Opinião

A dificuldade do Brasil em tratar as doenças raras

Medicina diagnóstica já permite evitar enfermidades

Por Susana Joya* e Arthur Arenas Périco**
Publicado em 25 de julho de 2023 | 07:00
 
 
Ilustração/O Tempo

Susana Joya* e Arthur Arenas Périco**

Juntas não são raras. Se somarmos, são cerca de 13 milhões de brasileiros com diagnóstico de mais de 7.000 doenças raras. O desafio é a pessoa descobrir a doença, e cedo. Um paciente leva em média quatro anos para obter um diagnóstico. A investigação começa pelos testes do pezinho e bochechinha, que são de triagem neonatal, cujo objetivo é triar doenças genéticas que podem ser tratadas precocemente. O teste da bochechinha é capaz de detectar variantes associadas a mais de 350 doenças genéticas tratáveis. Já o teste do pezinho é uma triagem para seis doenças. Em 2022, foi anunciado que o SUS incluirá, em até cinco anos, o teste do pezinho ampliado para detectar até 50 doenças.

Muitos médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde têm pouco conhecimento sobre doenças raras e não estão familiarizados com os sinais e sintomas. Se eles não identificam as características da doença no indivíduo, não vão encaminhá-lo para um serviço de genética para se investigar possíveis alterações cromossômicas ou genéticas. Com uma política de saúde voltada para as doenças raras, é possível ampliar o acesso, com melhor formação dos médicos e demais especialistas envolvidos no cuidado multidisciplinar e na ampliação do acesso aos testes genéticos. 

Aconselhamento genético

Em meio ao avanço da medicina diagnóstica, em especial nas duas últimas décadas, se destaca a importância do aconselhamento genético, seguido da reprodução assistida. É possível evitar uma doença rara, desde que se conheça a variante genética ou a alteração cromossômica envolvida. Oito entre dez famílias descobrem apenas após o nascimento do bebê com uma doença rara que eles poderiam ter evitado a transmissão da condição aos seus filhos. 

O risco de uma doença rara costuma ser conhecido na família apenas quando há casos anteriores de parentes acometidos. Nesses casos, recomendamos que, antes de engravidar, o casal realize um aconselhamento genético para avaliar a probabilidade de nascimento de um bebê acometido por uma condição grave, além de conhecer os mecanismos para prevenir a manifestação de doenças.

Poderá ser indicada a realização do painel genético CGT antes da gravidez. Também conhecido como teste de compatibilidade genética, ele compara o DNA dos futuros pais para avaliar a probabilidade de doenças hereditárias. É um teste que precisa estar atrelado ao aconselhamento genético. Quando identificado o risco aumentado para alguma doença de origem genética, é papel do aconselhador genético expor todas as opções reprodutivas disponíveis para o casal e fornecer a eles informações a respeito de probabilidades e riscos para uma tomada de decisão consciente, pois há o risco de transmissão da condição para o bebê. 

Cabe ao conselheiro genético informar a pessoa acometida e sua família sobre os diferentes aspectos da doença; informar sobre o tipo de hereditariedade da doença, os exames que devem/podem ser realizados, fontes de informação e pesquisas relevantes para o acometido e seus familiares; orientar sobre a possibilidade de herança da doença em futuros filhos; coletar, interpretar e analisar resultados de exames e histórico médico familiar e ajudar a compreender as implicações médicas, psicológicas, sociais e familiares da doença.

Em tempo, as poucas opções de tratamento que existem para pacientes com doenças raras são muito caras ou não estão disponíveis no país, o que pode levar à interrupção do tratamento e a uma piora na condição clínica. Por fim, não chega a 20 o total de serviços especializados em doenças raras no Brasil e estão concentrados em 12 Estados.

(*) Bióloga, mestre em genética e assessora científica da Igenomix Brasil

(**) Médico, membro da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica e residente em genética médica no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP