Regulação

Cientistas querem limitar a edição do genoma humano

Grupo de especialistas defende a suspensão de técnicas que alteram geneticamente os bebês

Por Da Redação
Publicado em 15 de março de 2019 | 03:00
 
 
A edição de DNA traz esperança de cura para doenças hoje não tratáveis, mas seus riscos ainda são desconhecidos Foto: Gerd Altmann/divulgação

Um grupo de especialistas pediu uma moratória (suspensão temporária) das técnicas de modificação do genoma, alvo de intensos debates éticos, a fim de evitar o nascimento de novos bebês geneticamente modificados, após o escândalo provocado por um pesquisador chinês.

“Instamos a uma moratória mundial dos usos clínicos de edição do genoma humano com um fim reprodutivo, ou seja, das mudanças no DNA do esperma, dos óvulos ou do embrião para criar bebês geneticamente modificados”, escreveram 18 pesquisadores de sete países na revista “Nature”.

“A introdução de modificações genéticas (transmissíveis de uma geração a outra) poderia ter consequências permanentes e potencialmente nefastas para a espécie humana”, alertaram.

Em novembro do ano passado, o chinês He Jiankui afirmou ter alterado o DNA de duas gêmeas para que fossem resistentes ao vírus da Aids, reivindicando ter concebido os primeiros bebês geneticamente modificados. Entre os signatários do chamado está a francesa Emmanuelle Charpentier, uma das descobridoras da técnica revolucionária Crispr-Cas9, utilizada por He Jiankui.

“Moratória não significa proibição permanente”, ressaltou o texto, assinado também por especialistas de renome no assunto, como Eric Lander, presidente do Broad Institute do MIT e Harvard, Françoise Baylis, professora da Universidade de Dalhousie em Halifax (Canadá), e Paul Berg, bioquímico e professor emérito da Universidade de Stanford da Califórnia.

Os cientistas defendem a instauração de “um marco internacional no qual as nações, ao mesmo tempo em que se reservam o direito de tomar suas decisões, se comprometeriam voluntariamente a aprovar o uso clínico dessas técnicas apenas sob certas condições”.

Essa moratória não se aplicaria à edição genética realizada em um âmbito de pesquisa, cuja finalidade não é o nascimento de um bebê. O texto distingue “melhora genética” – que busca produzir humanos mais resistentes às doenças, mais fortes, mais inteligentes e até com capacidades novas – de “correção genética”, que permite evitar uma doença causada por um gene determinado. “Qualquer melhora genética seria injustificável atualmente”, devido ao pouco conhecimento disponível sobre suas consequências.

Durante a primeira Cúpula Internacional sobre Edição de Genes Humanos, em dezembro de 2015, foi feita a seguinte declaração a respeito da questão: “Seria irresponsável proceder a qualquer uso clínico… a menos que e até que as questões relevantes de segurança e eficácia fossem resolvidas… e houvesse amplo consenso da sociedade sobre adequação do pedido proposto”. “Isso deveria ter sido entendido no sentido de que os usos clínicos da edição germinal ainda não deveriam ocorrer em qualquer parte do mundo. No entanto, eventos subsequentes sugerem que essa afirmação foi inadequada”.

Mediadora. Os pesquisadores propõem também que a Organização Mundial da Saúde (OMS) seja a instituição central a mediar os debates. Para isso, poderá criar comitês.

‘Marco internacional’ é meta

De acordo com o documento publicado pelos cientistas, os países deveriam se comprometer a não permitir nenhuma modificação genética realizada com fins de reprodução durante cinco anos, período que serviria para organizar debates “científicos e éticos” e estabelecer um “marco internacional”.

Passado esse tempo, um país poderia autorizar o uso dessas técnicas, mas apenas com fins muito concretos, como quando é a única forma de evitar uma doença genética. Deveriam ser cumpridos certos requisitos, como o respeito de um prazo suplementar de dois anos entre o anúncio e o início do processo para permitir o debate.