Para compor sua primeira ópera-rock, o Titãs teve que se espelhar em exemplos do exterior, já que, no Brasil, o único conhecido a experimentar o formato era o compositor romântico Odair José, com “O Filho de José e Maria” (1977). Nada que fosse novidade para os integrantes do conjunto que tomou a cena do rock nacional nos anos 80, quando as principais referências vinham também de fora: The Clash, The Police, Beatles e o movimento punk.
Mais diretamente, a banda se inspirou em “Tommy” (1969), do The Who; “The Wall” (1979), do Pink Floyd; e “American Idiot” (2004), do Green Day, para gerar “Doze Flores Amarelas”, dividida em três atos temáticos e com as adesões de Corina Sabba, Cyntia Mendes e Yas Werneck, que atuam como as três protagonistas batizadas de Marias.
“Inicialmente a gente queria gravar só um CD, mas ao longo do processo sentimos a necessidade de ampliar e convidar três cantoras para dar vida às personagens no palco, até porque estamos falando de violência contra a mulher”, explica Tony Bellotto, 58. O guitarrista é um dos remanescentes originais da banda, ao lado de Sérgio Britto, 59, e Branco Mello, 56.
Além de novidades, o projeto trouxe desafios importantes para a trupe. Foi o primeiro trabalho sem a presença de Paulo Miklos, que partiu em carreira solo em 2016, o que levou Bellotto a se arriscar como cantor em algumas faixas. “É chato perder um companheiro, mas, quando a pessoa sai, é porque já estava querendo isso antes. Acabou que foi bom, nos deu mais espaço para criar”, declara Bellotto.
Logo depois de finalizado o DVD, Mello foi diagnosticado com um tumor na laringe, hoje inteiramente curado. “Foi um baque, mas está superado. A partir do ano que vem começamos a turnê em março, por Rio, São Paulo e BH”, conta Bellotto.
No entanto, houve também ganhos. A rainha do rock Rita Lee é quem narra a dramaturgia criada por Marcelo Rubens Paiva e Hugo Possolo em parceria com o Titãs. Em 25 músicas inéditas, como “Me Estuprem” e “Canção da Vingança”, temas espinhosos e em voga são abordados, como a presença das mídias digitais e a violência sexual. “As mulheres estão à frente das grandes questões revolucionárias, de maneira intensa e corajosa”, finaliza Bellotto.
Canções do homem primata à Vossa Excelência
Não é qualquer banda que perde seis de seus integrantes originais e permanece com três. Isso porque o Titãs já se diferenciava na cena pela formação com nove membros (Ciro Pessoa saiu antes do primeiro LP).
Com as trocas naturais e a passagem do tempo, o grupo passou por diversas fases, mas a crítica política permeou a história do Titãs, desde “Polícia”, “Homem Primata”, “Comida” e “Eu Não Aguento” à virulenta “Vossa Excelência”.
“Quando a gente surgiu, vivíamos o fim da ditadura militar, então ter uma eleição democrática é muito importante”, afiança Tony Bellotto, que se mostra preocupado com o cenário de divisão atual. “Vivemos uma polarização, é positivo que as pessoas se manifestem, ninguém quer um governo autoritário”, diz.
“Doze Flores Amarelas” é a primeira ópera-rock feita pelo Titãs e apresenta 25 músicas inéditas, como “Nossa Bela Vida”, “Me Estuprem”, “Ele Morreu” e “Pacto de Sangue”, além de ter narração de Rita Lee e direção de Hugo Possolo.