Drummond, em Congonhas, perante o anfiteatro dos profetas de Aleijadinho, esculpidos ao tempo da Inconfidência de 1789, enxerga uma “assembleia insurgente”, em confabulação silenciosa sobre a “tragédia de Minas” e em contemplação ao “horizonte de montanhas” ricas de ferro. Hoje, ao lado, a maior barragem de rejeitos de minério, da CSN, é uma ameaça.

Já antes, Drummond, na sua Itabira, apontara, em poesia famosa, a exploração do minério de ferro que legou à cidade quatro barragens, uma delas, a do Pontal, no local onde estava a fazenda de sua família.

Hoje, a Minas minerária, que inicia em fins do século XVII os ciclos históricos do “ouro ao ferro”, que lhe valeu a ocupação inaugural do seu território e o nome, esperamos que tenha a consciência grave de que esta atividade pode gerar riquezas e empregos, mas também pode ser trágica quando praticada com risco de vidas humanas e destruição de rios, matas e florestas.

Em Minas, “natureza e cultura” estão intimamente ligados à “geografia física e humana”. Esta é sua maior riqueza. O solo mineral e as montanhas conformaram a sociedade e a personalidade dos mineiros ao longo de três séculos de história. Mas as vilas ricas, do esplendor do Ciclo do Ouro e do barroco, ficaram pobres e também tem barragem de rejeitos.

Pelo minério, do ouro ao ferro, cobiçada pelo mundo, Minas poderia estar mais próspera se tivesse sabido vender melhor sua herança natural, apontam os estudos da História Econômica.

Hoje, quebrada, mas ainda em solo rico, Minas sente o ciclo dos desastres, Mariana e Brumadinho e muitas ameaças. E agora, a epidemia impede o turismo que, embora também mal explorado, poderia ser um novo ciclo econômico, maior gerador de trabalho e rendas.

A história, mestra da vida, nos ensina muito sobre a tragédia mineira. Portugueses e ingleses levaram o ouro no século XVIII. Dezoito grandes minas inglesas, nos séculos XIX e XX, exploraram o ouro mineiro, já em escala industrial. E nada deixaram.

Em 1911, em encontro internacional, em Estocolmo, patrocinado pelos EUA, sobre o ferro e a siderurgia nascentes, o geólogo da Escola de Minas de Ouro Preto, Gonzaga de Campos, apresentou ao mundo estudo pioneiro sobre o Quadrilátero Ferrífero. Provocou corrida às jazidas de Minas: ingleses, alemães, americanos , franceses e belgas compraram imensas jazidas, mas não investiram na siderurgia, como queria o governador nacionalista Artur Bernardes.

Hoje, as minas são da Vale, criada em 1942 por Getúlio Vargas em transação com capitais ingleses em nome do esforço de guerra. A Vale, a maior do mundo, domina também a logística de transporte e exportação.

E exportou perto de 400 milhões de toneladas de minério e pelotas em 2019. Destes, 52% saem de Minas Gerais e o resto principalmente de Carajás, no Pará, que dobrará sua produção em três anos, com custos menores. Mas a Lei Kandir, de 1996, retirou o imposto sobre exportação e Minas perdeu, até hoje, cerca de R$ 180 bilhões que poderiam ajudar muito o Estado.

Este ano completamos 300 anos da criação da Capitania de Minas, ocorrida em 1720, e estas lembranças são pertinentes, pois convidam a uma reflexão sobre o momento e o futuro. E que a epidemia deste 2020 não impeça este debate, essencial a Minas, que precisa refletir sobre sua trajetória histórica e econômica, suas riquezas naturais e como transformá-las em melhoria de vida para os mineiros.