O banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed), voltou a aumentar a taxa básica de juros do país nessa quarta-feira (2), numa tentativa de controlar a inflação. Mas como esse movimento interfere na economia brasileira?

Para explicar as repercussões no Brasil, que vive um momento de intensas mudanças no mercado desde a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), O TEMPO ouviu dois economistas: Vinícius de Castro, professor de mercado de capitais da PUC Minas, e Gelton Pinto Coelho, do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG).

Para o docente da PUC Minas, o primeiro impacto acontece na taxa básica de juros brasileira, a Selic. Atualmente, ela está em 13,75%, patamar mais alto desde outubro de 2016. “A inflação dos Estados Unidos hoje está na faixa de 8%. Isso levou o Fed a elevar as taxas de juros para 4%. Ou seja, ainda que o Brasil esteja com a Selic adequada para o patamar de inflação atual, com tendência de queda, a elevação da taxa de juros (dos EUA) pode fazer com que o ritmo de redução da Selic no médio prazo possa ser adiado. E, no curto prazo, provocar ligeira elevação na taxa de câmbio”, diz. 

Gelton Pinto Coelho explica com mais detalhes como a alta de juros dos Estados Unidos pode elevar ainda mais a cotação do dólar no Brasil. “A tendência é que mais pessoas desloquem os investimentos para os EUA. Captando mais recursos, esse dinheiro vai sair de algum lugar. Como consequência, a gente tem uma saída de capitais (do Brasil). Isso pode aumentar a pressão sobre o câmbio, impactando o preço do dólar. Isso pode encarecer a importação de determinados produtos, como a linha de informática, por exemplo. Setores que dependem de insumos também, como os insumos agrícolas”, afirma o economista do Corecon-MG. 

Como fica o futuro? 

Para definir o que será da economia brasileira nos próximos meses, principalmente a partir de janeiro, quando Lula assume o governo, é preciso ressaltar que o mundo vive um momento de aperto econômico em primeiro lugar. Portanto, há uma alta inflação em vários mercados, o que motiva um aumento dos juros, o que, evidentemente, provoca uma queda no consumo. Com o crédito mais caro, a população mundial tem mais dificuldade para conseguir empréstimos, o que desacelera a economia. 

O professor de mercado de capitais da PUC Minas, Vinícius de Castro, lembra que 2023 será um ano desafiador para todos os países na área econômica. “O ano de 2023 está logo ali, mas alguns desafios permanecem. Temos a questão europeia; os desafios na questão energética; o conflito entre Rússia e Ucrânia, como ele vai se desdobrar; o ritmo de crescimento americano; e a questão que envolve taxa de juros e inflação mundo afora. Além disso, um olhar sobre a China, que acabou de fazer uma grande transição política. Precisamos avaliar os dobramentos disso na economia, tendo em vista que o Brasil é um grande exportador de commodities”, diz. 

Para Castro, esse cenário tende a dificultar o crescimento econômico no ano que vem.  "É importante ressaltar que os desafios fiscais do Brasil precisam se consolidar. É preciso manter o lado fiscal com bastante responsabilidade, para que a gente possa sofrer menos com eventual desaceleração da economia mundial, bem como com o aumento de juros lá fora. Uma vez que tenhamos aqui um equilíbrio fiscal mais forte, a probabilidade é que a gente tenha uma transição mais leve na economia em 2023”, afirma o docente da PUC Minas. 

Gelton Pinto Coelho, do Corecon-MG, aponta que a imagem do ex-presidente Lula lá fora pode ajudar o país a ter um melhor desempenho econômico a partir da atração de investimentos. Principalmente, a partir da gestão do meio ambiente. A eleição rendeu ao petista uma convocação para a COP27 no Egito, além da sinalização da retomada de investimentos estrangeiros para coibir o desmatamento.

“Já tem um posicionamento da Noruega e de outros países para voltar a investir no Fundo da Amazônia. Esses investimentos vão entrar em dólar. Essa mudança na relação internacional é muito clara. Em dois dias, o presidente eleito tem mais contato com a agenda externa do que o atual em quatro anos. No caso do governo Lula, acho que os problemas maiores são internos. Há muitas coisas a serem resolvidas, como a pobreza extrema e a qualidade de emprego que se gera no Brasil, que hoje é muito ruim”, completa o economista.