Não é sem uma dose de razão que “Tico-Tico no Fubá” abre os trabalhos de canto, circo e teatro do primeiro DVD do “Caffeine Trio”, batizado apenas com o nome do conjunto. Mas fique claro, a contenção encerra aqui sua participação. Afinal de contas, foi por ali, na década de 1930, que Zequinha de Abreu compôs o choro clássico imortalizado por Carmen Miranda em 1947, quando a cantora estrelou a comédia “Copacabana” ao lado de Groucho Marx, sucesso retumbante em seu país de origem, os Estados Unidos. De lá também vieram os ecos que seduziram as líricas Sylvia Klein, Renata Vanucci e Carolina Rennô a se juntarem para cantar. Se o primeiro estalo foi dado pelos trios vocais femininos que despontaram em território ianque entre os “dourados” anos 1930 e 1940 – ao menos para o rádio no Brasil –, elas não se detiveram ao estilo conhecido como “close harmony”, ou, em tradução literal, “harmonia fechada”. “Como temos formação erudita, essa origem nos leva a criar personagens, mas, ao mesmo tempo, quando a gente cria essa fusão com a música popular, partimos para uma espécie de ruptura, em que o intocável não existe mais, e chegamos a um lado mambembe”, delineia Renata.

Embora aqui “o fato seja um aspecto secundário da realidade” – como outorga o poeta Mario Quintana –, nesse universo fantástico onde se aceitam as influências de Arrigo Barnabé, Nina Hagen, Marku Ribas, Beatles, Radiohead e punk rock, os tempos harmônicos e geográficos são abertos para as cafeinadas e elétricas moças postarem-se no interregno, ou, antes, na confluência de um Carnaval onde tudo pode. A palavra perene (pois não há ordem alguma) é a liberdade.

Mas é também o amor, diverso, em vestimentas a celebrarem a alegria e a mistura. “Montamos os figurinos com nossas próprias roupas e acrescentamos acessórios extravagantes aqui e acolá. Um desejo nosso é assistir a performances de drag queens para nos inspirar, acho que teríamos boa comunicação com o público da Parada Gay. Cada uma de nós tem personalidade distinta, a união dá certo, tem brigas também, mas o saldo é sempre positivo”, brinca Carol.

Repertório. Músicas como “Mas Que Nada” (Jorge Ben Jor), “Meu Sangue Ferve Por Você” (Sidney Magal) e a quase irreverente “Smells Like Teen Spirit” (Nirvana) em clima bossa-nova ressaltam o universo de contradições de DVD tão saboroso quanto enxuto, com dez faixas que alentam a boca pela promessa de logo vir mais por aí, pois o assunto ali renovado é também permanente. “Os dramas de amor são universais, não é à toa que todo mundo sabe cantar ‘Taí’”, define Renata, em referência à marchinha composta por Joubert de Carvalho em 1930, lançada por Carmen Miranda. De volta ao começo dessa canção infinita e circular. “Nossa ideia é trazer alegria, leveza, felicidade. Fazer o povo dançar, cantar e respirar nesse momento difícil”, sugere Renata. Então, divirtam-se.