Se o Brasil está formando uma geração de atores de cinema, certamente Leonardo Medeiros é um de seus principais nomes. Protagonista do filme "O Veneno da Madrugada", de Ruy Guerra, que estréia em Belo Horizonte dia 17 ", o ator já se destacou em várias outras produções.

Por seu trabalho em "Lavoura Arcaica", de Luiz Fernando Carvalho, recebeu o Candango de melhor ator coadjuvante no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2001. No mesmo festival, em 2004, foi considerado o melhor ator ao interpretar o revolucionário Tiago de "Cabra-Cega", longa dirigido por Toni Venturi.

"Gosto dos personagens que apresentam dificuldades, que tragam uma possibilidade de surpreender. Na verdade, estamos vivendo na era do império televisivo, onde tudo é muito fácil, simples, feito na hora. Sem demérito nenhum, na TV tudo é muito rápido e, querendo ou não, essa é a única referência que temos no Brasil. Mas eu gosto de compor os personagens, propor surpresas para escapar desse simplismo", afirmou o ator pelo telefone, da cidade mineira de Sacramento, terra de sua família materna, onde descansava na semana passada.

Mesmo procurando personagens mais desafiadores, os convites para trabalhar na TV surgem o tempo todo. O último veio para atuar na minissérie "JK", de Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira, mas Leonardo estava se dedicando à arte em que mais se sente à vontade: o cinema.

"Estava filmando "Nossa Vida não Vale um Chevrolet", baseada numa peça do Mário Bortolotto sobre uma família de ladrões de carro. É a primeira direção do Reinaldo Pinheiro e a filmagem foi muito boa, fiz um personagem bem paulistano, da zona Leste, com uma sonoridade conhecida do paulistano", conta.

Leonardo acredita que a TV não permite um trabalho aprofundado por parte do ator, mas já se rendeu duas vezes à Globo, atuando nas minisséries "A Muralha" (como Leonel) e "Os Maias" (o Taveira), ambas de Maria Adelaide Amaral.

"Numa minissérie, o ator sempre acha que vai ter uma coisa diferente, que vai poder se aprofundar mais. Porém isso é uma meia verdade. Mesmo na minissérie, há um massacre em cima dos atores. O trabalho é rápido e volumoso. Fui chamado muitas vezes para fazer TV, mas existe um clima de desvalorização generalizado. Pagam pouco, oferecem personagens ruins. Aceitei esses dois convites porque me traziam personagens mais elaborados, principalmente em "A Muralha"".

Belo Horizonte
Leonardo não pára de filmar. Neste mês, o ator vem a Belo Horizonte participar de um dos episódios do longa "Cinco Frações de uma Quase História", que está sendo produzido pela Camisa Listrada e será dirigido por por seis diretores " Armando Mendes, Cristiano Abud, Cristiano Azzi, Guilherme Fiuza, Tales Bahia e Lucas Gontijo.

No episódio dirigido por Abud (que também é roteirista do longa), com duração de aproximadamente 15 minutos, Leonardo viverá um fotógrafo cheio de obsessões sobre os temas que desenvolve para suas exposições.

Num determinado momento, ele fica obcecado por pés e sai numa busca desenfreada por modelos femininos. Mas sempre surge algo que muda seu foco de fixação. As filmagens começam no dia 27 deste mês.

O ator sabe porque sempre os convites chegam às suas mãos de todas as partes do país: "Os diretores com quem trabalho ficam surpresos comigo porque eu conheço o cinema. Sei montar, conheço câmeras e lentes. Me relaciono muito bem com a parte técnica e, com isso, facilito bastante o trabalho no set. Sei qual é o posicionamento, entendo de continuidade. Assim, não se queima filme, não se gasta película, que é a responsável pela parte mais cara do orçamento. Se o ator sabe onde está posicionado e compreende de iluminação, facilita tudo", diz.

Além dessa curiosidade sobre todos os detalhes que constroem um filme, tem mais um motivo que empurra Leonardo para o set cinematográfico: o desinteresse pelo teatro realizado hoje no Brasil.

Isso não quer dizer que ele não se interesse pelo palco. Sua formação nas artes cênicas é bastante sólida " estudou teatro na Universidade de São Paulo e na Associação de Teatro Britânica, em Londres. Foi dirigido por diretores de peso, como José Celso Martinez Corrêa. Mas existem fatores que o fazem pensar duas vezes antes de embarcar num projeto.

"Está difícil fazer teatro porque os diretores estão muito ruins, ele não tem muito a dizer. São produções precárias, pequenas, é difícil desenvolver um trabalho satisfatório. Além disso, ficar em cartaz por muitos meses é uma depressão", dispara o ator, que abre uma exceção à Companhia Sutil, com a qual trabalha anualmente.

"O Felipe Hirsch é um dos diretores com quem ainda vale a pena trabalhar, pois tem uma trajetória de teatro denso, de pesquisa e com propósito", diz. Leonardo se incomoda até mesmo com os espetáculos montados pelos diretores mais prestigiados de São Paulo.

"Zé Celso, Antunes Filho e Gerald Thomas foram grandes gênios do teatro, fizeram montagens espetaculares. Mas perderam a mão em algum momento e agora estão patinando", alfineta.