Recentemente, um amigo médico com sintomas de gripe conseguiu fazer um exame laboratorial de PCR para o “coronavírus” (SARS-Cov-2) em material obtido do nariz e da garganta. Ao obter um resultado “negativo” (na verdade, “não detectado”), comemorou. Fui então, por dever de ofício, obrigada a informar-lhe que, mesmo assim, precisaria manter o isolamento de 14 dias a contar da data do início dos sintomas.
Todos os exames laboratoriais são sujeitos a resultados que não refletem a real situação da pessoa testada. São os chamados resultados “falso positivos” e “falso negativos”. Esse conceito ficou bem conhecido durante a epidemia da Aids, pois houve relatos de pacientes falso positivos em número significativo, até que foram desenvolvidos novos exames laboratoriais confirmatórios bastante específicos.
No caso da Covid-19, não tememos tanto os resultados falsamente positivos, uma vez que o paciente deverá apenas cumprir regras mais rígidas para proteção da comunidade, as quais são devidas por todos nós no momento. Contudo, o resultado negativo gera uma sensação de segurança que pode ser enganosa, caso o resultado não reflita o real estado do paciente.
Sensibilidade é a capacidade de um exame laboratorial de apresentar resultados positivos em pessoas sabidamente portadoras de uma condição clínica. Em um estudo realizado pelo cientista chinês Tao Ai e colaboradores para estudar a sensibilidade do exame molecular RT-PCR para CoV-2, ela foi de cerca de 70%. Ou seja, em 1.000 pessoas com o diagnóstico final fechado (clínico, tomografia e RT-PCR), 300 apresentaram em algum momento resultado negativo para RT-PCR. E, portanto, falsamente negativos. Isso significa que essas 300 pessoas, com base apenas no resultado negativo ao teste, seriam consideradas não transmissoras, mas poderiam na verdade transmitir o vírus.
A sensibilidade da RT-PCR RT depende de muitos fatores. Podemos citar a expertise da técnica do coletador do suabe de naso e orofaringe e do laboratório que executa o teste, mas também características da própria história natural dessa virose. Há menos excreção de vírus em pessoas sem sintomas, em um período de cerca de cinco dias antes de se mostrarem doentes. E a carga viral pode ser mais baixa no início da doença, antes de haver tosse.
Caso você venha a realizar o exame para RT-PCR para Covid-19, quais seriam as consequências? Do ponto de vista individual, as pessoas com resultados positivos se tornam mais propensas a cumprirem o isolamento de 14 dias de forma rigorosa. Do ponto de vista da saúde pública, a proporção de pessoas testadas, e que apresentam resultado positivo, pode indicar o grau de disseminação do vírus em uma dada população, podendo guiar as políticas de mitigação e, caso a testagem seja muito ampla, políticas de supressão, como as que foram adotadas na Coreia do Sul. Por isso o novo mote da OMS: “Testar, testar, testar”.
Todos sabemos que os serviços de previsão de clima eventualmente falham e que, mesmo assim, são muito úteis. Finalizando, é melhor termos um ou mais exames laboratoriais para coronavírus, mesmo que menos sensíveis, do que não termos nenhum.