Muito criticado por fazer um drama histórico com tom de folhetim, o cineasta Zeca Brito defende que sua intenção, em “Legalidade”, era justamente essa. “Queria que fosse um filme brasileiro, com a linguagem dessa cultura de massa também, que vem da teledramaturgia”, explica Brito. “Pensamos muito em como fazer essa operação de signos, como trazer esses elementos para deixar o filme acessível”, fala o diretor. 

Em “Legalidade”, Brito usa um riquíssimo arquivo histórico para contar o movimento (pouco) conhecido como Legalidade e liderado por Leonel Brizola (1922-2004) no Rio Grande do Sul, em 1961, pouco antes da ditadura militar no Brasil. Para tratar desse episódio – que não consta dos livros de História –, Brito usa discursos reais de Brizola na época e eventos verídicos entremeados com fatos fictícios de apelo bem popular.

Na trama, a jornalista Cecília, papel de Cleo (ex-Pires), vive nos Estados Unidos e trabalha para um jornal americano que quer fazer um perfil de Brizola (Leonardo Machado). Para isso, ela se infiltra no gabinete do então governador do Rio Grande do Sul e acaba se envolvendo com dois homens: o antropólogo Luís Carlos (Fernando Alves Pinto) e o fotógrafo Tonho (José Henrique Ligabue).

Enquanto o espectador acompanha o triângulo amoroso – com cenas dignas de novela das 23h –, ele também vê a opressão a qual Brizola foi submetido enquanto exigia que João Goulart (1919-1976) assumisse a presidência da República após a renúncia de Jânio Quadros (1917 - 1992). No entanto, os militares já estavam se mobilizando para assumir o poder, e os discursos de Brizola eram um risco para o quadro que se desenhava no Brasil. 

As falas de Brizola, na boca de Machado, são potentes. O político defende, nos discursos escolhidos para o filme, a manutenção dos direitos humanos, das estatais, o fim da censura, a independência econômica frente aos EUA... Não à toa, o político foi espionado pelo governo americano. 

O filme, na maior parte do tempo, se passa em 1961, mas há trechos em 2004, ano da morte de Brizola. Letícia Sabatella interpreta a filha de Cecília, que busca informações sobre os pais. “Letícia está lá para contar o que aconteceu no país depois da Legalidade, pois tudo o que o movimento falou que aconteceria, de fato, aconteceu”, fala Brito. “E Letícia e Cleo trazem também essa referência mais popular para o público em geral”, diz. 

Para o ator Fernando Alves Pinto, é importante que o filme alcance o público e provoque uma reflexão. “É cada vez mais importante falar de política, e o filme deixa claro que nem tudo lá é ficção. Espero que as pessoas vejam isso”, defende o ator, que se inspirou em pessoas como o antropólogo Darcy Ribeiro para compor seu personagem, um homem idealista e romântico. 

Póstumo

Leonardo Machado morreu em setembro de 2018, aos 42 anos, vítima de câncer. Por “Legalidade”, ganhou prêmio de melhor ator no Festival de Gramado deste ano.