“Felicidade?/Disse o mais tolo: Felicidade não existe./O intelectual: Não no sentido lato./O empresário: Desde que haja lucro./O operário: Sem emprego, nem pensar!/O cientista: Ainda será descoberta./O místico: Está escrito nas estrelas./O político: Poder/A igreja: Sem tristeza? Impossível.... (Amém)/O poeta riu de todos, E por alguns minutos...Foi feliz!" (“O Teatro Mágico”).

No dia 14 de março, o Brasil comemora o Dia Nacional da Poesia. Propositalmente, essa data coincide com a comemoração do aniversário natalício do poeta baiano, republicano e abolicionista Castro Alves (1847-1871), expoente da literatura romântica. Para Alves a poesia possui três irmãs: a fome, a indiferença e a morte; três experiências limítrofes que se defrontam com a vida do poeta, desafiam e instam à poesia da vida.

A poesia é uma das sete artes tradicionais, marcada pela utilização da linguagem com objetivos estéticos específicos, pela estrutura de texto em verso, com ritmo característico e divisão em estrofes. Ao longo de séculos, foi cantada sob o acompanhamento de instrumentos musicais. Todavia, o significado da palavra poesia transcende os limites da literatura. Em um sentido mais amplo, podemos dizer que se trata de uma maneira especial de “encarar” a vida e de vivê-la. É, antes de tudo, uma postura existencial um jeito de ser.

Segundo Edgar Morin, a poesia é uma espécie de “estado do ser” marcado pelo encantamento, pelo sonho, pela alegria. É a descomedidade, a ousadia e a loucura. É a dimensão humana representada por Dionísio, divindade grega do vinho, da embriagues, da festa, da música e da dança. A poesia está presente, por exemplo, naquela música que nos remete a alguém especial ou a algum momento significativo. Está nas recordações, nas utopias, nas dúvidas, nas incertezas.

Viver poeticamente é extasiar-se com o sorriso gratuito de uma criança. É entregar-se a um grande amor. É reunir os amigos sem motivo especial. É solidarizar-se com o sofrimento do próximo. É reverenciar os grandes mistérios do Universo e agradecer todos os dias por esse dom extraordinário que é a vida. É o voar fora da asa de que fala Manoel de Barros. Esse “estado do ser” que denominamos poético é aquele “sopro divino” que aponta para caminhos improváveis e aparentemente inacessíveis. É ele que promove as mudanças realmente necessárias à roda da via e, sobretudo, permite que vivamos com intensidade toda a beleza que existe.

Poetar é evitar o absurdo que seria o mundo se as memórias não pudessem ser salvaguardadas ou mesmo inventadas. É iminente e eminente possibilidade de imortalidade, posto que escrever é estar no extremo de si mesmo (J.C.M. Neto) e, por isso, “não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos” (Cora Coralina).

É traduzir em palavras o movimento de nossa trajetória existencial. Quando escrevemos transpiramos humanidade e, concomitantemente, nos humanizamos. Fazer poesia é cumpliciar a essencialidade da existência, do humano.

Assim, por ocasião desta data tão bela quanto esquecida, neste momento em que o mundo se faz acometido por um mal de proporções inimagináveis, afigura-se premente reafirmar: o mundo precisa de poesia! Segundo Leminski, chegará o dia em que tudo que eu diga seja poesia.