Pedro tem 12 anos e não gosta de ler. Com a mesma idade, Marcelo diz que frequenta os livros porque foi incentivado pelo pai, leitor assíduo. Com Yasmin, de 17 anos, o maior inimigo da leitura é o celular.

Incutir o hábito de leitura entre adolescentes é um desafio vivenciado por famílias e escolas. Os tempos atuais, de rotina acelerada associada à distração das redes sociais, apresentam obstáculos ainda mais penosos. Convencer os jovens a abrir um livro muitas vezes parece missão impossível.

Uma conversa aberta com os adolescentes pode entregar pistas. Pedro, por exemplo, acha ler algo chato. “Demora muito. Prefiro filme, que é mais rápido”, diz. Opiniões semelhantes não são raras entre adolescentes. A reportagem de O TEMPO ouviu de vários alunos que eles preferem jogar videogame e assistir a seriados a mergulhar em uma narrativa escrita.

Outros adolescentes, no entanto, alimentam o hábito da leitura com publicações sobre temas mais próximos de suas preferências. Ver pais e irmãos lendo também serve de incentivo. “Meus amigos se prendem mais à internet”, explica Júlia Colombo. Aos 13 anos, a menina diz que gosta de ler histórias sobre drama, romance e aventura. Ana Carolina, de 17 anos, consegue desligar o telefone celular para se concentrar durante a leitura de um livro.

Entre os motivos que formam esse bloqueio com a prática da leitura em algumas pessoas, um deles pode ser certo exibicionismo incentivado pela internet, conforme aponta a pesquisadora Fabíola Farias. “O que a gente vive hoje é um esvaziamento do tempo reflexivo”, explica. 

Segundo ela, a estimulação constante para que as pessoas se mostrem a todo tempo acaba comprometendo a imersão em histórias escritas. “É uma exposição ininterrupta da vida, e isso se confunde com o tempo da leitura”, avalia a pesquisadora.

Vários autores, no entanto, estão usando a internet a favor da leitura. Uma delas é a mineira Paula Pimenta, que espelha a linguagem dinâmica das redes sociais em suas histórias. 

Os livros da autora, sucesso estrondoso de vendas, apresentam ao jovem cenários e diálogos que replicam os códigos da molecada. Certo dia, um pai a perguntou sobre como ela havia conseguido tirar a filha dele da internet. “Eu disse que trouxe a internet para o livro”, responde. Em suas narrativas, ela reproduz diálogos feitos por mensagens de celular. “Eles leem como se fosse a história de uma amiga. Isso gera identificação”, diz.

Para manter essa proximidade com os leitores, Paula fica atenta nas redes sociais buscando o que os jovens estão falando, ouvindo e vestindo. “Só no TikTok que eu ainda não consegui me inserir. Acho que fiquei velha”, brinca a autora.

Aluna do terceiro ano do ensino médio, Ana Carolina tomou gosto pelo universo da leitura após ver sua irmã, formada em letras, sempre dedicada aos livros. “Devo isso a ela”, afirma. 

Tornar o livro um objeto constante em casa pode ajudar a incutir hábitos de leitura nos jovens. “Convide seu filho para ler com você, pergunte o que ele está achando”, sugere Fabíola, que alerta aos pais que evitem cobranças insistentes. Inserir na agenda atividades culturais, como visita a biblioteca, museus e centros culturais, também pode incentivá-los a abrir a janela para a literatura.

A desigualdade social brasileira, que impede que a maioria das famílias tenham condições de comprar livros, é mais um asteroide no meio desse caminho. Mas isso é assunto para outra reportagem.

 

“O poder do livro está sendo relegado”, diz editora

O derretimento da concentração é uma força tão potente que afeta até mesmo quem foi criado em ambiente propício à leitura. Com Miguel Cunha, aluno do 9º ano, tem acontecido isso. O pai o incentivava a ler quando o filho era mais jovem, mas nos últimos anos o ritmo de leitura foi decaindo. “Tem muito mais coisas para se distrair em casa, como computador e Playstation”, diz.

Dar ao livro um papel de centralidade durante o desenvolvimento das crianças é uma estratégia levantada por Mazza Rodrigues, editora com seis décadas de experiência. “Precisamos tomar cuidado quando um menininho diz que não gosta de ler, que prefere a televisão. O livro é uma arma poderosa”, argumenta. Mazza não tem dúvidas de que o poder do livro enquanto agente transformador está sendo relegado no Brasil.

Mas será que a escola está compreendendo o que o jovem quer ler? A pergunta é provocada por Fabíola, que percebe a escola avessa a apresentar aos estudantes livros sobre temas que estão em ebulição na cabeça dos meninos e meninas. “Vemos nas escolas adolescentes em conflito com a sexualidade e sem espaço para pensar sobre isso. Tem a questão do machismo e questões raciais minimizadas. Os alunos (estão) sem ler autores e narrativas que façam esse exercício”, alega.

A formação dentro de sala de aula é outro eixo questionado por especialistas em leitura. “Acho que tem que ler mais na escola. Os professores recomendam ler em casa, mas os alunos não leem. Se ler é tão importante, que tal lermos durante o tempo da aula?”, recomenda Fabíola. Para ela, só se forma leitores trazendo o livro para dentro da sala de aula ou nas bibliotecas. A pesquisadora também propõe que seja repensada a transmissão da história da literatura na escola. “Muitas vezes não faz sentido da forma como é oferecida”, avalia.

 

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