Fundado em 2015, com a promessa de ser a antítese no meio político, o Partido Novo vive um processo de desidratação, que tem ganhado ainda mais força após o desempenho da legenda nas eleições deste ano. Diferentemente de 2018, quando atraiu simpatizantes e conseguiu um desempenho surpreendente ao eleger o governador de Minas, Romeu Zema, até então desconhecido no meio político, e 20 deputados estaduais e federais, a sigla parece ter minguado nas urnas em 2022. 

Neste ano, o Novo sequer conseguiu atingir a cláusula de barreira, que determina aos partidos a eleição de pelo menos 11 deputados ou 2% dos votos válidos no país. Sem acesso a tempo de propaganda de TV e sem a obrigação de ser chamado para debates nas próximas eleições, nos bastidores o temor é que a sigla sofra uma debandada dos poucos eleitos e vá rumo ao desaparecimento. 

Neste ano, o Novo conseguiu eleger apenas três deputados federais e cinco estaduais. Na bancada mineira em Brasília, nenhum nome foi eleito. Até mesmo ex-secretários de Zema, como Ana Valentini e Carlos Amaral, que tentavam uma vaga na Câmara dos Deputados, mal chegaram perto na disputa. O mesmo ocorreu com Ricardo Zema, primo do governador, que foi o nono mais votado pela sigla, mas também ficou sem cadeira. 

“O Novo não é mais novo”

O argumento dos opositores de que o Novo se perdeu no discurso da antipolítica, tem preocupado dirigentes da sigla que têm visto com receio os rumos da legenda.

Na Assembleia, os dois deputados eleitos neste ano são recém filiados ao partido e já têm bagagem política. Eleito com pouco mais de 52 mil votos, Dr Maurício foi o mais votado pelo Novo. Ex-prefeito de Ouro Fino por dois mandatos, o médico foi filiado do MDB, assim como Zé Laviola, filho da deputada estadual Celise Laviola (Cidadania), que neste ano não disputou as eleições e ajudou na campanha do filho. 

“Quem garante que vão ficar no Novo e não vão sair no meio do mandato, impossível continuar nessa composição. Além disso, são pessoas que não têm ligação nenhuma com o partido, não sabemos se vão estar mais preocupadas com seu eleitorado do que defender o partido”, afirmou um interlocutor ligado ao Novo, sob anonimato. 

“O Novo já se perdeu ao querer incluir fileiras populistas, acabou. Perdeu por coerência, perdeu o propósito inicial e está cheio de racha interno. Aliás, o núcleo mais duro do partido foi o primeiro a se perder”, afirmou outra pessoa com trânsito no partido ao citar as coligações do Novo nestas eleições. 

Pela primeira vez, a sigla se coligou com outras legendas. Em Minas, o Novo fez nove coligações e chegou a doar R$ 300 mil para a campanha do senador Marcelo Aro (PP), um dos partidos aliados da chapa de Romeu Zema na disputa pelo governo de Minas. 

“Se uniram com o que há de pior na política para defender não uma pauta ideológica, mas um projeto de poder para 2026. Fez aquilo que criticava nos adversários. Se venderam a qualquer custo, se venderam por popularidade e estão  se unindo com o chorume nacional”, criticou o ex-coordenador do Novo na Câmara Federal, Dennys Xavier.

O professor, que se candidatou a deputado federal, se desfiliou da legenda nesta semana depois de se dizer decepcionado com o partido e com Zema. “O Novo se mostrava como uma alternativa na defesa das pautas de liberdade econômica e individual, mas virou mais do mesmo do que já existe no centrão. Tive o desprazer de ver Zema abraçando Janones, e qualquer deputado e qualquer pessoa para conseguir apoio e se reeleger. O que eu vi nessas eleições está longe do que defendo, vi pessoas dispostas a ceder tudo para continuar nos cargos”, pontuou Dennys. 

O ex-assessor da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (SEDE) da gestão de Romeu Zema (Novo), Victor Cezarini alfinetou, nesta semana, publicamente também as alianças do partido nestas eleições. Filiado à sigla, Cezarini expôs os erros e as brigas do partido nas redes sociais.

"A coligação feita pelo governador tirou holofote do Novo, muitos outros partidos se beneficiaram da imagem do Zema, 'escanteando' os candidatos do próprio partido. Fazer uma campanha baseada em ideias e valores, ao invés de conchavos e favores, se tornou praticamente impossível em um cenário de polarização como esse”, afirmou o ex-integrante do governo Zema. Segundo ele, o racha no partido desmoralizou a legenda. 

Relembre. Em 2020, o fundador do Novo, João Amoêdo deixou a presidência da sigla com uma nota justificando que deixava o posto para "ter um pouco mais de liberdade" para expor as suas posições.

Em anos anteriores, Amoêdo defendeu abertamente o impeachment do presidente Jair Bolsonaro (PL), que sempre teve relação amigável com Zema e que, agora, recebe apoio formal do governador mineiro no 2º turno das eleições. “A partir do momento em que João Amoêdo [ex-presidente da sigla] e cia decidiram dividir palanque com a esquerda, o eleitor ficou extremamente desconfiado do Partido Novo”, disse Cezarini. 

Em Minas, o deputado estadual Bartô (PL), eleito em 2018, inclusive, com o nome de “Bartô do Novo” foi expulso do partido depois de se envolver em reincidentes atritos com a legenda. O ápice da crise foi a presença do parlamentar em manifestação de apoio ao presidente Jair Bolsonaro na capital mineira no ano passado, além de ter entrado no prédio de um homem preso na época suspeito de jogar ovos nos manifestantes. 

Secretário de Zema culpa polarização por esvaziamento

A não reeleição de veteranos gerou preocupação sobre o futuro do Novo. Na Câmara, o deputado federal Lucas Gonzalez não  se reelegeu. O deputado estadual Guilherme da Cunha, que tentou a Câmara, também ficou de fora.  Na ALMG, Laura Serrano não conseguiu êxito. Ambos pretendem continuar na legenda. 

“Toda campanha eleitoral envolve um esforço intenso, com escolhas difíceis, mas acredito que fizemos um bom trabalho, com muito empenho e transparência, sem utilizar um centavo de dinheiro público. Nós nos mantivemos fiéis aos princípios e valores que sempre guiaram o meu mandato. Esse caminho vale a pena”, analisa Laura Serrano, que discorda com as críticas de que o partido tenha se desvirtuado. “Acredito que há como estabelecer alianças sem abrir mão dos princípios do partido, em busca de uma maior articulação de objetivos em comum”. 

Na avaliação de Igor Eto, secretário de Governo, o Novo tem amadurecido ao longo dos anos, mas argumenta que o partido sofreu com a polarização em 2022. “Estamos crescendo e amadurecendo. Estamos reeleitos para o governo de Minas Gerais no primeiro turno, o que demonstra que a população está gostando e aprovando a forma do governador Zema fazer política e a forma de o Novo caminhar. Queremos amadurecer cada vez mais como políticos que somos. Essa é a nossa visão para os próximos quatro anos”, pontua ele.

“Elegemos um número aquém da nossa expectativa, mas os dois deputados que foram eleitos são pessoas que, apesar de terem mais vivência na política, caminharam ao nosso lado nos últimos anos, passaram por todas as etapas dentro do processo seletivo do partido. Ou seja, eles estão preparados para representar nossas pautas”, acrescenta. 

Novos eleitos pretendem interiorizar o Novo 

Aos 28 anos, Zé Laviola, eleito deputado estadual pelo Novo, segue o caminho político da família. Filho da deputada estadual Celise Laviola (Cidadania), o advogado acredita que a experiência familiar pode ajudar no mandato. Ele é neto de José Laviola Matos, que foi deputado estadual durante seis mandatos, e sobrinho de José Henrique (1961-2013), também foi deputado pelo PMDB e primeiro vice-presidente da ALMG. 

“Tanto eu, quanto o doutor Maurício, temos um perfil mais político, temos um relacionamento com a política a vida inteira. Acho que a nossa bagagem traz para o Novo o conhecimento na política, o Novo também tem esse entendimento”, pontua o futuro parlamentar, que é produtor rural e pretende focar sua atuação no desenvolvimento regional. 

Ex-filiado do MDB, o advogado diz que escolheu o Novo por identificação ao não optar por ir para a sigla da mãe, o Cidadania. “Foi uma opção minha sair, tomei essa decisão e achamos que o nome dele seria ideal. Eu fui eleita pelo MDB, depois passei para o Cidadania a convite do João Vítor Xavier, mas ao longo do meu mandato fui me aproximando com o governo do Estado, do Romeu Zema. Caminhei junto com eles desde o início, acompanhei o bloco do governo e nós achamos natural que ele (Zé) fosse para o partido do governador”, avalia Celise. 

O mais votado do Novo nessas eleições, Dr. Maurício, também pretende focar nas pautas regionais. O ex-prefeito de Ouro Fino espera encontrar no partido o apoio que não teve no antigo MDB. “O Novo é um partido que fala a minha língua, que não aceita privilégios e mordomias, o fundão. Eu fui abandonado pelo PMDB, saí porque o partido ficou estranho, não tinha assistência, não falo nem financeira, mas técnica e moral, companheirismo, além de não ter deputados regionais”, afirma o médico ortopedista que pretende ainda crescer o Novo no interior do Estado. 

“Todos os partidos podem aprimorar e avançar. Acho que o Novo precisa interiorizar, não focar só nas capitais, dar mais acesso aos prefeitos. Precisamos implementar o partido em muitas cidades e quero que uma das minhas pautas seja dar acesso a prefeito e lideranças locais”, completa. 

Cientista político vê projeto da sigla ‘fracassado’

Na avaliação do cientista político Carlos Ranulfo, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a tendência nos próximos anos é que o Novo desapareça.

Como a sigla não atingiu a cláusula de barreira, dispositivo que estabelece percentual mínimo de votos e de deputados para ter acesso à propaganda partidária, o especialista vê poucas chances da sigla recuperar a força de 2018, quando conseguiu despontar como uma das maiores surpresas da política nacional. A legenda já vem percebendo queda no número de filiados nos últimos anos. 

“O projeto do Novo é um fracasso, a própria votação diz isso. Esse discurso de Estado mínimo, que não usa Fundo Partidário, não atrai o eleitor, não cativa. A população quer saber da fome, da miséria e da segurança. Não à toa, o Novo e os partidos de direita estão sendo engolidos pelo bolsonarismo”, avalia Ranulfo.

Ele acredita que a tendência é que os deputados do Novo comecem a abandonar a sigla. "Sem tempo na TV, a perspectiva do partido é sair do mapa. Pode ter ainda alguns deputados eleitos, mas alguns parlamentares vão procurar outros partidos. Não acredito que nem com o tempo vai melhorar a situação, é um partido que acabou, pode até sobreviver com apoio de pessoas ricas", completa o especialista. 

Para o cientista político, o baixo desempenho da legenda nas urnas neste ano irá prejudicar até mesmo o segundo mandato de Romeu Zema (Novo) no Estado. De acordo com o professor, nem uma provável aliança com a bancada do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, na Assembleia Legislativa de Minas (ALMG), vai se sustentar por muito tempo. A legenda é responsável por nove cadeiras na Casa, perdendo apenas para o PT, que elegeu 12 parlamentares. 

"Um governo no segundo mandato já é mais fraco do que no primeiro naturalmente, porque quando se chega na metade do mandato, os políticos já estão preocupados em quem vai se eleger e nas próximas eleições. E o Novo não tem sucessor na ponta de linha para assumir o lugar do Zema. O Bolsonaro vai lançar esses deputados bem votados e roubar todo eleitor dele. Está cheio de bolsonaristas cheio de votos", analisa o professor que desacredita na performance sucessiva do vice Mateus Simões (Novo). 

"Quem é Mateus Simões? Tem que deixar claro que quem ganhou as eleições foi o Zema, não foi o Novo. O governador nunca trabalhou para o Novo, ele vive autônomo e sequer se empenha para o partido", pontua Ranulfo ao analisar o pouco apoio de Zema aos candidatos do partido à Presidência da República. " Um governador eleito com 56% tinha que ter bancada própria, mas exemplo que Novo e Zema não estão ligados, são coisas diferentes, é que o eleitor não faz relação dos dois, vota em candidato petista e bolsonarista", completa. 

Novo 
Resposta. Desde a última terça-feira (4), o presidente do partido Novo em Minas Gerais, Ronnye Antunes, foi procurado pela reportagem, mas não se manifestou.

Minientrevista
Guilherme da Cunha

Deputado estadual pelo Novo

Como o senhor avalia o resultado do Novo nessas eleições? Qual autocrítica o senhor faz diante desse resultado? Foi um resultado muito abaixo do esperado, mas foi uma eleição marcadamente polarizada no cenário nacional e isso transportou para o legislativo, prejudicando as chances do Novo. O voto ideológico ficou espremido, ficamos sem lugar na preferência do eleitor, porque quem teve bons resultados foi quem apoiou o Bolsonaro e o PT/Lula, além daqueles políticos com fortes bases territoriais. Mas, hoje, passado pouco tempo após as eleições, vejo pouca margem do que poderia ser feito diferente. Não nos caberia em uma eleição que teve como construção a base de emendas, orçamento secreto e amarração com verbas pensando em interesse eleitoral. Não poderíamos abandonar o que acreditamos, que é o combate ao privilégio, respeito ao dinheiro público. Não foi isso que o eleitor procurou nessa eleição e abandonar isso seria em favor de projeto pessoal de poder. Eu acredito em política com propósito e clareza de intenção, eu fui derrotado, mas minhas intenções são claras e não mudam. Queria ir a Brasília e abraçar reformas importantes, como a administrativa, tributária, mas isso não estava na lista de prioridade dos eleitores. Tinha outros candidatos que casavam mais e ok. Eu lamento que o que tínhamos para oferecer não era o que a população queria, porque a gente era muito bom. A gente permanece independente, votando no que acha correto e abraçando pautas difíceis. Ter coragem para isso, como aconteceu com a votação do piso de enfermagem, tem um preço e estamos pagando por ser fiel. Com o tempo pode ser que vejamos erros, vamos ouvir pessoas e fazer mudanças necessárias, mas neste momento não vejo outro caminho. O que a gente viu ser eleito não caberia em um projeto de mandato meu, por exemplo. 

Qual a sua opinião sobre a nova bancada do Novo na ALMG? Os deputados eleitos neste ano são recém filiados ao partido e já possuem uma trajetória política em outras legendas. O Novo não tem problema com isso. São pessoas que fizeram o processo seletivo, tiveram seus históricos analisados e serão cobradas por suas ações. Cada pessoa que entrou terá seu mandato acompanhado e estará sujeita a cobranças. Temos pessoas fantásticas no partido com histórico político anterior, a exemplo do Marcel van Hattem, que era deputado estadual pelo Rio Grande do Sul pelo PP. Temos também no Sul do Brasil, o Bruno Souza, de Santa Catarina, que hoje é deputado, mas já foi eleito pelo PSB e mudou para o Novo no meio do mandato. Além disso, temos o Mateus Simões que já disputou eleições pelo PSDB.  O Tiago Mitraud também se filiou pouco tempo antes de se candidatar e tamanho é o nível de confiança nele que ele é líder da bancada do Novo na Câmara e foi candidato a vice. A gente confia no nosso processo seletivo.

O senhor acredita que o partido Novo tem mudado e se distanciado de suas origens? Precisamos deixar algumas coisas muito claras primeiro e se despir de preconceitos e desinformação. O Novo permite uma única reeleição aos cargos legislativos, isso não mudou Sempre foi assim, nunca mudou essa regra, já permitia e continua permitindo. Em relação às coligações sempre foi permitido desde que seja em torno dos nossos projetos. Nós temos as nossas regras para as composições de governo e os demais partidos precisam concordar. A nossa composição de base sempre está dentro daquilo que consideramos correto. E isso (coligações) foi importante para termos mais tempo de TV, o governador (Romeu Zema) precisava disso esse ano para responder aos ataques e ter direito de resposta, além disso precisávamos de uma base sólida. Vários projetos não conseguimos aprovar por conta da sabotagem na ALMG. Eu vivi isso e sei como foi difícil, tudo foi feito para minar e dificultar o trabalho. Não dá para ficar quatro anos de queda de braço com a Assembleia.