CADU DONÉ

A melhor forma de ser campeão

Virada impossível. Cara do Atlético, estilo de Cuca. Celestial. Metafísica. O inacreditável que se materializa. Grande beleza

Por Cadu Doné
Publicado em 02 de dezembro de 2021 | 22:23
 
 

No início do ano, um pouco pelos excessos de uma turma da lacração de quem, sim, costumo estar perto, mas vira e mexe perde a mão em seu humanismo louvável e genuíno, um revisionismo educador, e a incapacidade, a carência de humildade para dizer “simplesmente não sei”, a visão simplória do que é “humano, demasiado humano”, do que é nuançado, extremamente abstruso, e bastante pelo ímpeto reducionista para posicionar treinadores em prateleiras também antinaturais, Cuca chegou massacrado pelos especialistas de Twitter e dos microfones que, em alto grau e obviamente, sabem bem menos do que ele – eu me incluo nisso, não nas críticas injustas; “Cucabol”, “ausência de repertório”, “poucas soluções ofensivas”, “inexistente compactação”, “nada espreme do excelente caldo de onde pode tirar”, “chuveirinho, chutão, mais de 60 cruzamentos”: ah, a sabedoria.  

Entre autodepreciação e cabotinismo

Os diminutos, os esparsos heróis que batalham contra chatas palavras para chegar ao fim da minha coluna – Dennis, acho que só você, que hoje só volta na terça – notam seu pendor – verdadeiro, e dizendo coisas nas quais acredito – para a autodepreciação. Hoje ela cede lugar a um ligeiro cabotinismo, e o objetivo desse barango “hate to say I told you so” não é para lustrar o arauto: ele aparece sobretudo pelo amor à Cuca, o melhor técnico em atividade no Brasil. Quando os “Zé pranchetinhas”, os neoidiotas da objetividade direcionavam a mim suas estatísticas imprecisas e inválidas até pela amostragem, mantive a convicção irrevogável acerca da qualidade de um treinador como jamais antes.

Obrigado, Cuca

Obrigado, Cuca, por ter me feito acertar uma vez na vida. Mas obrigado, Cuca, acima de tudo, por me dar o privilégio de, como profissional, testemunhar mais uma caminhada épica no esporte que tanto amamos – e desculpa, torcedor, por manter essa narrativa colossal num nível tão rastaquera. Em 2013, inexperiente, cru, surrealmente apontado por jornalistas como revelação da área – como jornalistas erram, meu Deus... –, sem merecer, comentava o lance que definiu uma geração – a defesa de Victor.

Presente

Hoje, velho, ainda citado como revelação – prova irrefutável de que nem aconteci, e muito menos desabrocharei (até por não possuir atributos para tal) –, me emociono com o privilégio de assistir à bíblica caminhada para a quebra de um jejum de 50 anos. E ela nos leva a perguntar: Cuca é o maior treinador da história do Galo? Há uma armadilha nessas escolhas; o maior muitas vezes não é o melhor. Num eterno roteiro, que já teve Telê Santana, talvez seja espinhoso cravar Cuca como o “mais talentoso”.

Mas o maior...

O “maior”, para mim, Cuca já é. E briga ferrenhamente para se transformar no melhor. A Copa do Brasil vem aí... A primeira Libertadores, o Nacional preso na garganta por meio século. Não tem como negar. E a forma? Com “chutão”, “bagunça organizada”, “reativo”, “propositivo”, futebol ora bonito, por vezes pragmático. A apregoada limitação é tão equivocada, injusta, que resvala na blasfêmia, na crueldade. Obrigado, Cuca. Parabéns, Cuca. O futebol te reverencia.

Capítulo final

Virada impossível. Cara do Atlético, estilo de Cuca. Celestial. Metafísica. O inacreditável que se materializa. Grande beleza.