucher-refeição entregue à comunidade de Macacos em pagamento substitutivo, com depósito em conta. A medida tem como objetivo garantir a segurança de empregados, terceirizados e moradores, que participavam da distribuição dos vouchers e recebiam o benefício, às segundas-feiras, presencialmente, no Posto de Atendimento da Vale.

O pagamento substitutivo prevê o repasse mensal de um salário mínimo por adulto, meio salário mínimo por adolescente e ¼ para crianças. A Vale está analisando a lista enviada pelo Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de Nova Lima, em 2019, contendo as 3.711 pessoas atualmente elegíveis ao recebimento do voucher, para desenvolver uma plataforma simples de cadastramento, de modo a tornar o processo o mais ágil possível para a comunidade.

É importante ressaltar que o voucher recebido pela comunidade de Macacos era de uso exclusivo para a alimentação e condicionado ao gasto no comércio local, que atualmente está fechado em razão da COVID-19. O pagamento substitutivo será depositado, mensalmente, em conta.

Adicionalmente, para auxiliar os atingidos, a Vale viabilizou o fornecimento de refeição, diariamente, em todas as acomodações dos hotéis e pousadas e a entrega de cestas básicas nas moradias temporárias.