Orgasmo

O prazer feminino, território até hoje pouco conhecido

Pesquisa recente apontou que algumas posições adotadas durante a relação podem influenciar na obtenção do êxtase

Por Da Redação
Publicado em 12 de agosto de 2022 | 03:00
 
 
A força exercida pelo contato do clitóris da mulher com a pele do parceiro foi mais intensa quando ela estava por cima, apontou estudo Foto: Pixabay

Publicado na edição de julho da revista cientifícia “Sexologies”, da Federação Europeia de Sexologia, o artigo “Coital positions and clitoral blood flow: A biomechanical and sonographic analysis” (Posições sexuais e fluxo sanguíneo clitoriano: uma análise biomecânica e ultrassonográfica, em tradução livre) comenta alguns dos resultados de um estudo conduzido pelos médicos Kimberly Lovie e Amir Marashi, do Departamento de Imagens Médicas da clínica New H Medical, de Nova York. 

A pesquisa avaliava de que forma a posição dos parceiros no ato sexual pode interferir no clímax feminino, identificando, por exemplo, como a parte biomecânica do corpo e as forças empregadas (tanto pelo casal quanto pela gravidade) agem. 

Por meio de ultrassons, os pesquisadores testaram cinco posições descritas na literatura médica e descreveram a mudança do fluxo sanguíneo no clitóris antes e depois do ato sexual. A mulher por cima do homem, cara a cara com o parceiro e o casal sentado, também de frente um para o outro, foram as que mais intensificaram o fluxo de sangue no órgão erétil do aparelho feminino.

Contudo, a força exercida pelo contato do clitóris da mulher com a pele do parceiro foi mais intensa quando ela estava por cima, o que resultou em orgasmos mais poderosos.

De pronto, a iniciativa se sobressai por ter como alvo a anatomia de um público que nem sempre esteve no foco de pesquisas voltadas para o seu prazer: o feminino. “É um avanço, sim”, entende Adriana Sad, ginecologista, obstetra e sexóloga, à frente do projeto Mulheres. Ser. Na verdade, ela pontua que essa iniciativa insere-se no bojo de outras várias ramificações do trabalho empreendido pela urologista e cirurgiã australiana Helen O’Connell. “Foi ela que destrinchou toda a anatomia do clitóris, a partir de uma percepção prévia de que havia alguma coisa errada nas imagens presentes nos livros de anatomia que mostravam a do pênis, a da vagina e, principalmente, a do clitóris. Percebeu que tinha muita coisa faltando”. 
Adriana inclusive enfatiza o quão recente é essa descoberta. “A publicação aconteceu  em 1998, ou seja, praticamente no século 21. Aliás, em uma entrevista, um repórter perguntou a ela porque tanta demora para se descobrir sobre a anatomia do prazer feminino? Ora, porque ainda é um tabu! Nas famílias, não se fala abertamente sobre o sexo. Os homens até falam, mas, na maioria das vezes, na minha opinião, de uma maneira machista, grotesca. Não fala com a sensibilidade de uma relação afetiva, íntima”, entende a sexóloga.

Autoconhecimento. No entanto, apesar de comemorar a existência de mais estudos voltados ao prazer feminino, Adriana Sad lembra que o resultado da pesquisa citada no início desta matéria já de pronto parece excluir uma população que tem restrições físicas de mobilidade, como a paralisia. “Na verdade, o prazer é muito mais que condições biodinâmicas, mecânicas, hormonais. O corpo físico como um todo é uma coisa exuberante”, advoga.

E um aspecto que ela coloca em relevo é a importância de a pessoa explorar o próprio corpo. “Nos dias atuais, ainda recebo mulheres de todas as idades, jovens e mais velhas, que nunca se tocaram, se masturbaram. Então, o prazer, para a mulher ainda é um grande tabu. E, pela minha experiência clínica, esse prazer, para elas, tem vários condicionamentos, como a cobrança de estar envolvida em uma relação. Acho que não é bem por aí. A mulher tem o direito de sentir prazer como quiser: sozinha, com um parceiro, com mais de um, em relações homoafetivas, gêneros fluidos...”, exemplifica. 

A dificuldade em lidar com o tema prazer por parte das mulheres, prossegue ela, é uma das questões tratadas em “Boa Sorte, Leo Grande”, longa-metragem em cartaz na cidade. O filme de Sophie Hide traz a atriz britânica Emma Thompson, 63, na pele de Nancy Stokes, uma viúva aposentada que contrata um jovem garoto de programa, Leo Grande (Daryl McCormack), para vivenciar uma noite de possível prazer depois de uma vida sem-graça de casada.

“A personagem é uma mulher de meia-idade que nunca experimentou o prazer, e no tempo que passa com o rapaz, ela vai desconstruir a torre de preconceitos que ergueu à sua volta. Mas, na verdade, não foi ela que construiu essa torre, e sim a sociedade”, entende.

A necessidade de a mulher se conhecer anatomicamente com a pratica da masturbação, prossegue a sexóloga, deveria ser mais incentivada na sociedade. “A gente tem o clitóris como principal via para se obter o orgasmo, mas há outras áreas do corpo que levam à excitação. De todo jeito, é preciso saber a que o seu corpo responde bem, a força do toque... Então, o que recomendo é isso, que a pessoa se conheça, e, para tal, ela não precisa recorrer à pornografia. Uma frase que já ouvi e com a qual concordo é que o orgasmo é muito individual, mesmo que a pessoa esteja com outra a seu lado, não importa de qual sexo. Ele é individual, egoísta”, encerra. (PC)
* ( com Danielle Castro/Folhapress)