Lançada em julho de 2019 na plataforma de streaming Globoplay, a série “Aruanas” retrata a luta de ativistas ambientais pela preservação amazônica. Embora reflita questões que se tornaram crônicas, à época de sua estreia, a produção coincidiu com um momento no qual a preservação da Amazônia brasileira atraia a atenção mundo afora em função de fenômenos como o recorde de queimadas por lá registradas.
Agora na TV aberta, mais precisamente nas noites de terça-feira, na Globo, a série coincide com o advento da pandemia do novo coronavírus. Hoje, ainda que a destruição de áreas preservadas siga sendo denunciada diariamente e o combate do desmatamento ilegal pareça cada vez mais dificultado, as atenções se voltam, prioritariamente, para a proliferação do novo coronavírus e as suas consequências sociais e econômicas.
Mesmo que pareçam diversos, porém, os assuntos estão, sim, correlacionados. “A crise que vivemos agora tem muito a ver com esses exageros de consumo, com o modo como levamos a vida há um tempo”, denuncia Débora Falabella, que vive a jornalista e ativista Natalie na produção global.
Os apontamentos da mineira refletem a sua atenção à mesma causa que é tão cara à sua personagem. E é fato: muitos pesquisadores entendem que a destruição de biomas e a diminuição de populações de espécies selvagens podem estar por trás do surgimento de doenças.
“Devemos voltar sempre a essas questões (ambientais). A gente precisa estar conectado com a Terra de alguma maneira, o que não estava acontecendo nas últimas décadas”, argumenta.
Experiência transformadora
Débora conta que já há muito tempo adotou atitudes como cuidar do lixo que produz, além de estar antenada a novas práticas que possam ser encampadas. Mas a participação na série potencializou tais entendimentos.
“Não consigo mais me desvincular dessas questões. Com a série, conheci muitas pessoas do Greenpeace, jornalistas ambientais... A experiência ampliou a minha consciência nesse sentido”, reconhece.
Agora, ela deseja repassar essa mensagem ao público. “Se a série despertar o interesse de mais pessoas para essa questão, pode ser muito potente”, diz, lembrando que, o período de recolhimento pode possibilitar que o conteúdo alcance um público maior. “Na verdade, eu tinha esse desejo de que a série chegasse à TV aberta”.
Ambientalismo 'não é uma questão política controversa'
A atriz também ressalta o fato de a trama humanizar os ambientalistas e suas organizações, que sempre são alvos de ataques. “O Brasil é o país que mais mata ativistas. Acredito que é, sim, muito importante jogar uma luz sobre o ativismo, mostrar que é feito de pessoas reais, que têm convicções, que estão lutando por um bem maior, por algo que tem a ver com mais pessoas”, assegura. E arremata: “Defender o meio ambiente é defender a nossa sobrevivência. Quem é contra isso é contra a vida. Não é uma questão política controversa”
Ela ainda lembra que, no episódio que foi ao ar nesta terça-feira (5), Natalie vai até a sala do diretor da emissora em que ela trabalhava e faz uma defesa do papel do jornalismo na sociedade.
Coincidentemente, lembra, naquele mesmo dia profissionais da imprensa se manifestaram dizendo que não iriam se calar - uma reação a ataques do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), que mais tarde se desculpou. “Espero que a força da personagem gere uma reflexão no público”, pontua, defendendo a importância do fazer jornalístico.
Intensidade amazônica
Em “Aruanas”, Débora divide o protagonismo com Leandra Leal, que vive a ativista Luiza, e com Taís Araujo, como a advogada Verônica. Junta-se a elas Thainá Duarte, que interpreta Clara, estagiária que integra a equipe da Aruana, organização não governamental (ONG) referência em ambientalismo investigativo.
Relembrando o processo de gravação, Débora avalia que o fato de as filmagens terem começado na Amazônia foi imprescindível para que o elenco pudesse pensar a narrativa que queria contar.
Para compor suas personagens, as atrizes passaram por um treinamento com o Greenpeace, gravaram em meio à floresta e conheceram territórios indígenas. Para ela, inclusive, uma das cenas mais marcantes foi a encenação de um massacre em uma aldeia. “Foi impactante, mexeu muito com a minha cabeça”, comenta.
A selva amazônica tornou-se tão presente na vida dela que, depois das filmagens, voltou ao lugar, levando sua filha, Nina. “Estou passando isso de uma forma muito forte para ela, que já tem uma consciência que eu, na idade dela, não tinha”, entende.
Ativismos
Mesmo engajada na defesa do planeta, Débora faz questão que os louros sejam dados a quem está na linha de frente da batalha, frisando ser mais atuante na militância das artes. Aliás, com o distanciamento social, a atriz acalenta a esperança de que o público se dê conta que o fazer artístico é, também, um instrumento de conforto para momentos difíceis.
Ao mesmo tempo, ela denota preocupação com o futuro que se delineia. “Possivelmente, vamos (a classe artística) ser os últimos a voltar ao trabalho, e são muitas pessoas que dependem dos teatros, dos concertos, dos musicais… Essas apresentações geram muitos empregos – como técnicos, camareiras, costureiras”, situa, sempre lembrando que defende a adoção das medidas preconizadas pelas autoridades sanitárias.
“Nós temos essa preocupação de como vai ser. Não vai ter como voltar logo para um teatro com capacidade para 300 pessoas…Talvez as pessoas saiam até mais ávidas para ir ao teatro, mas não sabemos”, pontua, que fundou, em 2005, ao lado de Gabriel Paiva e Yara de Novaes, o Grupo 3 de Teatro.
Túnel do tempo
Uma curiosidade é que há pouco Débora Falabella chegou a estar no ar simultaneamente em três produções em exibição na grade da Globo – além de “Aruanas”, as reprises de “Avenida Brasil” (2012) e “O Clone” (2001).
“Foi como entrar em um túnel do tempo”, compara. “É curioso que essas foram novelas muito marcantes para o público, que me fizeram ficar mais conhecida, e as duas estavam passando no mesmo momento”, diverte-se, lembrando que as produções estão separadas por uma década inteira.
“Rever ‘Avenida Brasil’, agora como espectadora, foi um deleite”, completa, sobre a trama que bateu recordes de audiência e teve seu último capítulo exibido na última sexta-feira, dia 1º de maio.
Em tempo: as gravações da segunda temporada de “Aruanas” aconteceriam este ano, mas foram suspensas devido às medidas sanitárias adotadas no enfrentamento à pandemia. “A gente tinha ficado um mês e meio fazendo preparação, mas, com uma semana de gravação, tivemos que parar”, conta a atriz, conformada.
Atriz faz sucesso com websérie
Enquanto salas de teatro e cinema e outros espaços culturais seguem interditados em função da pandemia da Covid-19, iniciativas fazem, das redes sociais, palco de produções artísticas. Caso da websérie "Diário de uma quarentena", que já soma mais de 4 milhões de visualizações. Nela, Débora leva para o Facebook e para o Instagram a personagem Dani, que interpreta no filme “Depois a louca sou eu”. A comédia de Julia Rezende ia estrear nos cinemas em abril, mas foi adiada por causa da situação de emergência de saúde.