No Brasil, existe um termo que denomina pessoas invisíveis, aquelas que não têm documentos ou qualquer tipo de registro ou que se encontram em situação de vulnerabilidade social e econômica. No entanto, há outra parcela de “invisíveis” na sociedade: os 18,6 milhões de pessoas que vivem com algum tipo de deficiência, de acordo o IBGE. Eles representam quase 10% da população e enfrentam diariamente uma série de barreiras que limitam o pleno acesso deles a vários lugares, principalmente aos espaços públicos.

As dificuldades de acessibilidade das pessoas com deficiência física vão desde a falta de rampas em calçadas até a exclusão de torcedores nos estádios de futebol. Essa realidade coloca em evidência a discrepância entre o que a legislação prevê e o que efetivamente os estádios oferecem na prática. Poucos estão realmente capacitados para atendê-los, mesmo com exigência legal.

A legislação brasileira dispõe de normas claras de acessibilidade nos estádios, visando garantir que todos os cidadãos possam desfrutar dos espaços públicos, incluindo os estádios. A norma ABNT NBR 9.050 estabelece diretrizes específicas para a acessibilidade em edificações e espaços urbanos, incluindo critérios para estacionamentos, corredores e espaços destinados a pessoas com deficiência.

No entanto, apesar da existência de leis e normas bem-definidas, a realidade é muito diferente. Recentemente, o torcedor mineiro Hélio de Abreu, tetraplégico, enfrentou sérias dificuldades de acesso para assistir a uma partida do Cruzeiro Esporte Clube no estádio Independência, em Belo Horizonte, chegando a passar mal e ser socorrido pelos bombeiros. A experiência dele revela uma série de descumprimentos das normas, desde a falta de vagas exclusivas para pessoas com deficiência no estacionamento até a inacessibilidade de corredores e a restrição injustificada ao uso de elevador.

Outros problemas são a ausência de um órgão público dedicado à fiscalização e a falta de sanções significativas, o que facilita para os estádios ignorar as obrigações e agir fora da lei. Por isso, a ausência de vagas exclusivas e sinalizadas para pessoas com deficiência no estacionamento ainda é tão frequente, assim como catracas, corredores estreitos e de difícil acesso, restrições de visibilidade para quem tem deficiência visual e falta de rampas e elevadores. 

O resultado dessas infrações reflete em uma grande parcela de torcedores com deficiência que ao se deparar com a exclusão não retornam às arquibancadas.

Infelizmente, o caso de Hélio não é único e representa a experiência de frustrações e constrangimentos para muitos torcedores com deficiência física, que se veem impedidos de desfrutar de eventos esportivos por extrema dificuldade de acesso aos estádios. 

Essa situação não pode ser mais adiada, pois não se trata apenas de uma questão de direitos; é uma questão de justiça e igualdade. Por isso, juntamente com o torcedor Hélio, propus um novo projeto de lei que impõe penalidades civis mais severas, como multas a partir de 30 salários mínimos, para estádios que descumpram as regras de acessibilidade e estabelece um órgão fiscalizador dedicado à acessibilidade nos estádios para garantir que as normas sejam respeitadas.

Essa iniciativa é um passo rumo a uma sociedade onde a acessibilidade seja a norma, não a exceção. A igualdade de acesso não é apenas uma questão de direitos, mas um dever nosso como sociedade.

Ao tornar a acessibilidade uma realidade em todos os aspectos da vida, estamos criando um futuro mais inclusivo e equitativo para todos. É hora de transformar nossa visão de cidades e espaços em realidades acessíveis e igualitárias.

Paulo Henrique Carvalho Meira Passos é advogado e diretor-chefe da Meira Passos Advogados