Aproximar as distâncias, pois, na origem, elas estiveram juntas. Assim como na Pangeia (união de todos os continentes na era Paleozoica), Luis Arnaldo e Marcelino Peixoto partem para construir um mundo novo tendo consciência da premissa do trabalho braçal em atividades, à primeira vista, inconciliáveis: as artes plásticas e a construção civil. “Projeto Ação Para Erguer Colinas”, que a dupla de artistas apresenta de hoje até 31 de agosto na Funarte, foi vencedora do Prêmio de Arte Contemporânea, promovido pelo espaço em 2015.

Arnaldo e Peixoto começam neste sábado (15) os trabalhos. “A partir das 6h, vamos transportar areia do pátio central até o interior do Galpão 5, onde daremos início a outra etapa. Essa primeira ação nós chamamos de ‘Erguer Colinas’, e consiste, também, nesse esforço físico da nossa parte”, explica Peixoto, que alia outra informação preponderante à concepção do projeto: a busca por profissionais da construção civil para participarem, efetivamente, desta criação.

“Além de explicitar o trabalho e o acontecimento como algo sensível e palpável, pretendemos repensar as estratégias de mediação das artes visuais, para que elas se desprendam do caráter meramente educativo e academicista e passe a propor a partilha e a troca, convidando as pessoas a se tornarem atores”, afere o entrevistado.

Transformar. O convite aos profissionais da construção civil tem como meta provocar uma mudança no espaço. “Como pesquisadores, queremos nos aproximar dessas dinâmicas de construção e de transformação, a exemplo das ocupações e de todas as arquiteturas estabelecidas, desde prédios projetados a pessoas que constroem suas moradias debaixo da ponte”, conceitua Arnaldo.

A segunda etapa da atividade, denominada “Exílio”, acontece já dentro do espaço interno, onde os artistas, usando projeções de colinas que ainda serão formadas, desenham sobre elas nas paredes da galeria. “O desenho é outro lugar do pensamento que queremos explorar. Ele é sempre preparatório para a escultura, a pintura, e outras formas clássicas de arte visual, o que guarda uma intrínseca dimensão estética”, explica Peixoto. No entanto, como toda forma de arte ultrapassa a condição exposta, há mais segredos guardados na movimentação da dupla.

“Ao desenhar diante de uma imagem dentro de um absoluto silêncio, a gente almeja unir a fauna deste mundo urbano a um lugar longínquo, de recolhimento, em que o estar ali será bastante e repleto. É a instância do lugar da fala, onde a gente convida o público a desacelerar, coabitar conosco um tempo de distanciamento, contra o frenesi atual do contemporâneo, justamente para pensá-lo de uma outra maneira”, sublinha Peixoto.

Coletivo. Nada no batismo da empreitada nasceu por acaso. Como fundamenta Peixoto, a estrutura da obra está objetivamente ligada aos conceitos propostos originalmente. “Tudo que é estética envolve, naturalmente, política. No sentido que a ideia de projeto, para nós, tem a ver com as estratégias de estar no mundo, a partir do ponto de vista que não se consegue realizar um sonho sozinho, ele deve ser coletivo”, sustenta Arnaldo.

Outro ponto importante para a dupla é problematizar o papel da performance e da instalação na sociedade contemporânea. “Quando essas intervenções assimilam certa institucionalização e diplomacia, elas tendem a perder a potência contida em seus impulsos originais, tornando-as inócuas diante dos problemas apresentados no mundo de hoje”, diagnostica Peixoto.

Arnaldo complementa a funcionalidade desta percepção. “Queremos abrir possibilidades de reposicionamento. Quando você se reposiciona em relação ao espaço, o seu corpo, concomitantemente, passa a ser compreendido e, portanto, compreender de outras formas. No fundo, ao estender horizontes a ideia central é a da possibilidade e e da liberdade”, acentua.

 

AGENDA

O quê. “Projeto Ação Para Erguer Colinas”, de Luis Arnaldo e Marcelino Peixoto (Coletivo Xepa)
Quando. 16/7 a 31/8, quarta a domingo, das 14h às 22h
Onde. Funarte - Galpão 5 (rua Januária, 68, Centro)
Quanto. Gratuito